Presidente peruano cai, Covid e Trump assombram os EUA e Bolsonaro “ameaçador”

Leia nas Notas Internacionais de Ana Prestes: Martín Vizcarra é derrubado no Peru, enquanto inferno astral dos norte-americanos não dá trégua com a Covid-19 e Donald Trump tumultuando o país. Por aqui, Bolsonaro segue sem aceitar vitória de Biden e faz ameaças.

Foto: El Comercio (reprodução)
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- O Peru tem um novo presidente. Manuel Merino de Lama é presidente do Congresso e membro do partido Acción Popular, de maioria na casa. O parlamento peruano aprovou o impeachment do Martín Vizcarra na terça-feira (9), decretando uma “moção de vacância”. Foram 105 legisladores favoráveis e 19 contrários. Houve ainda quatro abstenções. Votaram pelo impeachment os parlamentares dos partidos Acción Popular (AP), Unión Por el Perú (UPP), Podemos Perú (PP), Alianza Para el Progreso (APP), Fuerza Popular (FP) e alguns da Frente Amplio e do Somos Peru. Deste modo, foi declarada a “incapacidade moral permanente” do presidente para seguir ocupando o cargo. Ele ainda tinha cinco meses de mandato antes das eleições gerais de abril de 2021. A denúncia foi por prática de corrupção, quando era governador da província de Moquegua (2011-2014), mas há muita controvérsia sobre como o processo foi conduzido, desde a denúncia até o ato final de impeachment. Vizcarra já havia sofrido outra tentativa de impeachment, há dois meses. O curioso dessa história é que Vizcarra, que assumiu o poder em 2018 com a queda de Pedro Pablo Kuczynski, de quem era vice, usou justamente a bandeira do trabalho anticorrupção para se manter no poder, ousando inclusive dissolver o Congresso de maioria fujimorista (em setembro 2019) para chamar eleições legislativas. O parlamento resultante dessas eleições é o mesmo que, agora, o destitui por acusações de corrupção, ainda em fase de investigação. Segundo pesquisas da Ipsos, publicadas poucos dias antes da votação do impedimento, Vizcarra contava com uma aprovação popular entre 54% e 79% dos entrevistados, que afirmaram ser contrários à sua destituição. O partido Patria Roja, comunista, herdeiro da liderança e do legado do fundador Mariátegui, chamou o processo de golpe parlamentar para prejudicar a transparência do processo eleitoral, em vias de ocorrer. Uma carta de associações indígenas também circula com a mesma opinião. Houve muitos protestos nas ruas de Lima, Cusco e Arequipa nos últimos dias. Os manifestantes pedem uma nova constituição para o país, assim como rechaçam o novo presidente Merino.

- Para quem quer saber melhor quem é Martín Vizcarra: Seu pai foi do partido aprista (APRA) e ele chegou a fazer parte da sigla por influência paterna, mas também para se candidatar pela primeira vez, em Moquegua, em meados dos anos 2000. Mas logo saiu do partido, assim que perdeu as eleições. Quando vence (2010) é por um movimento (Governo Regional por Ti). Seu perfil é mais de um burocrata de Estado. Foi governador, ministro, embaixador e vice-presidente. Chegou a participar do partido PPK (Peruanos Por el Kambio), como convidado, quando ainda era vice de Pedro Pablo Kucynski. Esse partido foi criado a partir de uma junção de pequenos partidos de direita, com denominações cristãs, conservadores, humanistas... Fez parte de um círculo de políticos de centro-direita que governa o país há um tempo, mas foi o único no período recente que enfrentou o fujimorismo e também por isso caiu agora. Embora tenha sido incapaz de tirar o país do caos econômico e de saúde pública no ano pandêmico, não foi derrubado por isso, mas sim porque estava atrapalhando os planos da elite política de direita de se reposicionar melhor nas as próximas eleições.

- Sobre as eleições nos EUA, nesta semana o procurador-geral do país (que também é o ministro da Justiça), William Barr, autorizou uma investigação sobre supostas “irregularidades na apuração dos votos”, denunciadas pela campanha republicana. Deu orientação para que os procuradores federais nos estados levantem relatórios consistentes sobre a existência ou não de fraudes no processo eleitoral. Como reação, o diretor do Setor de Crimes Eleitorais do Departamento de Justiça do país, Richard Pilger, renunciou, por discordar da nova diretriz que, segundo ele, revoga a “política de não interferência existente há 40 anos para investigações de fraudes eleitorais”. Alguns casos curiosos sobre o tema começam a aparecer, como o do vice-governador do Texas, Dan Patrick (Republicano), que fez uma oferta de 1 milhão de dólares para quem provar ter havido fraude eleitoral.

