Quando alguém quer saber o nome do Claudionor, o Claudionor não responde Claudionor.
- Meu nome é João Tadeu Claudionor Silveira de Jesus.
Seria ótimo vendedor, o Claudionor. Fala bem e bastante. Conversa com a namorada ao celular, se despede de um companheiro no ponto de táxi em Pinheiros e – ao mesmo tempo – me cumprimenta, apaga o cigarro na sola do sapato e abre a porta do carro. Entramos. Sentamos.
- Vai para onde?
- Rua Polônia, 445.
Ele me olha pelo retrovisor.
- É para aquele mesmo local da semana passada?
Não tenho o que responder. Jamais estive no endereço. Também é certo, assim como a camisa do Palmeiras é verde e branca, que nunca entrei no táxi de Claudionor e muito menos que fomos juntos até lá. Mas não resisto e estimulo a fantasia.
- Memória boa, Claudionor.
- Lembra que tava uma chuvinha sem vergonha?
- Sim e o trânsito? (replico e alimento a brincadeira).
- Tava tudo travado, doutor.
- Pode me chamar de Cosme.
- Meu primo é Damião. Damião de Jesus, acho lindo.
- Se tivesse irmão...
- Não tinha erro, era seu xará.
Claudionor tem uma risada de botequim, que sacode ombros e óculos.
- Onde a gente tava mesmo? Ah, naquele dia, eu desviei pela paralela da avenida Brasil e a gente chegou rapidinho.
“Palavras loucas, ouvidos moucos”, ignoro o velho provérbio e “de orelha em pé” sigo em frente na conversa.
- Isso mesmo, Claudionor.
- Cosme, se quiser eu troco a música.
- Não se preocupe.
- Adoro sam...
- Desculpe interromper, Claudionor. Passamos da esquina da rua Polônia.
- Mil perdões. Prefere que eu dê a volta ou quer andar esse trecho? Posso pegar a rua Itália e sair lá.
A “Itália” chama-se França e naquele trecho a rua é contramão. Claro, por mais divertida que fosse a brincadeira, chegava a hora da despedida.
- Tranquilo. Vou na caminhada, Claudionor. Obrigado.
- Foi o papo que me distraiu. Tamo junto seu Cosme.
Estamos juntos Claudionor na era da informação. Nem vimos a tecnologia entrar no nosso cotidiano, mas já descobrimos que não vai sair.
Para quase toda a humanidade, aplicativos, Redes Sociais e celulares bem carregados se tornaram indispensáveis como oxigênio ou água.
Claudionor é bom exemplo, se usasse o aplicativo de caminhos, não se perderia. Com 40 anos de volante, ele respeita a tecnologia, mas ainda se informa na conversa. Não está só.
A indagar - aqui, ali e acolá - sabemos para que lado é a estação do metrô, a padaria, o sapateiro, o banheiro.
Pergunte à cobradora do ônibus, ao policial militar, ao entregador quantas informações dão por dia.
Joelma, segurança de shopping, passou mais de mês decorando a lista de lojas, cinemas e restaurantes dos 5 andares. Sabe tudo, ou quase.
Semana passada, um casal de adolescentes quis saber se com a decisão daqueles juízes lá de Brasília de descriminalizar o porte de maconha até 40 gramas, eles podiam acender um baseado no fumódromo. “Bem fininho, moça”
Joelma sentiu as bochechas esquentarem, mexeu na cabeleira e pediu desculpas. “Não sei direito, acho melhor vocês fumarem em casa.”
Dagoberto vende flores em frente à estação Santa Cecília. Uma abundância de fregueses e perguntas.
Naquela manhã ouvi a mulher castanha e cacheada pechinchar os lírios, pagar os girassóis e então perguntar a ele.
- A Frederico Abranches é para que lado?
- É a primeira travessa, basta seguir em frente.
- Para ir para o número 153, onde tem uma farmácia de manipulação, é pra direita ou pra esquerda?
- É para direita. A senhora sobe e vai logo encontrar. Fica na calçada de lá, ao lado da papelaria.
Então, a mulher ajeita a bolsa, puxa a coleira do Maguila, vira de costas e vai em sentido oposto.
- Moça, é pra cá!
- Mas eu não vou para a Frederico Abranches!
- Ué?
- Ué o quê?
- Não, nada não.
- Você tá fazendo confusão. Eu só perguntei, não falei que ia.
- É que normalmente, quando as pessoas perguntam...
- Eu não sou todo mundo. E esse papo de normalmente e geralmente não é comigo.
Dagoberto ajeita as rosas, refresca os cravos e então se despede.
- Bom dia, senhora.
- Bom dia.
* Luis Cosme é autor de Birinaites, Catiripapos e Borogodó, da Kotter.
**Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.