Alexandre Padilha: "A saída é pau no PT e em petistas"

Vamos mobilizar todos os especialistas jurídicos para questionar a absurda acusação feita pelo procurador-geral da República. Vamos procurar cada entidade da sociedade civil e denunciar o que está acontecendo.

Foto: Paulo PInto/Analítica
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Vamos mobilizar todos os especialistas jurídicos para questionar a absurda acusação feita pelo procurador-geral da República. Vamos procurar cada entidade da sociedade civil e denunciar o que está acontecendo. Por Alexandre Padilha* Quando era criança, me divertia com o desenho animado, cujo personagem dizia "saída pela esquerda!”. Para mim, um filho de pais que viviam na clandestinidade durante a ditadura, cujas práticas de tortura e repressão me obrigaram a encontrar meu pai só aos 7 anos de idade e, até lá, viver trocando de casa em casa com minha mãe até 4/5 anos - tive que correr de gás lacrimogêneo e pastor alemão durante as marchas e atos da luta contra a carestia e a redemocratização -, aquele herói malandro e sua saída pela esquerda vinham cheio de segundas e terceiras leituras. O mantra permaneceu na minha geração de juventude. Sou um jovem do fim do século passado, das plenárias de movimento estudantil. E, até hoje, volta e meia, em debates e rodas de conversa, muitas quando alguém já esgotou argumentos ou pretende dar um toque de ironia e superioridade em relação ao seu interlocutor, aparece a máxima do desenho Leão da Montanha. Relembro esses episódios, hoje, com sinais trocados, pois esta virou a máxima e a estratégia de setores da coalizão política, jurídica e midiática que construíram, executaram e conduzem o golpe que retirou a presidenta Dilma e rasgou o pacto constitucional de 88: quando não sabemos o que fazer ou falar, a saída é pau no PT! A última semana nos brindou com as máximas dessa estratégia. Não à toa, ela coincidiu com o encerramento da primeira etapa da maravilhosa caravana do presidente Lula pelo Brasil, onde a combinação das expressões carregadas do delicioso sotaque nordestino e suas variantes, da Bahia até o Maranhão, disseram bem alto tudo aquilo que acham de Lula: o legado de mudanças, o amor a quem superou as mesmas dificuldades do povo nordestino e a esperança de construirmos um outro país. Ela se inicia, mais uma vez, em um dos pilares do golpe, o espaço do poder judiciário. Se o andamento dos escândalos que escancaram o sistema político brasileiro e suas formas de financiamento já haviam exposto a hipocrisia das lideranças da aliança PMDB-PSDB, e da falácia de que os atores do mundo privado são imunes às práticas de corrupção, na última semana aprofundou-se o envolvimento de atores do judiciário com as mesmas práticas. Existem fatos revelados sobre a omissão do Ministério Público, em relação ao relatório da Receita Federal que evidencia repasses de recursos do advogado de uma das empresas investigadas na Operação Lava Jato ao escritório de familiares do juiz de primeira instância e, mais uma vez, do possível envolvimento de atores do MP e do Supremo Tribunal Federal na proteção a delatores e delatados. De um lado, tais episódios reforçam o que já se tornou evidente: a seletividade do nosso poder judiciário. Do outro, revela o tamanho do envolvimento de membros do poder judiciário com atores privados, cujas práticas foram escancaradas com os atuais escândalos. Tais episódios só reforçam aquilo que diz um dos motivadores do protagonismo de membros do aparato policial e judiciário do golpe, forma similar a conversa revelada em uma das "surubas políticas" de membros da aliança PMDB-PSDB/baixo clero: "Primeiro, a gente tira a Dilma e, depois, a gente acaba com isso, se não pega a todos nós”. É essa espada de suspeita que se coloca em xeque agentes da Policia Federal, altas autoridades do MPF e do STF. E qual a reação do procurador-geral da República diante dessa espada? Na prática é “A saída é pau no PT", e apresenta uma denúncia que a análise imediata de juristas a caracterizam como busca desenfreada de agrupar fatos e episódios absolutamente desconexos, muitos deles sem qualquer prova ou evidência do envolvimento dos acusados, em uma grande tentativa de criminalizar o PT e suas maiores lideranças. É absolutamente inaceitável a tentativa de agrupar fatos ocorridos em 2003, até episódios ocorridos em 2015, para tentar caracterizar o maior partido de esquerda brasileiro, que fez emergir milhares de lideranças políticas nacionais ao longo da sua história, com políticas públicas internacionalmente reconhecidas e a maior liderança política nacional e internacionalmente conhecida, em um bando de criminosos que se agrupam em uma organização permanentemente criminosa, no período de mais de uma década. São evidentes as fragilidades da denúncia feita pelo procurador-geral, mas mais do que isso, ao tentar caracterizar a existência de uma organização criminosa desde 2003, nominando determinadas lideranças sem fatos e evidências claras que os conecte, a não ser o fato de serem petistas. Para mim, fica cada vez mais clara a construção de uma argumentação ou narrativa que, na prática, procura retirar o PT da vida política brasileira, alimentada com um discurso de sua criminalização, caracterização como organização criminosa, abrindo espaço para enquadramento em improbidade administrativa, condenação de lideranças e cassação de registro. Isso é para aqueles que acreditam ser este um cenário