PERSEGUIÇÃO

Kakay: Anulação do processo de cassação de Renato Freitas “é plenamente possível”

“É possível cassar alguém por racismo?”, questiona o criminalista, que apontou a necessidade de uma discussão nacional sobre o tema

Renato Freitas recebeu ataques racistas do vereador relator do processo.Créditos: Eduardo Matysiak
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O advogado criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, foi o autor da ação que suspendeu a sessão da Câmara Municipal de Curitiba (PR), nesta quinta (19), que votaria a cassação do vereador Renato Freitas (PT). Ele acredita que a anulação do processo “é plenamente possível”. Este será o próximo passo da defesa.

Este é um caso típico de racismo. A defesa fez um recurso para poder suspender a sessão, alegando várias irregularidades, nulidades graves. Felizmente, o Judiciário acolheu uma delas, o que para nós foi o bastante para poder suspender o julgamento”, disse Kakay à Fórum.

O advogado destacou que entende a necessidade de uma discussão nacional sobre o racismo. “Este julgamento não é de um vereador de Curitiba, o que já seria grave. É um julgamento sobre como o Poder Legislativo vai fazer o enfrentamento das pessoas que têm a coragem, a dignidade e a representatividade popular de falar em nome dos negros.

Kakay ressaltou, ainda, que, em sua avaliação, a grande vitória na suspensão do julgamento foi criar condições de debater nacionalmente o racismo. “Não é mais Curitiba. Vamos discutir no Brasil inteiro a gravidade do que é cassar alguém com voto popular, que não fez absolutamente nenhum gesto que mereça, sequer, qualquer reprimenda.

O advogado relatou que, à época do episódio, o responsável pela Igreja, pela Cúria, entendia que era demais qualquer hipótese de cassação. “Tinha que ser uma coisa menor, mas que deveria ter uma reprimenda. Hoje, o padre que estava celebrando a missa no dia foi na porta dar um abraço no Renato e se solidarizar com ele.

“Ou seja, essa discussão, embora seja extremamente desgastante para o Renato e, talvez, para a democracia, por outro lado, eleva uma discussão importantíssima: é possível cassar alguém por racismo?”, questionou. Kakay.

Freitas avalia que decisão do Conselho de Ética não respeita ampla defesa e o contraditório

Renato Freitas declarou à Fórum que a liminar foi um recado de que há limites legais, constitucionais e também democráticos aos procedimentos da Câmara Municipal de Curitiba.

“A decisão comprova que a punição estabelecida pelo Conselho de Ética não respeita princípios basilares do direito, como a ampla defesa, o contraditório e o direito a um julgamento justo e imparcial”, disse.

Freitas ainda fez uma denúncia: “A mensagem com ataques racistas que recebi pelo e-mail do vereador relator do processo é muito grave. Disse que tem interesse em me ver fora da Câmara, me chamou de negrinho e falou que eu deveria voltar para a senzala. Ele, que é juiz do meu caso, que deveria me julgar com imparcialidade, justeza e legalidade”.

“A formação do Conselho que julgou o procedimento ético-disciplinar, que está ocorrendo nesta casa de leis, se apresenta como absolutamente parcial. O Poder Legislativo tem soberania, mas, como qualquer soberania, deve também respeitar os limites da Constituição e da democracia”, completou Freitas.

Entenda o caso

A perseguição imposta pelo Legislativo curitibano ao vereador ocorreu depois que ele comandou uma manifestação pacífica contra o racismo, na Igreja do Rosário, na capital do Paraná, no dia 5 de fevereiro de 2022.

Os manifestantes pediam justiça pelos assassinatos de dois homens negros, que tinham acontecido dias anteriores. Vários movimentos fizeram o mesmo pelo país.

Uma das vítimas foi o congolês Moïse Kabagambe, que cobrou atraso no pagamento de seus honorários, em um quiosque, no Rio de Janeiro, e morreu agredido violentamente. O outro foi o caso de Durval Teófilo Filho, assassinado por um sargento da Marinha, que supostamente o confundiu com um criminoso.

Na oportunidade, Freitas fez um discurso em defesa da vida. Porém, setores conservadores da cidade se incomodaram com o ato. Depois disso, cinco representações foram protocoladas contra o vereador na Câmara e transformadas em processo de quebra de decoro. 

A Arquidiocese de Curitiba chegou a apresentar ao Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara de Vereadores (CMC), em março, um documento pedindo que o vereador não fosse cassado. “A movimentação contra o racismo é legítima, fundamenta-se no Evangelho e sempre encontrará o respaldo da Igreja. Percebe-se na militância do vereador o anseio por justiça em favor daqueles que historicamente sofrem discriminação em nosso país. A causa é nobre e merece respeito”.