Trágica incoerência

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Os brasileiros dizem que são contra a corrupção, mas elegem deputados e senadores fichas-sujas Por Adriana Ferreira Fernando Giacobo (PR-PR), deputado paranaense, é o 2º-vice-presidente da Câmara e pode ficar, interinamente, como segundo colocado na linha de sucessão da República caso Dilma Rousseff seja afastada. Ele já foi réu no Supremo Tribunal Federal (STF) em três ações, todas prescritas, e ganhou na loteria 12 vezes em um período de 14 dias, em 1997. Não se trata de erro de digitação, são 12 vezes mesmo! Dos 513 deputados federais do Congresso, 298 foram condenados ou respondem a processos na Justiça ou Tribunais de Contas. O número equivale a 58,9% dos parlamentares que compõem a Câmara, de acordo com a ONG Transparência Brasil. No Senado, 58% dos senadores que votaram a favor do impeachment da presidente Dilma Rousseff respondem a acusações como improbidade administrativa e corrupção passiva em tribunais. A base aliada de um possível governo de Michel Temer, segundo levantamento do jornalista Alex Solik, tem o seguinte perfil: 58 deputados federais investigados na Lava Jato, 47 do PP, 8 do PMDB, 1 do PSC, 1 do PTB e 1 do PTC – e nove senadores – 4 do PMDB, três do PP, 1 do PTB e 1 do PSB. Aqueles que respondem a inquéritos e ações penais no STF são 145 deputados e 25 senadores. O combo de parlamentares enroscados com a Justiça é composto por representantes de todas as regiões do Brasil. O fato esvazia qualquer acusação sobre a inapetência de brasileiros de uma região específica para votar. Se existe dificuldade para a escolha dos representantes do parlamento, ela atinge a todos, indistintamente. Possíveis causas O próprio sistema eleitoral torna complicada a escolha de vereadores, e deputados pela população. Vereadores e deputados (estaduais e federais) são eleitos pelo Sistema Proporcional com lista aberta. Esse modelo que permite coligações partidárias é criticado, pois estimula os grandes partidos a lançar o máximo possível de candidatos para obter maior número de votos, a fim de ganhar o máximo possível de cadeiras que são definidas pelo quociente eleitoral. A soma de votos destinados aos candidatos e à legenda, dividida pelo quociente eleitoral define o número de cadeiras a qual o partido terá direito no parlamento. Se forem poucas cadeiras, ainda que seu candidato tenha sido bem votado, ele pode ficar de fora. Esse mesmo Sistema Proporcional também possibilita que um partido pequeno recorra a um candidato famoso para que ele seja um puxador de voto. Esse é o caso, por exemplo, de Tiririca (PR-SP). Como o partido não tem força para atrair votos de legenda e seus políticos são inexpressivos, o puxador se torna a única chance de o partido conseguir um número maior de votos que servem para elegê-lo e para levar consigo outros candidatos do partido, que obtiveram as melhores colocações. A disparidade entre o puxador e o político que vem logo depois dele no ranking de votos costuma ser assustadora. Um candidato a deputado federal por São Paulo, nas eleições de 2014, precisaria de, no mínimo, 300 mil votos. Tiririca conseguiu 1.016.796 votos e levou, de carona, dois políticos que não chegaram nem perto do necessário para se eleger, Capitão Augusto, com 46.905 votos e Miguel Lombardi com 36.080. Em linhas gerais, esse modelo para a eleição de parlamentares pode ser bastante injusto para quem disputa uma vaga, além de dificultar o entendimento dos eleitores. Por isso diminui o nível de representação. Já a eleição para senador é realizada de forma majoritária, em único turno, ou seja, o candidato que obtiver mais votos se elege. Cada Estado tem direito a três parlamentares. O mandato é de oito anos, mas a cada 4 anos, a Casa renova, alternadamente, um terço e dois terços de suas 81 cadeiras. Em 2018, os cidadãos terão de escolher dois nomes para o Senado. Desinteresse Para além do sistema, nota-se que muitos cidadãos não percebem a importância do Legislativo para o funcionamento da democracia. Os eleitores, via de regra, não buscam saber da vida pregressa dos candidatos, nem tampouco acompanham seus mandatos, após eleitos. Esse aspecto é, provavelmente, o mais determinante para explicar a predominância de corruptos no Congresso Nacional. Após a votação na Câmara federal sobre a admissibilidade do impeachment da presidente Dilma, as redes sociais foram inundadas com críticas, comentários decepcionados e chacotas a respeito da atuação dos parlamentares, que demonstraram em rede nacional falta de consciência quanto a suas atribuições de representantes públicos. Era como se, naquele momento, o eleitor tivesse sendo apresentado para o deputado que ele ajudou a eleger. Dos 513 deputados federais inscritos para a votação que decidiu sobre a abertura do processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff, ocorrida no último domingo (17), 298 foram condenados ou respondem a processos na Justiça (inclusive eleitoral) ou Tribunais de Contas. O número representa o total de 58,09% dos parlamentares que compõem a Câmara dos Deputados. Os dados foram levantados pelo Portal EBC na plataforma do Projeto Excelências, da ONG Transparência Brasil. Foto de capa: Ananda Borges/Agência Câmara