Rudá Ricci: Balanço do primeiro turno das eleições

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Sociólogo faz uma analise sobre a trajetória das três principais candidaturas à Presidência durante o primeiro turno; confira  Por Blog do Rudá 

Estamos na véspera das eleições de 2014. Amanhã, milhões de brasileiros irão às urnas escolher quem será o (a) presidente do Brasil nos próximos quatro anos.

Neste especial das eleições, fiz uma pequena análise sobre a trajetória dos principais candidatos à Presidência durante o primeiro turno. Decidi levar em consideração somente os sete que participaram dos debates exibidos pela televisão. Por conta disso, ficaram de fora os candidatos Zé Maria (PSTU), Eymael (PSDC), Mauro Iasi (PCB) e Rui Costa Pimenta (PCO).

Confira as análises:

Dilma Rousseff (PT): 

Comecemos pelo que não podemos esperar de Dilma. Não se trata de uma candidata ágil e com presença de espírito. Não tem fala fluente. Algum problema a faz demorar muito para transformar o raciocínio em fala organizada. Por isto, utiliza muletas, como interjeições.

Dilma é uma gerente. Gerente é objetivo e tem foco. Seu olhar está sempre pregado na meta. Então, se a candidata se sente confortável, torna-se afiada e quebra o discurso elíptico do adversário com dados e informações sobre metas atingidas.

E é autoritária, muito agressiva e intolerante. Assim, se pega a ladeira abaixo, olha com desdém para o adversário e lhe chama a atenção.

Todos esses atributos fazem de Dilma Rousseff uma candidata “montanha russa”. Pode começar bem num debate e se apresentar desarticulada em seguida.

Ocorre que tem atrás de si um staff milionário. Uma equipe de marketing conservadora, que não inova na forma nem no conteúdo, mas muito profissional. Trabalhou com dados e com dinheiro farto (sua campanha declarou gasto planejado de 200 milhões de reais, como a do PSDB) e foi muito fria e até mesmo cruel. Ao perceber as dificuldades de Marina, atacaram sem trégua, reforçando aspectos negativos. Escolheram Aécio Neves como adversário e parece que conseguiram seu intento.

Dilma teve a seu favor os dados da área social. No final do primeiro turno, recebeu como bônus a ausência do Brasil no Mapa da Fome da ONU e o IBGE divulgou o menor índice de desemprego desde 2002. Era o que interessava para falar para o eleitor pobre e/ou trabalhador. Uma vacina potente contra os indicadores macroeconômicos, informações que só podem causar efeitos negativos na vida do eleitor trabalhador (ou mais pobre) meses depois. Portanto, se o desemprego cai e a renda oscila pouco, saber que o PIB crescerá pouco neste ano não diz muito para o bolso da maioria do eleitorado.

Dilma termina o primeiro turno em alta (ainda que modesta) não por mérito pessoal, mas em virtude de uma equipe de campanha extremamente profissional, muitos recursos (humanos e materiais), um governo com realizações na área social (que fala aos mais desvalidos) e um padrinho que qualquer político gostaria de ter.

Contudo, esta é a foto. Se rodarmos o filme das últimas eleições, vemos o apelo social em desgaste. Esta campanha está sendo a mais dura para o PT. Os escândalos parecem cada vez mais graves (em 2015 e 2016, os escândalos poderão se revelar uma bomba nuclear) e os programas lulistas começam a se repetir. O PT precisa se recriar e criar uma nova geração de políticas desenvolvimentistas se desejar permanecer no topo da cadeia alimentar dos políticos profissionais do Brasil.

Aécio Neves (PSDB): 

O candidato tucano procurou disseminar que esta eleição teve como divisor de águas a morte de Eduardo Campos. É uma meia verdade. É um discurso conveniente, porque lhe retira a culpa dos erros cometidos anteriormente.

Aécio nunca entrou no Nordeste e nunca foi um candidato que atraísse o eleitor pobre, aquele que compõe a grande maioria do eleitorado brasileiro. Com efeito, as classes C, D e E representam 80% dos eleitores nacionais. Dos que recebem até 1 salário mínimo, somente 9% diziam votar em Aécio na última pesquisa IBOPE (17% em Marina e 53% em Dilma). De 1 a 2 salários mínimos, apenas 14% disseram cravar o voto em Aécio (24% em Marina e 45% em Dilma). Somente a partir da renda mensal superior a 5 salários mínimos o tucano salta à frente e aparece em primeiro lugar no ranking de intenção de votos, com 32% (Marina com 22% e Dilma com 28%). Aécio, como se percebe, é identificado como candidato da classe média e dos mais ricos.

