Veneno para todos: Bolsonaristas tratoram e devem aprovar PL dos agrotóxicos; PT vai à Justiça

Em entrevista à Fórum, o deputado Nilto Tatto afirma que só uma grande mobilização popular pode evitar a aprovação do PL

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O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), colocou em pauta requerimento para que o Projeto de Lei 6299/02, que flexibiliza a entrada de agrotóxicos no país, seja analisado em regime de urgência. Com isso, o PL pode ir à votação no plenário a qualquer momento. Caso seja aprovado na Câmara, o texto será apreciado pelo Senado. Para os movimentos ambientalistas trata-se do “PL do Veneno”.

Em entrevista à Fórum, o deputado federal Nilto Tatto (PT-SP) afirma que a aprovação do PL do Veneno é um compromisso de Lira com a Frente Parlamentar da Agropecuária e atenta para o fato de que apenas pressão popular vai evitar que o projeto avance e seja aprovado.

"Como se trata de um Projeto de Lei colocado como prioridade pela Frente Parlamentar da Agropecuária, portanto, também da base do governo Bolsonaro que tem um compromisso do presidente Lira de votar esse projeto, só temos uma chance de derrotar se tiver uma grande mobilização de fora que intimide o presidente Lira, no sentido de que há um clamor geral contra a votação desse projeto. Sabemos que nós não temos votos suficientes internamente, então por isso que toda estratégia é a pressão de fora de não colocar", diz Tatto.

O deputado rebate o argumento da Frente Parlamentar de que o PL visa modernizar a legislação dos agrotóxicos e que ela vai na contramão da tendência mundial.

"Eles argumentam que é preciso atualizar essa legislação (dos agrotóxicos), 'modernizar', mas, se fosse para encarar nessa perspectiva [de modernizar], não seria o PL do Veneno, mas sim do PNARA [Projeto de Lei 6670/16 que institui a Política Nacional de Redução de Agrotóxicos-PNARA). O PNARA trabalha na perspectiva de um melhor controle na liberação de agrotóxicos e trabalha na perspectiva na busca de alternativas no ponto de vista dos insumos necessários, que é o que está ocorrendo em todo o mundo e o PL do veneno é um retrocesso daquilo que vem ocorrendo em outras parte do mundo", critica.

Além de ser um retrocesso em termos de lei, Nilto Tatto afirma que o PL ignora uma série de pesquisas que apontam para o aumento de doenças relacionadas aos agrotóxicos.

"O PL do Veneno ignora tudo aquilo que nós pudemos ver nas últimas décadas do que se produziu de pesquisa dos impactos que tem para a saúde humana, em especial. Uma série de doenças que aumentaram a incidência e que está relacionado diretamente ao consumo de alimentos e água contaminados por agrotóxicos. E boa parte desse PL já foi implementado via outros mecanismos, e eles mesmos não têm segurança jurídica daquilo que foi adotado pelo ministério da Agricultura, das liberações, da mudança dos critérios de avaliação do grau de risco e por isso eles têm pressa em aprovar", analisa.

Caso o PL do Veneno seja aprovado, Nilto Tatto afirma que a discussão deve ser judicializada. "Se ele for aprovado nós vamos judicializar e é bem provável que seja derrubado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Porque tem muitos absurdos que estão colocados nesse projeto. Então, com certeza vai ter um processo de judicialização", afirma Tatto.

O que é o PL do Veneno que Lira quer aprovar com urgência?

O texto do chamado PL do Veneno tira as atribuições de fiscalização, controle e liberação de substâncias químicas utilizadas nas lavouras do Ministério da Saúde, da Anvisa e do Ibama, deixando essas tarefas para a pasta da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, historicamente ligada aos grupos do agronegócio e pró-uso de agrotóxicos.

Pareceres dados por técnicos do Ibama e da Anvisa, assim como análises feitas por juristas, apontam que o PL do Veneno é inconstitucional e fragiliza a fiscalização dos agrotóxicos de tal forma que coloca a saúde dos brasileiros em sério risco.

Para o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, e para os grupos ligados ao agronegócio, a liberação generalizada dessas substâncias tóxicas, muitas delas altamente cancerígenas, é algo positivo pois aumenta a produção. O argumento desse grupo para refutar os críticos sobre o tema é o mesmo dos bolsonaristas para qualquer questão: preconceito e ideologia, seja lá o que isso signifique.

No entendimento de Suely Araújo, que já foi presidente do Ibama e agora é especialista sênior em políticas públicas do Observatório do Clima, se aprovado, o chamado PL do Veneno tende a tirar das mãos do Estado o controle dessas substâncias perigosas.

“(O PL) enfraquece muito o controle governamental sobre esses produtos, escanteia na prática Ibama e Anvisa, elimina exigências hoje presentes na lei, como a vedação de produtos que revelem características teratogênicas, carcinogênicas ou mutagênicas”, disse.

Ela opina ainda sobre o momento e a forma escolhidos por Lira para fazer isso, o que denota uma clara má-intenção do presidente da Câmara, que não quer uma discussão mais profunda sobre o assunto, empurrando sua vontade e a do agronegócio goela abaixo do povo brasileiro.

Bolsonaro libera 550 novos rótulos de agrotóxicos e total ultrapassa 1500 em 3 anos

O governo de Jair Bolsonaro (PL) liberou em 31 de dezembro mais 550 rótulos de agrotóxicos. Com isso, durante os três anos de mandato, já foram 1552 produtos venenosos, segundo levantamento do Robotox, projeto da Agência Pública e da Repórter BR que monitora os registros no Diário Oficial da União.

“O gov. do agronegócio liberou em 31 de dezembro, 550 novos rótulos de agrotóxicos. É a farra total das transnacionais que despejam seus venenos, contaminando solo, água, meio ambiente e matando a biodiversidade. Os agrotóxicos destroem mais do que as queimadas! Tudo impunemente”, lamentou o economista e um dos fundadores do MST, João Pedro Stédile.

Em outubro de 2021, Bolsonaro decidiu, via decreto, alterar a Lei dos Agrotóxicos, em vigor desde 1989. O texto permite que pesticidas que causam doenças como câncer possam ser liberados no país caso exista um “limite seguro de exposição”. A medida também cria um rito de “tramitação prioritária” para aprovação de novos produtos.