Tragédia do óleo no Nordeste: Não vamos esquecer

"Longe dos euclidismos de mesa de bar, o nordestino não é forte somente porque quer. É porque precisa". Confira o relato do repórter Wilfred Gadêlha sobre a cobertura da tragédia ambiental no Nordeste

Catadoras de siris e mariscos na foz do Rio Subaúma, em Entre Rios, na Bahia: quem vive de pescaria é quem mais sofre. Foto: Wilfred Gadêlha
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Por Wilfred Gadêlha É só o que se fala: o óleo derramado nas praias nordestinas. Por onde tenho passado, o assunto é um mantra. Em cada canto que eu chego, as pessoas demonstram um misto de tristeza, resignação e revolta. E, assim como as manchas de petróleo, que têm deixado mar, fauna, flora e gente contaminados, não dá para ficar imune: o que estamos presenciando é um crime lesa-Nordeste. No rastro do crime ambiental nas praias do Nordeste: Ajude a Revista Fórum a mergulhar na realidade dessa grande tragédia Até as 12h07 desta sexta-feira 26 de outubro, eu e o motorista Edson Nascimento já percorremos 1.118 quilômetros. Passamos da metade do nosso percurso. Passamos por oito municípios litorâneos de Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia. O rastro do óleo está lá. Em todo lugar. Se não no mar, na areia ou na pele, incrustado na memória. Essas pessoas, esses pescadores, vendedores ambulantes, garçons, bugueiros, essas pessoas não vão esquecer disso nunca. Vai ficar entranhado na sua história por décadas. Mais uma tragédia. Mais uma tragédia que o Nordeste é alvo. Mesmo nas praias que já foram limpas, elas não estão limpas. Porque a trilha do óleo está lá, nas pequenas manchas que parecem massa de modelar. No cheiro acre e cortante que adentra as narinas sem pedir licença e ativando um outro sentido: a revolta. É revoltante ver tudo isso acontecendo. Até para alguém como eu, que já está na estrada há um bom tempo. Eu já estive no Haiti e vi de perto o drama de quem sobrevive a um terremoto. Sem querer comparar, mas já comparando, lá foi a natureza. Aqui, a natureza é a vítima. E esses homens de paletó que nunca deram qualquer atenção ao Nordeste são os algozes. Talvez nós nunca mais nos recuperemos disso. A seca, a gente sabe, dá pra prever e dá pra conviver com ela. Um derramamento de óleo também dá para prever. Só que não quiseram. E esta mancha vai ficar entranhada no currículo de cada um deles. Ainda seguiremos ouvindo as vozes que sofrem mais uns dias. É duro. É triste perceber que as pessoas estão desesperadas. Desamparadas. Mais: desesperançadas. Longe dos euclidismos de mesa de bar, o nordestino não é forte somente porque quer. É porque precisa. Vamos passar por mais essa. Mas não vamos esquecer. Não vamos.