Sobre a estupidez à la Brasil ou, na verdade, sobre o efeito Dunning-Krueger, por Marcos Danhoni

Bertrand Russell diria: “A causa fundamental do problema é que, no mundo moderno, os estúpidos são arrogantes, enquanto os inteligentes estão cheios de dúvidas”

Foto: Marcos Corrêa/PR
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Por Marcos Danhoni* “A ignorância gera mais confiança do que o conhecimento”. (Charles Darwin) Desde as jornadas de junho de 2013, vivemos uma estranha sensação de habitar uma distopia! Relembrando: devido ao aumento de R$ 0,20 nas passagens de ônibus metropolitanos, fomos transportados para uma espécie de dobra do espaço-tempo e caímos num mundo de antimatéria que poderíamos batizar de “antiBrasil” ... Mais tarde, descobriríamos que as frases pichadas em muros e paredes - “Não é só pelos R$ 0,20!” -, encerrava um plano dantesco de pulverizar a Razão e substituí-la pela Mentira ou, como se usa falar em tempos contemporâneos, pela “Pós-Verdade”. Em síntese, e em palavras que o brasileiro mediano “entende”: “FakeNews”! Este primeiro passo na escadaria do fosso, que cavaríamos e desceríamos de forma paulatina, e cada vez mais profundamente encerrava a vontade de grupos de direita em desestabilizar econômica e socialmente o país para dar como fruto a vitória de grupos neoliberais nas eleições de 2014. Como o plano fez água, iniciou-se o ‘plano B’: as famosas pautas-bombas de Eduardo Cunha em conluio com o candidato perdedor de 2014, Aécio Neves. O plano correu como o desejado desembocando no golpe parlamentar-jurídico-midiático de 2016, com o afastamento permanente da presidenta legitimamente eleita pelo pleito de 2014, Dilma Vana Rousseff. Tudo ia bem nas mentes golpistas quando, no novo pleito presidencial de 2018, foi engendrado o “plano C”, que consistia em entronizar um Governo Neoliberal de “confiança do mercado financeiro nacional e especulativo internacional com a desnacionalização progressiva das empresas estatais e contínua erosão dos direitos sociais e trabalhistas”. Este plano tinha nome: “Geraldo Alckmin”. Porém, a proposta também fez água, pois o candidato não empolgava e não subia nas pesquisas, e aí seria necessário embarcar num novo e mais temerário plano: o “plano D” (e “D” de DESASTRE...) - eleger um candidato miliciano, do baixo-clero, indiciado por crimes de incitação ao estupro, homofobia e racismo e totalmente incompetente! Mas era quase impossível que isso pudesse dar certo diante de um candidato como Luiz Inácio Lula da Silva. Porém, com a ajuda de um juiz fascista, Sérgio Fernando Moro e de um procurador corrupto, Deltan Dallagnol, logo aquele candidato seria posto fora de cena por uma prisão arbitrária e completamente ilegal. No entanto, o perigo de não eleger o candidato miliciano continuava graças à bravura e valor do opositor escolhido pelo preso-político Lula. Foi aí que foi posto em ação um derivado do “plano D”: usar e abusar do efeito Dunning-Kruger. Este efeito de doença mental socialmente construída pode ser assim descrita: “Fenômeno pelo qual indivíduos que possuem pouco conhecimento sobre um assunto acreditam saber mais que outros mais bem preparados, fazendo com que tomem decisões erradas e cheguem a resultados indevidos; é a sua incompetência que os restringe da habilidade de reconhecer os próprios erros (in: https://pt.wikipedia.org/wiki/Efeito_Dunning-Kruger). O efeito pode ser sintetizado pela frase “ilusão de superioridade”. Este fenômeno foi descrito por Justin Kruger e David Dunning e publicado, em 1999, na revista Journal of Personality and Social Psychology. Após muitas experiências e observações clínicas, Dunning e Kruger puderam estabelecer que, diante de uma determinada habilidade, as pessoas que sofrem do transtorno psíquico descrito, falhariam em reconhecer: I) sua própria falta de habilidade; II) as habilidades genuínas em outras pessoas; III) a extensão