JOVENS, MULHERES E NEGROS

Por uma esquerda mais jovem, mais feminina, mais negra, por Emir Sader

As lutas contra o racismo e o machismo se tornaram temas fundamentais nas lutas populares e nos debates ideológicos na sociedade brasileira de hoje

Lula sarrando.Créditos: Ricardo Stuckert
Escrito en OPINIÃO el

A política sempre foi uma atividade de homens, adultos e brancos. A imagem de um político, de direita, de centro ou de esquerda, reflete esse tipo de pessoa.

Os presidentes do Brasil, os governadores dos estados, são uma fila de homens, adultos e brancos. Os jovens, as mulheres e os negros são os grandes ausentes da política brasileira.

A situação tem mudado nos últimos tempos, conforme eles têm desenvolvido a luta social e construído suas organizações. Os movimentos de juventude, de mulheres, de negros (em geral de jovens negros) têm sido uma das melhores novidades da luta no Brasil e em outros países da América Latina e do mundo.

Esse fenômeno tem projetado alguns líderes novos, importantes: jovens, mulheres, negros, mas que tem dificuldade de transferir sua liderança, seu prestigio, para a esfera política. Ainda são minoria as mulheres no Congresso. São ainda poucos os jovens eleitos como dirigentes políticos. Os negros não conseguem ainda ter representação política na dimensão do peso que tem na sociedade.

Por que isso acontece e como é possível reverter essa situação? Deve ser uma das questões mais importantes para os partidos políticos de esquerda, que precisam traduzir o apoio que tem o Lula a nível presidencial em novas gerações de líderes políticos.

A campanha para aumentar as bancadas de esquerda no Congresso não encontra, via de regra, uma nova geração de candidatos que permita que esse caudal de apoio se traduza em muito mais parlamentares.

A única forma de isso ocorrer é agregar toda uma nova leva de candidatos, promover lideres jovens, mulheres e negros, a candidatos com plataformas desses setores. As lutas contra o racismo e o machismo se tornaram temas fundamentais nas lutas populares e nos debates ideológicos na sociedade brasileira de hoje. Esses temas têm que permear as campanhas eleitorais, promovendo candidatos que as encarnem de forma direta.

Sem isso, a provável eleição do Lula não será acompanhada de um Congresso muito diferente do atual, tanto na composição das bancadas, como na renovação radical delas. Um Congresso que se corresponda com os negros e as mulheres, que são maioria na sociedade, mas não conseguiram, até aqui, ser representados na mesma medida.

Não tem sido verdade que mulher vota em mulher e que negro vota em negro, por exemplo. Mesmo quando isso ocorre, as mulheres candidatas não necessariamente representam os interesses das mulheres. Os partidos de direita têm muitas candidatas mulheres, o próprio Congresso tem muitas mulheres parlamentares, mas que estão em partidos de direita e que votam de forma conservadora.

Com os negros acontece menos esse fenômeno. Mas eles têm sido menos representados no Congresso. A luta contra o racismo não tem pautado os grandes debates no Congresso, que não reflete ainda a importância que o sentimento antirracista tem ganho na sociedade.

Somente uma política conscientemente conduzida pelas direções dos partidos de esquerda pode alterar essa situação. É preciso privilegiar os recursos das campanhas eleitorais para os candidatos jovens, mulheres e negros, mesmo enfrentando resistências entre os parlamentares tradicionais e os candidatos que não se incluem nesses setores.

Para isso, é preciso mudar profundamente as campanhas, as suas pautas, os temas, para que novos personagens entrem em cena. Que eles expressem, nos horários dos partidos, os seus problemas, os seus sofrimentos, as suas necessidades, a sua vida. E apresentem suas propostas para um Brasil não racista e antirracista, não machista e antimachista. E que permeiam as campanhas dos outros candidatos também.

Em suma, somente com uma mudança interna nos partidos e nas suas próprias direções, essas transformações podem se dar. Hoje, essas direções refletem ainda quase a mesma composição que tinham há anos atrás. A renovação é pequena ainda, as direções têm setores negros, de mulheres e jovens minoritários. Sem que esta mudança se dê nos partidos, dificilmente eles estarão em condições de conduzir aquela transformação maior, que faça com que os jovens, as mulheres e os negros, sejam maioria nas instancias de poder na nossa sociedade.