Movimentos populares e os desafios de 2021, por Raimundo Bonfim

Temos grandes embates pela frente, seja neste ano ou a médio e longo prazo. São lutas constantes que exigem de nós uma prioridade quase absoluta para o fortalecimento da base, preparo ideológico das massas e uma disputa de hegemonia

Foto: Central Única dos Trabalhadores
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Iniciamos 2021 com velhos desafios que vêm sendo enfrentados desde que o projeto de desmonte do país, lá em 2016, foi posto em prática. Talvez o maior destes desafios atualmente seja o de intensificar a bandeira pelo Fora Bolsonaro, pois só com a retirada completa do projeto devastador que o presidente da República representa conseguiremos retomar a construção de um projeto democrático e popular para o Brasil, que garanta a soberania do país, a segurança alimentar, os direitos, terra, teto, a distribuição da riqueza e elimine a desigualdade social.

Diante de um quadro sem controle da pandemia iniciada no país em 2020, os movimentos populares e sociais tiveram importantes conquistas políticas. A maior vitória, num cenário de mortes por Covid-19 e a necessidade do isolamento social, foi a que garantiu a sobrevivência da população mais vulnerável. O auxílio emergencial de R$ 600, que em outubro foi reduzido pela metade, em dezembro chegou ao fim. Agora, com uma situação que se aproxima das 200 mil mortes e mais de 7 milhões de contaminados, 14 milhões desempregados, temos o grande desafio de instituir no nosso país um Programa de Renda Básica Permanente para garantir a sobrevivência dos 24,7% da população, que correspondem a 51,742 milhões de pessoas que estão abaixo da linha de pobreza, de acordo com pesquisa do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). A instituição de uma renda digna e permanente para o povo sem emprego e sem renda é urgente, porque trata-se da manutenção da vida humana.

Tão urgente quando a garantia do alimento para a permanência da vida é a garantia da vacinação contra a Covid-19, gratuita e para todas e todos. Enquanto cerca de 50 países já iniciaram a vacinação de suas populações e muitos já se planejam para a aplicação da segunda dose, ainda convivemos com a incerteza de termos seringas ou não para a aplicação da primeira dose em nosso país. A certeza que temos é a de que o Brasil tem à frente um presidente irresponsável, sociopata, genocida, que governa para os donos do capital e grupos milicianos, que dialoga com a morte e o mundo do crime organizado e não tem a mínima preocupação com as pessoas. Ao contrário, nutre desprezo pela vida humana ao promover e estimular aglomerações e orientar a população a não usar máscara de proteção.

Movimentos sociais, populares e todos que põem a vida acima do lucro, dos interesses dos poderosos, estão se somando para fortalecer ainda mais a luta em defesa da vida, pela vacinação já! Defender o nosso Sistema Único de Saúde (SUS) é uma luta que está intimamente ligada à defesa da vida, tendo em vista o papel fundamental que o SUS teve e está tendo para atender com dignidade os milhares de doentes por Covid-19 que chegam todos os dias para serem acolhidos. Isso sem falar na demanda cotidiana, com pessoas doentes por uma série de outras enfermidades. O SUS é a garantia de saúde daqueles que não podem pagar a saúde privada. A saúde não é mercadoria e sim um direito.  Segundo pesquisa do IBGE de 2019, divulgada no ano passado, de cada 10 brasileiros, 7 são atendidos pelo SUS, mais de 150 milhões de pessoas (ou 71,5% da população). A defesa do SUS é, portanto, pauta prioritária dos movimentos populares, contra a política de morte de Bolsonaro e de seus ministros, como o da Economia, Paulo Guedes.

O governo avança com seu projeto ultraneoliberal em todos os campos, destruindo conquistas nas áreas da saúde, educação, habitação, meio ambiente e cultura, enquanto os movimentos populares resistem os retrocessos e lutam para derrubar Bolsonaro, seu governo e sua política. Fundamental como a defesa da saúde é a da moradia popular, pois quase oito milhões de famílias não têm um teto para se proteger do sol, da chuva e agora da pandemia. Tivemos uma grande derrota no ano passado, com o fim do Programa Minha Casa Minha Vida para a faixa 1. A crueldade atingiu justamente a população que mais necessita, que tem renda de até R$ 1.800. Lutar por um programa que devolva a esperança de moradia digna para a classe trabalhadora é também um dos grandes desafios neste ano que se inicia.

Com o poder nas mãos de um presidente que governa para uma classe restrita, de ricos e poderosos, obedecendo a cartilha do lucro, do capital acima das pessoas, todas as vitórias que havíamos conquistados com luta e nos  governos Lula/Dilma, como as  políticas públicas voltadas para combater a violência contra as mulheres, o racismo, a homofobia retrocederam a passos largos, num caminho aberto por um discurso do presidente Bolsonaro, incentivador de toda forma de violência, machismo, homofobia, ódio e o preconceito.

Não é à toa que no quesito violência contra a mulheres o Brasil ocupa a oitava posição em um ranking de 83 países que mais registram feminicídios. Já o homicídio de negros cresceu 11,5%, de 2008 a 2018, enquanto de não negros caiu 12%, segundo pesquisa do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada). De 2011 para 2018, o número de vítimas negras aumentou de 694 para a 1.104. E estamos falando em vítimas fatais, mas há que se destacar que muitas negras e muitos negros conseguiram sobreviver à violência. O registro das vítimas da homofobia também é alarmante. Relatório divulgado no ano passado pelo Grupo Gay da Bahia revelou que em 2019, 329 pessoas LGBTIQ+ morreram de forma violenta no país, sendo 297 homicídios e 32 suicídios, o que equivale a uma morte a cada 26 horas.

Temos grandes embates pela frente, seja neste ano ou a médio e longo prazo. São lutas constantes que exigem de nós uma prioridade quase absoluta para o fortalecimento da base, preparo ideológico das massas e uma disputa de hegemonia, que passa também por construirmos um programa da classe trabalhadora que denuncie e combata o sistema capitalista e acumule para a construção do socialismo. O necessário isolamento social, quando possível, deve ser seguido e respeitado, mas ele não deve ser empecilho para a mobilização. Temos que ser criativos nas formas de manifestações nas ruas e nas redes digitais, a exemplo das que fizemos no ano passado, quando reunimos pequenos grupos pelo Fora Bolsonaro em todo o país. É preciso que chamemos o povo para lutar por seus direitos, conscientizando as massas de que o capitalismo não é a solução para os problemas da humanidade. Ao lado das ações de caráter organizativo, retomada da formação, temos que promover lutas em defesa da vacina já e gratuita para todos e todas, Renda Básica Permanente e Fora Bolsonaro.