de sua própria incompetência e, finalmente, IV) sua posterior falta de habilidade, mesmo após terem sido treinadas para aquela habilidade inicial. Para comprovar suas hipóteses, a dupla de cientistas, realizou uma pesquisa de campo (entre alunos das Universidades de Cornell) aplicando auto-avaliações, compondo um quadro de diferentes habilidades: lógica, gramatical e de humorismo. Após a avaliação, os pesquisadores requisitaram que os candidatos estimassem seus níveis de desempenho confrontando-os com os dos outros colegas. O resultado foi o que o grupo mais competente em cada habilidade avaliou seu desempenho dentro do quadro esperado (bem avaliado). Já o grupo incompetente superestimou seu desempenho de forma totalmente anormal, num índice quase cinco vezes superior ao seu real desempenho. Este experimento e os quatro passos do efeito “Dunning-Kruger” definiriam o que hoje denominamos, em palavras pobres, de “coxas” (ou “coxinhas”), “bolsomínions” ou “idiotas úteis” (não na acepção que Bolsonaro deu ao criticar os quase dois milhões de estudantes que saíram às ruas no dia 15 de maio para protestar contra o acelerado sucateamento da educação pública brasileira). O conhecimento deste efeito por agências de propaganda eleitoral e, especialmente, com o auxílio da perigosa “Cambridge Analytica”, aliadas à rede extremamente poderosa de igrejas neopentocostais e dos ultraconservadores católicos, a eleição de um imbecil à presidência do Brasil não somente seria possível, como também, garantida! As agências reconheceram os universos das diversas incompetências na população e as tingiram de “habilidades inversas” que as enquadravam nos medos interiores de cada pessoa afetada dessa patologia e potencializada pelas pregações em templos e Igrejas de todos os matizes. Com a patologia psicológica equacionada e controlada pelo ópio da religião, só faltava o necessário veículo de inculcação mais veloz que poderia existir: o Whatsapp. Em história que já conhecemos, contada pela Folha de S.Paulo, mais de 150 grandes empresários brasileiros financiaram o impulsionamento massivo de mensagens deslavadamente mentirosas e difamatórias contra o adversário do miliciano candidato Jair Messias Bolsonaro. Isto criou rapidamente milhões de focos epidêmicos de seres Dunning-Krugerianos: a incompetência foi-se multiplicando à velocidade estonteante. Esta consequência foi medida pelas análises do Instituto Vox Populi que localizou nos 10% do eleitorado feminino neopentecostal a maior vítima da indução da incompetência travestida de competência da “verdade”. Destituído de seu próprio reconhecimento de incompetente, o incompetente passou a reconhecer no outro o erro que não lhe pertencia. Configurou-se, pois, o grande desastre: a consequência natural e patológica de uma sociedade doente gerida por instituições parasitas ávidas pelo poder a qualquer custo e ao preço da desumanização do homem! Já em 1930, Bertrand Russell diria: “A causa fundamental do problema é que, no mundo moderno, os estúpidos são arrogantes, enquanto os inteligentes estão cheios de dúvidas. Para os arrogantes seres Dunning-Krugerianos brasileiros, um pouco de conhecimento consistirá sempre numa coisa perigosa e que deverá ser suprimida. Porém, na década de 30 de Bertrand Russel, não existia a internet e as redes sociais, e os malefícios destes seres seriam relativamente pequenos e fáceis de serem enfrentados. Porém, hoje, podemos reconhecer, graças à eleição de Trump, ao Brexit e à eleição do presidente miliciano Jair Bolsonaro, que os estúpidos seres de Dunning-Kuger habitam todo o planeta e o nosso poderoso e sufocante Inferno neo-Dantesco! Venceu a estupidez!” *Marcos Cesar Danhoni Neves é professor titular da Universidade Estadual de Maringá, autor do livro “Do Infinito, do Mínimo e da Inquisição em Giordano Bruno”, entre outras obras
*Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.