- E por falar em Texas, uma de suas maiores cidades, El Paso, está nos noticiários hoje pela superlotação de hospitais e leitos de UTI, em decorrência da Covid-19. O Estado possui 10% das infecções nacionais e está contratando caminhões frigoríficos para suporte do sistema funerário, já sobrecarregado. Em todo o país estão ocorrendo recordes. Ontem (10), houve um pico nos registros de infecções em apenas um dia: 200 mil e há ainda outras 60 mil pessoas hospitalizadas nos EUA.

- Enquanto isso, o Secretário de Estado, Mike Pompeo, disse ontem (10) que o país terá uma transição tranquila para o segundo mandato de Trump. Segundo ele, em entrevista coletiva, nos próximos dias fará viagens para França, Israel e Turquia, países que já reconheceram a vitória de J. Biden. Funcionários da Casa Branca estão proibidos de colaborar com a equipe de transição dos democratas.

- No Brasil, Jair Bolsonaro atacou o presidente eleito J. Biden, sem citá-lo nominalmente. Disse que certo candidato a chefe de Estado ameaça o Brasil com barreiras comerciais caso não sejam apagados os incêndios na Amazônia. Complementou que, frente a essas ameaças, só a diplomacia não basta, é preciso “pólvora”. O embaixador dos EUA no Brasil, Todd Chapman, coincidentemente publicou em seu Twitter um vídeo sobre o aniversário do Corpo de Fuzileiros Navais norte-americano, que serve à embaixada e aos consulados. Ele escreveu que o destacamento “compartilha uma longa história e uma relação importante e duradoura com a diplomacia, que permite construir com segurança uma relação bilateral mais forte com o Brasil”. Nas redes, Bolsonaro virou piada.

- Mas nem só de piada vive o Brasil no cenário internacional. Um levantamento do Instituto Brasileiro de Economia da FGV (Ibre/FGV), produzido pelos pesquisadores Marcel Balassiano e Cláudio Considera, feito a partir de projeções do FMI de outubro, foi divulgado. De acordo com essas projeções, após o ano pandêmico de 2020, o Brasil passaria de um PIB de 1,8 tri de dólares para 1,4 tri, deixando o ranking das 10 maiores economias do mundo, ultrapassado por Canadá, Coreia do Sul e Rússia. O Brasil ficaria na 12ª posição ao final deste ano. Em 2011, o Brasil era a 7ª maior economia do planeta e assim foi até 2014. De 2015 para cá vem perdendo posições.

- Após mais de 20 anos construção e testes (os primeiros passos começaram em 1994 e a primeira abertura para navegação em 2003), a China anunciou a conclusão total de seu megaprojeto das Três Gargantas. Já estão em pleno funcionamento a barragem e o reservatório, que servirão para controle de enchentes, geração de energia e navegação. Trata-se do maior projeto de controle de água do mundo, assim como o mais abrangente projeto hidrelétrico. Somente nas últimas enchentes de agosto deste ano, o reservatório das Três Gargantas chegou a reter 180 bilhões de metros cúbicos de água, tirando a pressão das águas da chuva sobre o rio Yangtze. (Fonte: Xinhua)

- Entrou em vigor na última segunda (9) o acordo de paz firmado entre a Armênia e o Azerbaijão, com a mediação da Rússia. O documento suscitou mais comemorações no Azerbaijão do que na vizinha Armênia, onde ocorreram, inclusive, protestos e tentativas de invasão do parlamento. O Azerbaijão retomou o controle de regiões ao redor de Nagorno-Karabakh. Os russos vão colocar dois mil soldados na região, para garantir o cumprimento do acordo de cessar-fogo.

- O Itamaraty informou ontem (10) que o Brasil apoia um plano dos EUA chamado “Clean Network”, que pretende restringir o acesso de empresas chinesas ao mercado mundial da internet móvel 5G. A informação foi dada em evento diplomático, com a participação de Keith Krach, do Departamento de Estado dos EUA. O foco do programa, segundo os norte-americanos, é a proteção da privacidade de dados ameaçada por “atores malignos e autoritários” (leia-se China).