Verticalização não é sinônimo de inclusão da classe C

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Com o título “Os privilegiados da Vila Madalena”, o blogueiro da Folha de S. Paulo Raul Juste Lores, publicou um texto onde critica o movimento de moradores de Pinheiros que decidiram lutar contra a especulação imobiliária. Em seu artigo, o autor afirma que “proibir a verticalização em áreas centrais no momento onde finalmente nossa nova classe C quer e pode comprar seu primeiro apartamento, é uma maldade pouco ecológica. Ou crescemos para cima ou continuaremos crescendo para os lados.”

A Vila Madalena, conhecida por suas casinhas e concentração de ateliês de arte e barzinhos, está passando por um processo em que as casas estão sendo derrubadas para dar lugar aos lançamentos de grandes edifícios. Porém, pelo preço do metro quadrado, que chega a R$ 10 mil, o bairro está longe de atrair a classe C.

Na verdade, o que os moradores não querem é a reprodução de um modelo que vem tomando a cidade. São Paulo vive um boom imobiliário, com a construção de prédios idênticos. As construtoras não são obrigadas a colocarem na fachada da obra uma placa com o nome do arquiteto. Assim, as incorporadoras contratam alguns profissionais, geralmente recém-formados, que trabalham com modelos prontos. Os projetos dos prédios são reaplicados em todas as regiões da cidade, independente da paisagem, característica e demandas de cada bairro.

A urbanista Raquel Rolnik, no livro São Paulo (Publifolha) explica como a troca de casas e prédios baixos por condomínios fechados, que ocupam uma imensa área, dão uma falsa ilusão de mais adensamento. No livro, Raquel alerta como o surto de shoppings, hipermercados e edifícios do gênero, provocam uma decadência da qualidade urbana. Boulevards, jardins e calçadas com 15 metros dão lugar a pequenos passeios que, muita vezes, não passam de 90 centímetros. Assim, o automóvel ganha espaço de maior importância, e o pedestre fica em segundo plano.

[caption id="attachment_225" align="alignleft" width="300"] Rua Fidalga, na Vila Madalena: tapume vermelho indica que no local será erguido um novo edifício[/caption] A Vila Madalena é, hoje, ainda um dos bairros de São Paulo onde é possível ver as pessoas nas ruas. Mas assim como outras regiões, tem recebido condomínios segregados com área de lazer interna e com certa distância um dos outros. Segundo Thiago Balbi, mestrando de Comunicação e Semiótica da PUC, que desenvolve pesquisa sobre São Paulo como imagem e as relações com os usuários, essa lógica arquitetônica pode contribuir muito para a perda dessa vitalidade ainda presente na Vila Madalena.

De acordo com ele, não se trata de uma questão de ser contra prédios: “A densidade é necessária para a cidade, a questão é que os grandes condomínios segregados tendem a não promover o uso local, gerando grandes deslocamentos de automóveis”.  Essas construções excluem das calçadas muitas atividades comerciais que atraem os usuários.

Outro crítico a esse modelo em curso na cidade é o arquiteto e urbanista Jorge Wilheim. Em artigo, ele resume que hoje se oferece aos cidadãos um simulacro da vida urbana, ao “propor-se – imaginem! – uma rua, como aquelas de verdade – lembram? – em que as crianças se conheciam e brincavam; agora, porém, rua privativa”.

O que fazer? A escritora e ativista Jane Jacobs escreveu em 1961 o livro Morte e vida nas grandes cidades, onde listava quatro elementos indispensáveis para a garantia da diversidade e qualidade de vida nas cidades. Resumidamente, o livro diz que os bairros devem garantir a presença de pessoas que saiam de casa em horários diferentes e estejam nos lugares por motivos diferentes; a maioria das quadras deve ser curta, com frequentes oportunidades de virar esquinas; ter uma combinação de edifícios com idades e estados diferentes; ter densidade suficientemente alta de pessoas. Segundo a autora, essas quatro condições são mínimas, a partir dela são geradas as vitalidades nos bairros.

Para Balbi, locais como Vila Madalena, Vila Buarque e Santa Cecília atendem esses requisitos. “Quem vive ali, usa a rua, faz suas atividades nelas, isso é fundamental para a vitalidade, o que não acontece onde essa verticalização recente já dominou.”

Portanto, o que está em debate, hoje, é a necessidade de um planejamento urbanístico, que não deixe a cidade a mercê da lógica do mercado. Não se trata de uma árvore a mais no quintal.