Reginaldo Nasser: Comentários sobre minha recusa em dar entrevista à Globo News

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Por que tornar público um convite privado? Algumas pessoas se referiram à divulgação como “moda” ou um lance de marketing, mas, para qualificar o debate, seria mais apropriado falar em “atitude politica” e não moda. Se a atitude é seguida por outros pode tornar-se um movimento social. Aliás, essa atitude política inclusive tem nome: “boicote”. Pratica amplamente utilizada na história por vários movimentos políticos Por Reginaldo Nasser* 1 – No dia 22 de março fui convidado (mensagem de WhatsApp) por uma produtora da Globo News para participar do programa Edição I. Tal como em outras ocasiões em que troquei mensagens com a produtora, o tratamento foi cordial e respeitoso. Mas dessa vez resolvi não apenas recusar o convite, como torna-lo público. Infelizmente, devido à falta de habilidade com iphone e prints, disparei a mensagem com o nome da produtora antes de editar (não aparece seu sobrenome, email ou tel). Quando fui alertado, o post já estava com ampla circulação nas redes. Obtive auxilio de colegas e consegui grifar nome e foto, por volta de uma hora depois. Em nenhum momento tive intenção de expor a produtora, ainda que a mensagem não revelasse algum conteúdo que a desqualificasse. Não foi uma conversa privada! Foi recusa a um convite! 2 – Alguns associaram meu post a um suposto apoio ao governo etc. Deixo claro que, apesar de simpatizar com alguns programas sociais do PT, faço oposição ao governo Dilma. Entretanto, luto para que a presidenta Dilma fique até o termino de seu mandato para que eu continue a fazer minhas criticas dentro das regras democráticas. A Rede Globo pode apoiar o impeachment, não vejo problema nisso, mas acho nefasto e imoral a forma como tem sido feito. Repito o que eu disse: Rede Globo não faz jornalismo e incita o ódio. 3 – Dou entrevistas e participo de programas em várias emissoras e espero continuar até avaliar se é o caso de recusar. Aliás, tive participação frequente na Globo News entre 2000 e 2011 e sempre considerei bastante positivo. Entretanto, a partir de 2010, notei que a oposição ao governo do PT aparecia de forma exasperada até em discussões sobre Oriente Médio. Tanto é que tive uma longa fala editada sobre politica externa quando critiquei o governo FHC. Desde então passei a recusar convites com desculpa de compromissos assumidos. Passei a refletir se valia a pena ter uns minutos para expor minha opinião numa emissora de TV que incita o ódio e desqualifica o debate democrático. Avaliei então que os convidados que destoam da Toda Poderosa servem apenas de fachada para dar a aparência de pluralismo. 4 - No post que publiquei está claríssimo que o motivo de minha recusa foi o comportamento da emissora na qual a produtora trabalha. Fiquei espantado com o fato de que pessoas que desaprovaram minha recusa não tivessem aproveitado a ocasião para debater o tema da regulação da mídia. Alguns procuraram situar a questão, única e exclusivamente, no terreno corporativista, como se nada estive acontecendo no país. Pegando carona numa entrevista de Eliane Brum: “Acho que setores da imprensa brasileira terão que dar muitas explicações para a História sobre o seu papel na atual crise. Ou a imprensa se mostra à altura do momento ou será cobrada por isso no futuro. Junta-se a isso uma crise de credibilidade que só cresce entre parcelas da população e temos um momento muito delicado para o jornalismo. A crise política atual mostra também o quanto é frágil uma democracia sem uma imprensa forte e responsável, consciente do seu papel histórico de documentar a sua época com honestidade.” 5 – Por que tornar público um convite privado? Algumas pessoas se referiram à divulgação como “moda” ou um lance de marketing supondo que a intenção fosse “obter likes”. Bem, em relação à segunda questão, a resposta é muito óbvia. Se for para isso não seria mais adequado participar da grande mídia como muitos já o fazem? Para qualificar o debate creio que seria mais apropriado falar em “atitude politica” e não moda. Se a atitude é seguida por outros pode tornar-se um movimento social. Aliás, essa atitude política inclusive tem nome: “boicote”. Pratica amplamente utilizada na história por vários movimentos políticos. Prática que, ultimamente, tem sido utilizada em relação a Israel a partir da experiência contra o governo racista da África do Sul ( Movimento BDS - Boycott, Divestment & Sanctions). Parece que boicote é uma anátema aqui no Brasil! Que tal falarmos sobre isso? 6 - Admiro e respeito muitos jornalistas na grande mídia. No que se refere mais especificamente à área de relações internacionais, sou leitor assíduo de Patricia Campos Mello e Adriana Carranca. Inclusive já as convidei várias vezes para participar de eventos na universidade onde sou professor e se por acaso algum dia elas recusarem dizendo que não entram numa universidade que recusou a criação da Cátedra Foucault vou compreender perfeitamente a atitude delas e, desde já, estão autorizadas a divulgar recusa ao convite nas redes. 7 – Por fim, não se pode negligenciar o fato de que foram os jornalistas, blogs e sites alternativos os maiores responsáveis pela divulgação e repercussão do post. Isso indica que há enormes divergências dentro da categoria e seria muito salutar o debate. Também, não se pode escamotear o fato que a repercussão se deve ao fato de que há um mal estar muito grande, em nossa sociedade, em relação ao papel da Mídia. Que tal falarmos sobre isso? *Reginaldo Nasser é professor de Relações Internacionais da PUC ( SP)