ACESSO A ARMAS

Como proteger nossas crianças nas escolas? – Por Emir Sader

Quando a cultura do armamento se estende pela sociedade, se torna muito difícil contê-la

Sociedade dos EUA permite acesso às armas como direito individual inalienável.Créditos: Agência Brasil/Arquivo
Escrito en OPINIÃO el

O recente grande massacre numa escola dos Estados Unidos parece que colocaria a aprovação de alguma lei que dificulte o acesso a armas no pais. Dois efeitos imediatos: um, a aprovação de uma lei que dificulta, em parte, a compra de armas, pela necessidade de apresentação de documento sobre o comprador das armas. Um processo difícil de ser colocado em pratica, ainda mais porque a compra de armas nos Estados Unidos é realizada por vários milhares de pessoas, diariamente.

Por outro lado, foi aprovada pelo Supremo Tribunal do Judiciário a licença para que os estados autorizem o porte de armas em público por todas as pessoas. Uma decisão que favorece abertamente a compra e o uso de armas, intensificando os enfrentamentos armados.

Donald Trump colocou a questão, do ponto de vista dos favoráveis à disseminação de armamentos na sociedade. Ele coloca a questão da necessidade de proteger as crianças nas escolas. Vai na direção das preocupações de milhões de famílias norte-americanas, diante da possibilidade de que seus filhos sejam vítimas de atiradores, como aquele que matou mais de 20 crianças na escola do Texas.

Trump responde, dizendo que haveria que armar mais as pessoas nas escolas, ao invés de trabalhar para desarmar as pessoas. Se a professora daquela escola estivesse armada, poderia ter impedido que o invasor matasse tantas crianças. Da mesma forma, os funcionários da escola poderiam ter impedido a invasão da escola.

Uma solução paradoxal, mas que pode aparecer como razoável, numa sociedade que permite o acesso às armas como um direito individual inalienável. Uma sociedade que dissemina a cultura do armamento e da violência.

Diante do armamento do atacante, nada melhor do que o armamento dos que podem defender as escolas e as crianças. Uma posição que pode ter mais adeptos na sociedade norte-americana, do que a que propõem a limitação do acesso à compra de armas.

Numa sociedade em que parte do acesso às armas é dado pela fabricação das armas nas casas das pessoas, que compram as peças nas lojas. São armas que não entram nas estatísticas, mas que aumentam o armamento das pessoas.

Numa sociedade em que há mais armas nas mãos das pessoas do que a população, isto é, a media é de mais de uma arma por pessoa.

Os armamentistas se valem dos casos em que os portadores de arma conseguem se defender diante dos que os atacam. São casos minoritários, porque em geral os assaltantes tomam as armas e os atacam com elas.

Mas o principal é como romper com essa lógica armamentista, em que a melhor forma de se defender das armas é ter mais armas, é se armar preventivamente?

Quando a cultura do armamento se estende pela sociedade, se torna muito difícil contê-la. A força das milícias nas periferias das grandes cidades é a de que elas surgem para supostamente defender a população contra a polícia e os narcotraficantes.

É a grande dificuldade de construir uma política democrática de segurança pública. Uma política que seja pacífica, que não se assente na violência. Aqui também a luta principal se dá ao nível dos valores, da disputa cultural. Só uma disseminação generalizada da ideia da paz, da convivência nas diferenças, assim como impedir a impunidade no uso da violência pelas polícias, trará resultados

Porque não se trata somente de proteger nossas crianças nas escolas, mas nas ruas e nas próprias casas, diante das balas perdidas. E isso, somente com uma campanha generalizada pela paz, contra a violência, de limitação e proibição do uso de armas será possível.

*Esse texto não reflete necessariamente a opinião da Fórum.