Reginaldo Nasser: depois da Bélgica, a mídia voltará ao silêncio habitual?

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Os ataques terroristas voltaram a chamar a atenção da mídia internacional. Os mais apressados vão dizer: "nossa! três ataques terroristas no período de um ano, correto?" Não, durante esse período foram centenas de ataques e milhares de mortos por ataques terroristas, mas no Oriente Médio. Sendo que 90% das vitimas são islâmicos Por Reginaldo Nasser Os ataques terroristas voltaram a chamar a atenção da mídia internacional assim como ocorreu com os ataques ao Charlie Hebdo e novembro (2015) em Paris. Os mais apressados vão dizer: "nossa! três ataques terroristas no período de um ano, correto?". Não, durante esse período foram centenas de ataques e milhares de mortos por ataques terroristas, mas no Oriente Médio. Sendo que 90% das vitimas são islâmicos. Como disse um dos maiores conhecedores do ISIS, Patrick Cockburn, “... o foco de sua cobertura [da mídia] muda, de maneira abrupta, para qualquer outra coisa, como se o ISIS se tornasse notícia de ontem. O movimento é tratado como se tivesse deixado de existir, ou então perdido sua capacidade de afetar nossas vidas”. Passada a comoção do momento a mídia voltará ao seu silêncio habitual, apesar de o ISIS continuar fazendo vítimas em outros lugares do mundo. Pesquisa realizada por um dos principais centros de pesquisa sobre terrorismo no mundo mostra que 85% das vítimas de ataques durante o ano de 2015 estão no Oriente Médio e África. Assim, por mais bárbaros que sejam esses ataques, não é fato que estamos no inicio do Armagedon. O terrorismo na Europa já foi pior no final da década de 70 e inicio dos anos 80. Construiu-se uma falsa concepção, nos últimos 20 anos, de que as ameaças à Europa vêm sempre de fora e com isso a associação com os imigrantes e refugiados é feita imediatamente. Umas das consequências disso é a marginalização e criminalização dessas pessoas. De acordo com o especialista em terrorismo Michaël Dantinne: “Durante muito tempo, os especialistas e a inteligência da Bélgica pensaram que havia uma ameaça, mas que ela viria de fora”. Pois é, os autores dos atentados são belgas. Os principais líderes têm em comum um histórico de pequenos crimes e de delinquência juvenil. São “convertidos” para o “islamismo radical” nas prisões. Os lideres europeus deveriam investigar os motivos pelos quais milhares de jovens europeus estão aderindo ao ISIS. O que esta acontecendo no seio de suas sociedades. Mas, infelizmente, devido à irresponsabilidade da mídia, de acadêmicos e lideranças politicas, construiu-se uma falsa na percepção na sociedade europeia sobre a presença de migrantes e refugiados. Com o titulo “Today’s key fact: you are probably wrong about almost everything”, o jornal The Guardian fez interessante pesquisa sobre o que os europeus pensam a respeito de imigrantes, cristãos, refugiados e desemprego. Percebe-se claramente que a percepção da grande maioria das pessoas entrevistadas está muito longe dos fatos. Em geral as pessoas pensam que os imigrantes constituem quase o triplo da população do que é de fato. O problema maior é que tais equívocos têm um impacto significativo nas politicas públicas e ação internacional desses países. Diante dessas informações a pergunta imediata que qualquer pessoa, minimamente razoável, vai fazer é: ora, se esses números sobre terrorismo, presença de imigrantes, refugiados etc são sobejamente conhecidos porque os governos que tem, em seus quadros, pessoas altamente qualificadas não levam isso em conta? Creio que, como disse Patrick Cocburn, os líderes europeus fazem de tudo para que a “opinião pública não enxergue que suas políticas desastrosas no Iraque, Afeganistão, Líbia, entre outros, criaram as condições para o surgimento do ISIS.” Mas, infelizmente, diferente da situação da população civil europeia, seus líderes nunca tiveram qualquer prejuízo político por seus papéis em iniciar ou executar políticas que fizeram eclodir a violência. A reação aos atentados sempre é a promessa de mais guerra. O ciclo da violência se reinicia sempre em patamares maiores do que antes. Foto de capa: Reprodução