OPINIÃO

O sentido de Pessach – Por Ana Beatriz Prudente Alckmin

"Pessach é libertação, superação e a possibilidade da construção de novos caminhos"

Hagadá de Pessach de Jakob Michael May Segal.Créditos: Wikemedia Commons
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Judeus do mundo inteiro estão comemorando Pessach. Eu poderia, aqui, escrever sobre a história de Pessach, mas é fácil descobrir essa história — basta dar um Google ou usar o ChatGPT.

Toda a história de Pessach é muito fácil de ser contada; ela está exposta. O que realmente me interessa aqui é falar sobre o sentido de Pessach. Como autora, vou aplicar o meu olhar para Pessach com base na minha identidade, na minha experiência e nas minhas leituras.

É importante deixar claro que há outras visões que diferem da minha.

Pessach é mais do que uma celebração tradicional. É um chamado espiritual para recuperar algo profundo: a sua voz.

No Egito — ou Mitzrayim — o povo judeu foi silenciado. A opressão nos calou, nos roubou a expressão e nossos sonhos. Fomos escravizados não apenas em corpo, mas também em palavra. E é aí que começa o exílio: quando não conseguimos mais falar o que sentimos ou acreditamos. A liberdade, por outro lado, começa quando a fala retorna.

Rebe Nachman ensinava que o verdadeiro exílio é o exílio da fala. Recuperar a liberdade exige, primeiro, resgatar a capacidade de se expressar. Por isso, D’us não apenas libertou o povo com atos grandiosos — Ele falou. Ele ordenou a Moshe que falasse ao Faraó. Porque a palavra tem o poder de abrir caminhos, de mover mundos.

O nome da festa nos revela isso: Peh-Sach — a boca que fala. Porque é justamente quando conseguimos expressar a verdade que começamos a nos libertar. A fala é um canal entre o Céu e a Terra. É por ela que a redenção se inicia.

O que tem te impedido de usar sua voz? Medo do julgamento das pessoas? Dor? Um passado que te cala?

Esse é o momento de soltar tudo. Chorar, pedir, gritar, cantar, rezar, dizer o que precisa ser dito. Hashem está escutando. Pessach é o tempo de contar a sua história, de dizer o que está no fundo do coração, de se apropriar da própria narrativa.

Sua voz é preciosa. Suas palavras têm força. Sua trajetória tem sentido.

A redenção acontece quando ousamos falar. Neste Pessach… dê voz à sua alma. Solte o que está preso. Permita-se ser feliz!

Pessach também é um nascimento. A partida do Egito, do ponto de vista simbólico, foi um parto coletivo: o mar vermelho se abrindo como o rompimento da bolsa de uma grávida. Após uma gestação longa e cheia de esperança, ali o povo de Israel emergiu para uma história milenar potente na construção de uma nação.

De quem era esse ventre? Das mulheres do povo hebreu, que, como todas as mulheres em situação de escravização, sofreram violências terríveis, mas não perderam a fé. Não deixaram de se movimentar para cuidar dos seus e apoiaram os homens hebreus. E muitas lutaram lado a lado dos homens.

O Midrash nos conduz a acreditar na força das mulheres judias. No futuro, também serão as mulheres que, com sua força única, romperão ciclos de violência, reanimando a comunidade na luta pela preservação do nosso povo judeu.

Enquanto os homens estavam quebrados pela escravidão, as mulheres continuavam acreditando em um futuro de liberdade. Elas faziam questão de ver seu povo crescer. E assim o povo continuou crescendo — e sobreviveu. Para o desespero dos egípcios, o povo hebreu era fértil. E logo perceberam que estavam diante de um povo numeroso, corajoso, fiel aos seus próprios costumes e muito unido.

Os egípcios tentaram impedir o nascimento de meninos hebreus, criaram todo tipo de barreira para conter a força desse povo indomável. Sim, o povo judeu tem sua própria vontade e não cede aos seus inimigos.

Se você que lê meu texto é uma mulher judia, você vem de uma linhagem ancestral de mulheres que foram fonte de vida, força e coragem. Onde posso agir com mais coragem como mulher judia? Na luta contra o antissemitismo. Na luta pelo fortalecimento dos direitos das mulheres. Na luta contra ideologias que tentam sufocar vozes femininas.

Chag Pesach Sameach!

Todo judeu pode e deve ter orgulho de ser judeu. Nossa nação diaspórica saiu de Israel e se espalhou pelo mundo ao longo de milênios. Nossa ancestralidade judaica é africana, oriental, asiática, europeia e americana. Nosso povo, ao longo do tempo, resistiu pelo mundo para preservar nossos ritos, nossas festas e saberes oriundos das Escrituras.

As velhas almas do nosso povo têm sabedoria milenar e astúcia. Para os judeus que escolheram viver a fé judaica — digo isso porque há judeus seculares — façamos nossas rezas e ritos com força.

Pessach é libertação, superação e a possibilidade da construção de novos caminhos. Soltem as suas vozes!

*Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Fórum

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