Em entrevista exclusiva ao Fórum Onze e Meia nesta quinta-feira (26), o ministro de Secretaria de Relações Institucionais (SRI) Alexandre Padilha afirmou que "decisão do Supremo tem que seguir" sobre a manobra tentada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para driblar as regras negociadas entre os três poderes para por fim ao chamado "Orçamento Secreto", esquema criado em conluio com o governo Jair Bolsonaro (PL) que pulverizou contratos suspeitos de corrupção nas bases eleitorais.
"Decisão do Supremo tem que seguir. Todas as decisões tomadas pelo STF, a AGU [Advocacia-Geral da União] faz a publicação e a gente cumpre", disse Padilha ao que cabe ao Executivo.
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Na última segunda-feira (23), Dino barrou a manobra de Lira, que tentou driblar o acordo. Para ocultar os nomes dos deputados, Lira enviou um ofício ao governo federal pedindo a liberação de R$ 4,2 bilhões em emendas apenas com as assinaturas dos líderes dos partidos - voltando a ocultar o nome dos parlamentares responsáveis pelas solicitações.
Em decisão judicial, Dino determinou a suspensão do pagamento e pediu à Polícia Federal a abertura de um inquérito para investigar a manobra de Lira.
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Nesta quinta-feira (26), em meio à ressaca do Natal, Lira entrou em desespero e convocou uma reunião de líderes para rebater Dino, que determinou ainda que a execução das emendas parlamentares relativas ao Orçamento de 2025 pelo governo Lula só será permitida após o registro completo das informações sobre os repasses no Portal da Transparência e na plataforma Transferegov.br, tanto do Legislativo quanto do Executivo.
O ministro ainda exige que a Câmara dos Deputados publique as atas das reuniões em que as emendas de comissão foram aprovadas dentro de 5 dias, encaminhando os documentos à Secretaria de Relações Institucionais, comandada por Padilha.
"Com essa nova decisão do Flávio Dino, eu acredito que essa reunião que o presidente Arthur Lira convocou, chamou os líderes, é para preparar uma resposta a essa decisão. O ministro Flávio Dino pede uma série de informações para a Câmara. Parece ter divergência entre o que algumas decisões apontam e outros líderes apontam. E é equacionar isso. E decisão do Supremo tem que se cumprir", disse o ministro de Lula ao Fórum Onze e Meia.
Avanços importantes
Padilha defendeu que as emendas parlamentares tragam necessidades locais, onde estão os nichos eleitorais dos deputados, às prioridades políticas do governo e do próprio Congresso, definidas nos chamadas PPAs, os Planos Plurianuais.
"Essa visão local tem que estar adequada às prioridades do governo e ao que o próprio Congresso estabelece no Plano Plurianual. A gente tem que transformar as emendas parlamentares cada vez mais em algo efetivo, que dialogue com as prioridades do país olhando as prioridades locais e regionais", afirmou.
Segundo Padilha, o acordo firmado entre Executivo e Legislativo trouxe três avanços importantes, que devem ser cumpridos por todas as partes envolvidas.
"Um foi provocar o projeto de lei construído pelo Executivo, Legislativo e Congresso Nacional que enquadrou o crescimento do volume das emendas parlamentares dentro do marco fiscal. Isso é um avanço importante porque se corria o risco de ter uma regra de crescimento das emendas muito maior que os outros investimentos e despesas. Isso faria, com o tempo, que todo recurso que o governo federal tem para investir fosse recrutado para as emendas parlamentares", disse.
Em seguida, ele elencou a segunda questão importante que freou a farra das chamadas "emendas Pix", os recursos com modalidade de “transferência especial” direta para estados, Distrito Federal ou municípios, sem necessidade de celebração de convênio ou contratos para serem efetivados.
"A partir desse diálogo, de todas as divergências que tem, um outro avanço importante que tem foi justamente acabar com as emendas Pix do jeito que elas existiam. Então passa a ter um objeto, um plano de trabalho, que é o que os próprios parlamentares estavam querendo. Pois, às vezes, passava-se o recurso e acaba sem saber direito qual município estava usando".
