Deus abaixo de todos, por Frei Sérgio Antônio Görgen ofm

Nada a ver com o invocado “acima de todos” de uma perversa teologia da dominação, de um deus parceiro da opressão, da violência, do ódio, do desprezo pelo pobre

Escrito en POLÍTICA el
Por Frei Sérgio Antônio Görgen ofm* O Deus revelado em Jesus de Nazaré, como nos narra o Novo Testamento, não é um deus guerreiro, julgador, tirano, vingador, poderoso, que se coloca acima de todos, tal como aparece em alguns textos do Velho Testamento, e que tem inspirado algumas concepções religiosas em terras brasileiras. Pelo contrário, no Novo Testamento – e esta é a grande novidade – Deus se faz igual aos humanos pelo Mistério da Encarnação. Revela-se um Deus misericordioso e cheio de compaixão. O amor, e não o poder, é sua medida e sua forma de estar no mundo. Na vida e na prática de Jesus, reveladoras do ser e do agir de Deus, o vemos lavando os pés dos discípulos, colocando-se não como senhor, mas como servidor. Jesus, o Filho de Deus, coloca-se entre os últimos, os excluídos, os tidos como pecadores, os perseguidos. “Tive fome e me destes de comer, tive sede e me destes de beber, estava nu e me vestistes, era migrante e me acolhestes, estava doente e me cuidastes, estava preso e me visitastes”. “O que fizestes ao menor dos meus irmãos, a MIM fizestes” lacra Jesus como programa de vida para seus discípulos e como testemunho da identidade dEle com os humildes da terra no paradigmático texto do evangelista Mateus no capítulo 25 de seu Evangelho. O apóstolo Paulo selou este mistério da presença humilde de Deus na carta aos Filipenses quando afirma que Jesus, sendo Deus, não se apegou a esta condição, “mas esvaziou-se a si mesmo, tomando a forma de servo, fazendo-se semelhante aos homens; e achado na forma de homem, humilhou-se a si mesmo, sendo obediente até à morte, e morte de cruz.” Assim, de baixo para cima – e não de cima para baixo – revelou-se o Deus diante do qual “todo joelho se dobre”, na mesma carta aos cristãos de Filipo. Jesus, mesmo Ressuscitado, aparece e se revela aos seus na simplicidade de um jardineiro, mostra as chagas à Tomé, caminha e parte o pão com os discípulos de Emaús, cozinha e come peixe com os apóstolos. Nada de poder, violência e ostentação. Simplicidade, irmandade, solidariedade, convivialidade, amor, presença fraterna. Em Jesus, Deus se fez irmão da humanidade, mais que isto, companheiro de caminho - de dor e de alegrias – dos mais pobres, sofridos e humilhados entre os humanos. Quando um ser humano é humilhado e agredido, o Deus que se identifica com os humilhados, é também agredido nele. Nada a ver com o invocado “acima de todos” de uma perversa teologia da dominação, de um deus parceiro da opressão, da violência, do ódio, do desprezo pelo pobre. Orar a deus errado, adorar deus falso, é idolatria. E quem isto defende e prega pode estar sendo inscrito na categoria dos falsos profetas. Jesus mesmo alertou que muitos viriam. E nós, os que nos dizemos cristãos, não esqueçamos o que disse, pediu e fez nosso Mestre e Senhor: “amai-vos uns aos outros”; “vim para que todos tenham vida, e vida em abundância” e “ sou EU (Jesus) o caminho, a verdade e a vida”. A esperança vem de baixo, com “os de baixo”, não de cima nem com “os de cima”. Para quem crê, é lá, com “os de baixo” que está o Deus da Vida. *Frei Franciscano, autor de “Em Prece com os Evangelhos”.