impossível, como muitos achavam impossível o impeachment sem crime de responsabilidade de Dilma, ou condenações surrealistas como a de Lula do apartamento da OAS, aliás confiscado judicialmente dela, por ser a proprietária. Não há dúvida, os mesmos fantasmas que caçaram a existência do Partido Comunista Brasileiro, em um ambiente aparentemente democrático no país, na metade do século XX antes mesmo do golpe militar, continuaram por aí e estão decididos a inviabilizar a existência de um partido de esquerda de massas no Brasil. Como também são evidentes o timing político com a denúncia do procurador-geral da República, se esforçando para virar a página das acusações que desmontaram o verniz de pureza do MPF e do aparato policial-jurídico, que buscam credenciar-se como instituições salvadoras do Brasil. Ao mesmo tempo, buscaram interromper a ofensiva das caravanas de Lula pelo Brasil e criar um clima negativo para o dia 13 de setembro quando, mais uma, vez setores do judiciário parecem querer criar um "happening de condenação do PT e de petistas", com a provável combinação do depoimento de Lula e com o julgamento de segunda instância de Vaccari e Zé Dirceu no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em Porto Alegre. Tudo no dia 13. O outro pilar do golpe, parcelas significativas dos meios de comunicação, é parte central da estratégia de tentar evitar desgastes ao seu parceiro do aparato policial-judiciário e dar força ao movimento "joga pedra no PT". A capa da edição do jornal O Globo desta quarta-feira (6/9), véspera do dia da Independência, tentando associar os milhões de reais na casa de um dos cavalheiros do golpe e expoentes da eterna aliança PMDB-PSDB, a Lula, Dilma e ao PT. Depois de tentar construir um golpe dentro do golpe, no esforço de vislumbrar um substituto de Temer sem consultar o povo, desesperadamente atrás de uma liderança que pudesse aplicar a agenda econômica de destruição dos direitos sociais e dos trabalhadores, de entrega das riquezas naturais e destruição da nossa soberania nacional, não sabendo o que fazer diante da falência da sua estratégia e assustados com a força real de Lula, eles não titubearam: a capa tenta dizer que o dinheiro é de Lula, Dilma e do PT ou foi obtido nos seus governos. É a reedição, agora por um órgão que tem concessão pública para informar a pessoas, da afirmação cínica da delação da JBS de que existia uma conta de Lula e Dilma no exterior, mas que ele que a movimentava. E só para não ficar sem registro, mais um episódio de outro pilar do golpe, o governo federal e seus ministros, que ocuparam de forma não democrática o aparato da políticas públicas federais e operam a sua destruição em tempo recorde, merece registro: os pronunciamentos de três dirigentes do Ministério da Saúde, inclusive o ministro, buscando associar a criminalização e demonizar o PT e petistas como forma de justificar suas iniciativas, que destroem o pacto constitucional que criou o SUS. Na última semana, durante a defesa de mudanças graves de como o Ministério da Saúde apoia as ações de Atenção Básica em Saúde, principalmente a atuação dos agentes comunitários de saúde e as equipes de saúde da família, o discurso foi: são reclamações de petistas. Outro dirigente, ao buscar apresentar críticas ao modelo de cuidado à saúde mental, baseado em serviços de base comunitária e não nos hospitais psiquiátricos que se transformam em manicômios, a afirmação foi de que "essa coisa de reforma psiquiátrica é coisa de petista”. O ápice foi a fala do atual ministro que, ao tentar justificar o abandono do atual governo ao único hospital federal na cidade de São Paulo, ligado à Universidade de Federal Paulista (Unifesp), afirmou que as reclamações vinham de uma reitora petista, apesar da atual reitora da Unifesp não ser do PT e, inclusive, ter sido eleita pela primeira vez em 2013, com críticas às políticas federais em relação às universidades federais públicas e, assim, ter permanecido no cargo. A tentativa de destruição do PT não é um problema apenas para petistas, é tema para todos aqueles que se reivindicam de esquerda, todos aqueles que defendem um mundo menos desigual e mais diverso, como assim caracterizo ser de esquerda. É tema para todos aqueles que defendem a democracia, na medida que os ataques acontecem em um clima nítido de estado de exceção e de uso político do aparato policial-jurídico. A maravilhosa caravana do presidente Lula pelo Brasil revelou o enraizamento dessa força política e não assistiremos tais ataques sem ação. Com todos os esforços daqueles que tentam destruir o PT, não cessaremos as caravanas de Lula pelo Brasil e iniciaremos um amplo debate sobre alternativas para o país voltar a sonhar com a elaboração do projeto de nação "O Brasil que o povo quer". E, mais do que isso, vamos mobilizar todos os especialistas jurídicos para questionar a absurda acusação feita pelo procurador-geral da República. Vamos procurar cada entidade da sociedade civil e denunciar o que está acontecendo. Vamos ativar toda a rede internacional que possa, não só denunciar, se solidarizar, como mobilizar atores internacionais contra essa tentativa de destruir o PT. Aviso geral a todos e todas que querem inviabilizar o PT: "podem vir quentes que estamos fervendo!". *Alexandre Padilha é médico, vice-presidente nacional do PT, foi secretário municipal da saúde na gestão de Fernando Haddad e ministro nas gestões Lula e Dilma Foto: Paulo Pinto/Fotos Públicas