Raquel Rolnik: "Estamos vivendo uma 'guerra de lugares'"

A urbanista foi uma das participantes do XIV Colóquio Internacional de Direitos Humanos, realizado nesta semana em São Paulo; para Rolnik, há um processo de mercantilização dos espaços, em todo o mundo, que faz com que as pessoas queiram retomar as ruas.

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A urbanista foi uma das participantes do XIV Colóquio Internacional de Direitos Humanos, realizado nesta semana em São Paulo; para Rolnik, há um processo de mercantilização dos espaços, em todo o mundo, que faz com que as pessoas queiram retomar as ruas  Por Ivan Longo  Os levantes populares que têm se erguido ao longo dos últimos anos pelo mundo podem ter, em sua essência, uma característica em comum: a retomada do espaço público. Ao menos é essa a tese defendida por Raquel Rolnik no XIV Colóquio Internacional de Direitos Humanos, que está sendo realizado nesta semana em São Paulo. A urbanista e relatora especial da Organização das Nações Unidas (ONU) afirmou durante o primeiro dia de evento, nesta segunda-feira (25), que a crescente especulação imobiliária, aliada ao mercado financeiro, provocou o que chama de uma "guerra de lugares". "Estamos vivendo uma era de rebeliões no mundo todo em que há um elemento em comum: a retomada das ruas. O espaço público tem sido crescentemente capturado pelo complexo imobiliário através da ação do Estado", disse. Para Rolnik, o processo de "mercantilização" da terra faz com que aquele espaço que antes era palco de convívio, das relações sociais e econômicas ou mesmo do simples exercício de cidadania se transforme em um espaço que só atende aos interesses privados. Ela analisa que, quando um local de fato é público, a discussão política se torna natural. Como, segundo a urbanista, o auge da democracia neoliberal é a "não política", a mercantilização dos espaços atende perfeitamente a esses interesses. "O processo de mercantilização da terra, o que transforma a vida em bens, torna as formas de posse da terra inviáveis", explicou, citando ainda como exemplo o caso da Ponte Estaiada, em São Paulo, que em junho de 2013 foi totalmente ocupada por manifestantes. Para a urbanista, a ponte representa todo o poder exercido pelo mercado imobiliário na cidade e sua ocupação foi "simbólica do ponto de vista do questionamento da ocupação de espaços". Nesse sentido, Rolnik disse acreditar que as pessoas, expulsas do convívio político e social, sentem cada vez mais a necessidade de exercer o 'direito à cidade' e citou exemplos recentes de mobilizações no Brasil, como a dos cariocas com o Porto Maravilha e a dos pernambucanos, com o Cais Estelita. Ambos os lugares estão ocupados há meses por manifestantes que têm como intuito impedir que os espaços deixem de ser públicos para darem lugar a empreendimentos privados. "Estamos num confronto quase bélico. É fundamental voltarmos nossas atenções para as alternativas a esta guerra", alertou. Foto: Conectas