Uma lacuna na História

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No dia 13 de março de 1823, o Piauí foi palco de um levante popular que, segundo alguns historiadores e intelectuais, teve extrema importância para o Brasil. Chamada de batalha do Jenipapo, por acontecer às margens do rio homônimo em Campo Maior (PI), a batalha colocou em confronto piauienses, maranhenses e cearenses contra as tropas portuguesas comandadas por João José da Cunha Fidié.

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“A batalha do Jenipapo foi uma das mais sangrentas de todas as lutas em prol da nossa independência, sob o sangue de piauienses, maranhenses e cearenses. E a historiografia oficial não divulga a epopeia”, observa o escritor Adrião Neto. O sentimento de Neto é compartilhado pela população piauiense, que todo ano relembra o 13 de março em sessões solenes, discussões nas escolas e universidades, além de uma encenação onde ocorreu o confronto, lugar que hoje abriga um monumento aos combatentes, um museu e ainda preserva o local onde foram enterrados os mortos da batalha.

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Contribuição para a Independência
Apesar de a independência do Brasil ter sido proclamada no dia 7 de setembro de 1822, várias províncias não haviam aderido ao processo, àquela altura. Foi em outubro do mesmo ano que São José da Paranaíba, à época uma vila do Piauí, manifestou publicamente seu apoio a D. Pedro I. A declaração fez com que tropas favoráveis a Portugal se deslocassem para o local com o objetivo de tentar conter a adesão de novas províncias à Independência do Brasil.
A situação provocou uma mobilização do entorno, o que gerou a formação de uma tropa de cerca de dois mil homens sem treinamento, em sua maioria vaqueiros e roceiros. “Cada um estava pronto para se alistar. Ninguém se recusou a acudir ao apelo, e, dentro de três dias, as fileiras engrossaram e uma multidão estava à espera dos portugueses”, descreve o historiador Joaquim Chaves no livro O Piauí nas lutas da independência do Brasil. Ainda segundo o historiador, o exército dos rebelados tinha cerca de três mil pessoas e estava prestes a enfrentar um exército composto por cerca de mil lusitanos liderados por João José da Cunha Fidié, imposto como comandante das armas e governador da capitania, em 1821.
Não se sabe ao certo quantos morreram na batalha, porém existem registros que estimam o total entre 400 a 700 mortos por parte dos rebelados e cem baixas do exército português. A batalha teria durado entre quatro e seis horas ininterruptas. “Apesar da derrota militar, a luta contribuiu para que a província do Piauí aderisse à independência do Brasil e justamente por isso precisamos fazer com que a historiografia brasileira incorpore a contribuição dos piauienses, cearenses e maranhenses ao processo de independência brasileira”, enfatiza o professor da Universidade Federal do Piauí ( UFPI), Alcides Nascimento.

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Em busca do reconhecimento
Embora a batalha do Jenipapo tenha uma grande importância no Piauí, apenas há pouco tempo ela vem sendo divulgada para fora do estado, e enfrenta a desconfiança de muitos historiadores e autores de livros didáticos. “Inserir a batalha na historiografia do Brasil é uma tarefa que cabe a nós, piauienses, primeiramente. Vale lembrar que os materiais didáticos do país são do Sudeste e ignoram alguns fatos daqui”, avalia o professor da Universidade Federal do Piauí (UFPI) Antonio Fonseca. Segundo Fonseca, caso esta omissão persista, a história continuará incompleta. “Em 1822, o Piauí era uma província estrategicamente relevante por ser a passagem entre o litoral do nordeste e o norte amazônico”, observa o professor.
Já para a historiadora Claudete Dias, que elaborou seu doutorado sobre a batalha de Jenipapo, este foi um dos episódios decisivos para a garantia da independência do Brasil e a unidade política no país. “A posição de Portugal era assegurar, a qualquer custo, o Norte e o Nordeste do país. Até porque nesta região era transportado todo tipo de riqueza. A batalha garantiu que a metrópole não fragmentasse o país e que uma parte deste continuasse a ser colônia”, ainda segundo a historiadora, a luta, ao lado da Balaiada, é considerada uma das mais violentas do processo de independência do Brasil. “O processo de independência do Brasil não foi tranquilo, houve sim muito derramamento de sangue. E esse sangue era piauiense, cearense e maranhense”, avalia a historiadora.
Certos da necessidade de divulgar a batalha de Jenipapo para garantir seu lugar na história, intelectuais, a sociedade civil piauiense e políticos estão realizando uma série de atividades para dar visibilidade à batalha. Uma delas foi incluir a data do conflito – o 13 de março – na bandeira do estado.
“Nem mesmo os piauienses tinham conhecimento desta data, mas hoje todo mundo fala da batalha”, Alcebíades Costa Filho, doutor em história pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Segundo o historiador, divulgar o movimento reflete na melhora da autoestima da população local. “Isso é uma falha nossa, não ter procurado reconhecer a batalha do Jenipapo como data nacional”, afirmou o vice-governador do Piauí, Wilson Martins, na solenidade dos 186 anos da batalha do Jenipapo, durante a qual aproveitou e pediu apoio ao projeto de lei (PL) 968/07, apresentado pelo então deputado federal Frank Aguiar (PTB/SP), que institui o dia 13 de março como data histórica nacional. O PL foi aprovado na Câmara e tramita atualmente no Senado. Além disso, a inclusão do evento na disciplina de História também é uma demanda que poderá ser atendida em breve. F

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Para saber mais:
A Guerra do Fidié, Abdias Neves. Editora Fundapi
O Piauí nas lutas da independência do Brasil,
Joaquim Chaves. Editora Fundapi
A epopéia do Jenipapo, Adrião Neto. Editora Geração 70
O outro lado da história: o processo da independência do Brasil visto pelas lutas no Piauí (1789-1850), Claudete Maria Miranda Dias.
DVD Programa especial Viva Piauí - 250 anos de História, que pode ser adquirido através do telefone (86) 3131-1750.