Da direita à extrema direita

Odete Roitman: do tucanato ao bolsonarismo — a vilã ontem e hoje

Se a primeira versão da vilã surgiu sob o nascimento da Constituição Cidadã, hoje ela financia milícias e acampamentos golpistas

Escrito en Opinião el
Jornalista (USJ), mestre em Comunicação e Semiótica (PUC-SP) e doutor em Ciências Socais (PUC-SP). Professor convidado do Cogeae/PUC e pesquisador do Núcleo Inanna de Pesquisas sobre Sexualidades, Feminismos, Gêneros e Diferenças (NIP-PUC-SP). É autor do livro “A construção da heternormatividade em personagens gays na televenovela” (Novas Edições Acadêmicas) e um dos autores de “O rosa, o azul e as mil cores do arco-íris: Gêneros, corpos e sexualidades na formação docente” (AnnaBlume).
Odete Roitman: do tucanato ao bolsonarismo — a vilã ontem e hoje
Odete Roitman: do tucanato ao bolsonarismo — a vilã ontem e hoje. Divulgação

A primeira versão de "Vale Tudo", exibida entre 1988 e 1989, marcou época por uma série de motivos, mas o principal é que o texto, assinado por Gilberto Braga, Aguinaldo Silva e Leonor Bassères, buscou fazer um raio-X do Brasil que surgia após três décadas de ditadura militar.

Para confrontar o país que “morria” com o fim do regime e aquele que nascia com a Constituição Cidadã, os autores criaram a vilã Odete Roitman — o contraponto perfeito à protagonista Raquel Acioli. As personagens foram interpretadas, primeiro, por Beatriz Segall e Regina Duarte, e agora, na nova versão, por Débora Bloch e Taís Araújo.

“Terra de tupiniquins”

O debate sobre moral, ética e política (que perde força na versão de 2025) é central nas duas versões de "Vale Tudo" e ganha contornos de absurdo na boca de Odete Roitman — a empresária bilionária que não acredita no Brasil, é viúva da ditadura militar e prefere falar francês a português.

Mas, embora a personagem seja a mesma, as duas Odetes possuem camadas políticas diferentes. Se a versão de Manuela Dias não defende a punição de bandidos em praça pública, ela é mais fria — e bem mais próxima do bolsonarismo.

A primeira Odete Roitman também atacava o “socialismo” e o “comunismo”, chamando tais projetos políticos de utopias de quem “não gosta de trabalhar”. Se em 1988 o problema era o comunismo, agora é a agenda verde defendida por seu filho, Afonso, que tenta convencê-la de que é preciso fazer a TCA iniciar sua transição energética.

Para a Odete de 1988, a recém-promulgada Constituição Cidadã não resolveria nada, já que o Brasil seria, em suas palavras, uma “terra de tupiniquins preguiçosos”. Hoje, não é apenas a Constituição que a incomoda — é a própria democracia e a Justiça, que insistem em funcionar, ainda que parcialmente.

Um golpe dessa monta...

Se a primeira Odete teve de lidar com a ascensão da esquerda no Brasil, a Odete de hoje apoiou o movimento “Cansei”, mas se desiludiu e acabou aliando-se a milicianos e financiando acampamentos golpistas nas portas dos quartéis.

Odete Roitman votou em Aécio Neves para presidente e, depois, foi ao clube Hebraica, onde riu da piada de Jair Bolsonaro sobre os quilombolas.

A vilã carrega em si muitas camadas do Brasil — de sua elite, por óbvio —, que apostou no PSDB nos anos 1990, viu o tucanato naufragar e se jogou de braços abertos na candidatura de Jair Bolsonaro em 2018. A democracia se tornou um problema para Odete Roitman e sua turma.

A icônica vilã é a representação perfeita das viúvas do regime militar — as mesmas que foram aos acampamentos golpistas e neles depositaram todas as suas fichas.

Vale lembrar que Odete Roitman também participou do lobby pela liberação de armas e, principalmente, financiou os caríssimos churrascos nos acampamentos diante dos quartéis.

Será que Odete Roitman morreu?

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