O senador mineiro teve, ainda, um revés dos mais graves: enfrentou a resistência e até oposição dos tucanos paulistas, os mais poderosos do país. Alckmin chegou a ser cruel ao expor o vice de Marina em seu horário eleitoral gratuito. Serra tem em Roberto Freire seu grande aliado no staff de campanha da candidata do PSB/Rede. Não há como duvidar.

Finalmente, o PSDB escolheu o pior candidato ao governo de Minas Gerais, terra de Aécio. Foi uma grande propaganda negativa ter que ser questionado pelo motivo para não vencer nem em seu Estado, onde governou por oito anos e parecia imbatível.

Apesar do lastro negativo, não se saiu mal nos debates televisionados, principalmente os últimos antes da eleição do primeiro turno. Após cair para a terceira posição com a entrada de Marina Silva substituindo Eduardo Campos na chapa socialista, pegou a onda da desconstrução do que seria a “novidade Marina” e foi se recuperando. Sua propaganda eleitoral foi frágil, assim como as ações programadas nas redes sociais. Mas é Presidente do maior partido de oposição do país. Não é um cacife baixo. Ao contrário. Possui um exército de apoiadores, financiadores e políticos profissionais.

O PSDB sairá menor de quando entrou nesta campanha de primeiro turno. Mas terá se livrado, ao final, do que parecia ser um fiasco humilhante. Afinal, se não foi o melhor dos mundos, também não se revelou o pior.

Marina Silva (PSB) 

Era a candidata preferida dos manifestantes de junho. Havia chegado a 20% dos votos válidos nas eleições presidenciais de 2010. Seu físico e fisionomia são o desenho da mulher sofrida do interior do Brasil. É evangélica, mas sempre falou do novo, do desenvolvimento sustentável como alternativa ao modelo predador da natureza e da vida.

Tentou formar seu partido – a Rede Sustentabilidade –, mas foi abatida em pleno voo pelo poderoso Lula, ex-companheiro de partido. A partir daí, foi movida pela necessidade de sobrevivência política e se filiou ao PSB, partido de Eduardo Campos, candidato a presidente da República. Seu nome sempre figurou como mais popular que o de Campos, mas ao aceitar ser vice, reforçou a imagem de desprendida. Poderia ter ficado de fora desta disputa de 2014, mas demonstrou que tinha gana de poder.

Com a morte de Eduardo Campos, revelou algumas de suas garras. Impôs seu grupo no comando da campanha socialista, o que gerou as primeiras grandes defecções, como o Secretário Geral do PSB. Também enfrentou reveses em alguns Estados, como o Rio de Janeiro e Minas Gerais, no interior do ninho de seu quase partido, a Rede.

Mas soube reforçar a imagem que se projetava no Brasil: o novo. E explicitou esta imagem ao dizer que se apresentava como a “nova política”, contra a “velha política” representada pelo PT e PSDB.

Ocorre que, duas semanas depois de iniciar sua campanha à Presidência, parece ter esquecido o discurso original. Pressionada por aliados, necessitada de atrair apoio financeiro e até montar o que poderia garantir governabilidade em sua possível gestão, Marina se deixou fotografar ao lado de banqueiros e grandes empresários. Chantageada publicamente por um pastor dos mais controversos do país, recuou nas promessas de campanha em relação aos direitos do segmento LGBT. Seus eleitores de primeira hora se surpreenderam com a velocidade com que ficava parecida com a “velha política”. Marina começou a degelar. Depois de empatar com a candidata Dilma Rousseff em 34% (Datafolha de 29 de agosto e 3 de setembro), começou a cair: 33% em 9 de setembro, 30% em 18 de setembro, 27% em 26 de setembro e 25% em 30 de setembro.

Sua imagem frágil e empática para tantos brasileiros foi acompanhada por um discurso frágil. Chegou a chorar ao receber duras críticas de Lula. Nos debates televisionados, não demonstrou força e raramente esteve na ofensiva. Seu discurso foi genérico e híbrido, próximo da agenda econômica tucana e da agenda social lulista. O que poderia ser um ponto de equilíbrio acabou se somando com ações pouco firmes que inviabilizava a promessa do novo.

Marina se enquadrou muito rapidamente ao figurino hegemônico da política partidária e eleitoral do Brasil. Não conseguiu sustentar – ou ter coragem de sustentar – o discurso do novo, da ruptura com aquilo que foi a crítica generalizada exposta pelas manifestações de junho de 2013. Não rompeu. Ao contrário, ficou esmagada entre os grandes que queria combater.