"Ser menor de 18 anos não significa cheque em branco para delinquir"

Para coordenador do programa de Justiça da ONG Conectas Direitos Humanos, debate sobre redução da maioridade penal requer maior aprofundamento

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Para coordenador do programa de Justiça da ONG Conectas Direitos Humanos, debate sobre redução da maioridade penal requer maior aprofundamento Por Marcela Lima Em debate constante nas redes sociais e citada até mesmo em programas de governo de alguns candidatos à presidência da República, a redução da maioridade penal voltou à pauta. No entanto, quando se aborda o tema, a questão dos direitos humanos parece ser deixada de lado em função de casos isolados. “Ser menor de 18 anos não significa impunidade, não significa cheque em branco para delinquir”, afirma Rafael Custódio, coordenador do programa de justiça da ONG Conectas Direitos Humanos. Para garantir apoio ao candidato do PSDB Aécio Neves no segundo turno, Marina Silva (PSB) pediu que o plano de governo do tucano fosse reformulado e que o trecho que trata da redução da idade penal para 16 anos fosse retirada. Ainda que o assunto tenha sumido da propaganda do presidenciável, Aécio afirmou não negociar sobre este tema, mantendo seu posicionamento inicial. A resistência se justifica devido ao fato de seu candidato a vice, Aloysio Nunes, ser autor da proposta de emenda constitucional - (PEC) nº 33/2012 - que reduz a maioridade para 16 anos em casos de crimes hediondos, tráfico de drogas, tortura e terrorismo, tendo sido rejeitada pela Comissão de Constituição de Justiça do Senado em fevereiro deste ano. “Que eu me lembre, é a primeira vez que um candidato a presidente da República, publicamente, pautou o tema”, diz Custódio. Segundo o advogado, a proposta toca em uma cláusula pétrea, que não pode sofrer alterações. “Você está mexendo em uma cláusula pétrea, que não trata só da definição do menor de 18 [anos]. Só se pode mexer nesse núcleo duro se for para avançar socialmente, não para restringir direitos”, diz. “A política acaba sendo instrumento para efetivar os desejos de uma classe dominante”, completa. De acordo com o coordenador do programa de Justiça da Conectas, o Estatuto da Criança e do Adolescente é subaproveitado e mal utilizado, uma contradição quando se observa que ele é uma referência no mundo. A consequência são centros de atendimento aos menores de idade superlotados. “Hoje na Fundação Casa existe um paradoxo. Em São Paulo, por ordem do governo do estado, os menores estão saindo muito mais rápido, até porque não cabe mais gente”, conta o advogado. Política nas exceções Em 2013, na zona leste da cidade de São Paulo, o estudante Victor Hugo Deppman, de 19 anos, foi morto por um assaltante menor de idade. A partir de então, a família de Deppman começou uma luta a favor da redução da maioridade penal. Assim, a mãe do jovem se candidatou a deputada federal pelo PSDB neste ano, tendo como lema a frase “se o crime não tem idade, por que a punição teria?”. Entretanto, apesar de toda a legitimidade da revolta dos familiares, Rafael Custódio ressalta que se trata de uma exceção e que as políticas públicas devem focar nos crimes que têm maior incidência. “A gente não pode fazer política pública nas exceções”, afirma. Raiz na desigualdade Com raízes que se encontram no contexto de desigualdade predominante no Brasil, a criminalidade é combatida de forma violenta e discriminatória, com cadeias funcionando acima de sua capacidade máxima. Custódio explica que a "subcultura delinquente é uma das respostas coletivas ao sentimento de frustração enfrentados nas tentativas de alcançar as metas estabelecidas pelos valores da cultura dominante”. O advogado e coordenador do projeto da Conectas argumenta que a sociedade se utiliza de filtros seletivos e discriminatórios, perseguindo as pessoas, de certa forma, com um viés de classe, cor, escolaridade ou até mesmo geográfica, excluindo e estigmatizando quem mora na periferia.