Da ascensão ao declínio do imperialismo, por Emir Sader
A indústria automobilística e Hollywood foram os dois vetores fundamentais do século XX daquela nova hegemonia
A chegada do imperialismo norte-americano à potência hegemônica no mundo se deu ao longo do século XX. A indústria automobilística e a projeção de Hollywood como fator essencial no imaginário das pessoas, foram os dois vetores fundamentais daquela nova hegemonia.
O carro, como mercadoria e como instrumento que passava a possibilitar a liberdade individual de quem tinha poder econômico para comprá-lo, passou a ser um objeto determinante do nível de vida das pessoas. Transportar-se em ônibus, bonde ou trem, definia um nível e um estilo de vida. Ter seu carro, definia um outro nível e estilo de vida.
Os países que passaram a concorrer com os Estados Unidos – como a Alemanha, o Japão -, passaram a produzir automóveis, mesmo que de marcas diferentes e até melhores do que os norte-americanos. Mas, consolidava-se a hegemonia norte-americana no mundo.
Por outro lado, a hegemonia de Hollywood se impunha sobre o imaginário das pessoas. Os filmes de guerra acompanhavam a estratégia imperialista no mundo. Os mocinhos dos filmes sempre lutavam contra gente com pele não branca. Eram asiáticos, africanos, eram os outros da hegemonia imperialista no mundo. As guerras, que projetavam os galãs de Hollywood, como John Wayne, entre. Outros, se faziam contra outras espécies.
Nunca contra a Alemanha nazista, porque era um país branco, ocidental, como os próprios Estados Unidos.
O único filme que se atreveu a isso foi O grande ditador, de Charles Chaplin, que ridicularizava Hitler. O autor, que não era norte-americano, teve que sair logo dos Estados Unidos, depois do lançamento do filme.
As outras películas que invadiram o mundo eram as de cowboys, em que os brancos norte-americanos invadiam as terras das populações originárias. Esses filmes conquistavam o grande público pelo encanto dos personagens que protagonizavam aquelas terríveis e violentas invasões.
A publicidade típica era a de um norte-americano dirigindo um carro conversível, com uma bela loira ao lado, fumando um cigarro, do qual saia a fumaça. O cigarro era outra mercadoria que se impunha ao imaginário das pessoas.
Os outros filmes eram comedias românticas, todas com happy end. Os personagens que passaram a habitar o imaginário das pessoas eram os grandes artistas de Hollywood.
Essa combinação entre o carro e Hollywood comandou a hegemonia norte-americana no século XX. Entram elas em declínio, com o declínio da hegemonia norte-americana? Em termos.
O carro continua a ser uma mercadoria que dá status à classe média. Ter um carro continua a diferenciá-la dos pobres. Mesmo com o Uber mudando um pouco o estilo de vida das pessoas, que já não precisam ter carro, contanto que tenham poder aquisitivo para usar o aplicativo.
Apesar do cinema qualitativamente melhor feito na Europa, Hollywood continua a dominar os circuitos cinematográficos da América Latina, A proliferação dos shopping centers com suas redes de cinemas, multiplicam sempre os filmes de grande bilheteria, que via de regra são de Hollywood. De Barbra Streisand a Julia Roberts, as artistas de Hollywood seguem se impondo ao nosso imaginário.
Assim, a disputa hegemônica no século XXI segue se dando, em grande medida, no plano da ideologia, do imaginário, dos valores. Disputa em que os Estados Unidos seguem predominantes. Até quando?