O jornalista e criador de conteúdo Chico Barney, um dos autores mais lidos do país, colocou a questão dos bebês reborn em um barulhento, mas lateral, local do debate público digital brasileiro.
A bombástica entrevista com a influenciadora Nane Reborns após esta relatar ter sido ofendida em um shopping por andar com um exemplar colocou os bonecos de plástico hiperrealista na boca dos brasileiros, que passaram a discutir nos bares e restaurantes o significado social destes bebês.
Um rápido descritivo: bebês reborn são bonecos de vinil hiperrealistas. A cultura data dos anos 1990 nos EUA e Canadá, mas ganhou espaço no Brasil a partir dos anos 2000 a partir de programas popularescos, como o do saudoso Gugu Liberato.
Na televisão e na internet, há uma espetacularização da ínfima minoria de pessoas que cuidam destes bebês hiperrealistas como filhos.
Ao que tudo consta pelas influenciadoras e colecionadoras, trata-se de uma irrisória minoria. Boa parte do conteúdo nas redes sociais que emula a criação destes filhos é roleplay e tem como fim divulgar comercialmente a "cultura"..
Recomendo a todos a assistir o documentário Bebês Reborn Não Choram, de Chico Barney, que mostra qual é o perfil demográfico das pessoas que fazem parte deste nicho.
São mulheres.
Aos homens, é permitido tudo: torrar fortunas em bonecos de live-action, carros, cartinhas de jogos, sócio-torcedor, jaqueta de couro, e todas estas coisas são vistas como hobbies.
Boa parte deles, em alguma medida, conectados com a infância.
Agora, às mulheres que colecionam de bonecas hiperrealistas, fica a categorização de lunáticas. Por pasmem, cuidar e apreciar bonecas. Ao que me consta, cuidar de bonecas é parte importante da cultura de feminilização das mulheres brasileiras desde a infância.
'A mulher que tem bebê reborn deve ter passado por um trauma, está lidando com o LUTO'. Agora o cabaço que tem 150 bonecos da Nintendo tem apenas um hobby. Palhaçada, né?
Portanto, o lunatismo e o apelo à loucura é simples: é um recurso machista mais velho que andar para trás. Os pesos são diferentes.
Se os bebês reborn são feios ou bonitos, não me importa.
Acredito que sejam uma forma de arte, porque, apesar de terem algumas bases de vinil padronizadas, são produto do trabalho de artesãs que cobram (e cobram caro) para realizar o trabalho.
É esquisito que algumas pessoas cuidem dos bebês como filhos? Mas você, que está lendo, deve fazer algo de esquisito também. Eu não me meto.
Para além disso, não me cabe diferenciar arte de artesanato, colecionismo de estátua dada de colecionismo de bebês reborn. Exagero meu? Talvez. Dane-se.
Talvez eu seja terrivelmente liberal por ter a ideia de que, de alguma maneira, isto é arte. E se é arte, é válido de ser discutido e entendido, não rejeitado.
No meu particular, não os acho bonitos. Acho bem esquisitos, para falar a verdade. Mas o amor que estas mulheres nutrem de alguma maneira me encanta. E espero que este breve artigo seja uma oportunidade para pensar nelas, não nos bebês de vinil que carregam nos braços.