Por fim, Padilha cita "um terceiro avanço importante que é determinar que as emendas de bancada e as emendas de comissão voltem a ser para projetos estruturantes ou prioritários apontados pelo governo".
"Degradação institucional"
Na decisão, Dino citou uma série de investigações sobre esquemas de corrupção no direcionamento das emendas parlamentares envolvendo deputados (e/ou assessores), prefeituras e empresas suspeitas de pagamento de propina.
Um dos inquéritos, que foi suspenso por Gilmar Mendes e não é citado por Dino, envolve diretamente Arthur Lira no suposto esquema de corrupção com os chamados "kits robóticas". O principal assessor do deputado alagoano chegou a ser alvo de busca e apreensão da PF, que encontrou rascunhos de contas de "Arthur" supostamente com dinheiro oriundo de propinas.
“Tamanha degradação institucional constitui um inaceitável quadro de inconstitucionalidades em série, demandando a perseverante atuação do Supremo Tribunal Federal”, escreveu o ministro.
Segundo o ministro, "os recentes ‘cortes de gastos’ deliberados pelos Poderes Executivo e Legislativo tornam ainda mais paradoxal que se verifique a persistente inobservância de deveres constitucionais e legais – aprovados pelo Congresso Nacional – quanto à transparência, rastreabilidade e eficiência na aplicação de bilhões de reais”.
Dino, então, cita diversas denúncias de desvios e irregularidades na aplicação de verbas das emendas, ressaltando que "não é compatível com a ordem constitucional, notadamente com os princípios da Administração Pública e das Finanças Públicas", a continuidade de um ciclo de denúncias "nas tribunas das Casas do Congresso Nacional e nos meios de comunicação, acerca de obras malfeitas", "desvios de verbas identificados em auditorias dos Tribunais de Contas e das Controladorias", e "malas de dinheiro sendo apreendidas em aviões, cofres, armários ou jogadas por janelas, em face de seguidas operações policiais e do Ministério Público".
As malas de dinheiro se referem ao vereador Francisco Nascimento (União-BA). Primo de Elmar Nascimento (União-BA), que chegou a ser cotado por Lira para sucedê-lo na Presidência da Câmara, o vereador foi preso no último dia 10 e jogou uma mochila com R$ 200 mil pela janela com a chegada dos policiais.
Um dos inquéritos, que foi suspenso por Gilmar Mendes e não é citado por Dino, envolve diretamente Arthur Lira no suposto esquema de corrupção com os chamados "kits robóticas". O principal assessor do deputado alagoano chegou a ser alvo de busca e apreensão da PF, que encontrou rascunhos de contas de "Arthur" supostamente com dinheiro oriundo de propinas.
"Amigo da corte"
Em resposta ao ministro Flávio Dino, a Advocacia da Câmara dos Deputados negou que a casa legislativa tenha desobedecido "qualquer decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) para por fim ao chamado Orçamento Secreto, mas não explicou um suposto favorecimento a Alagoas, estado e nicho eleitoral de Arthur Lira.
"Repudia-se reiteradamente a imputação das partes e amici curiae [expressão em latina que significa 'amigo da corte'] a respeito da desobediência a qualquer decisão do Supremo Tribunal Federal. Esta Casa, tanto neste processo como em todos nos quais atua perante a Corte, o faz com boa-fé e observância do princípio republicano. Nestes autos, inclusive, deu integral cumprimento às determinações do Relator e do Tribunal, ao passo em que interpôs os recursos cabíveis", diz o texto de 22 páginas enviado na madrugada desta sexta-feira (27) a Flávio Dino.
A resposta, assinada por Jules Michelet Pereira Queiroz e Silva, advogado da Câmara, afirma que as "emendas referidas no documento 1064 se deu no ciclo legislativo orçamentário do ano de 2023" e foram aprovadas pelas comissões.
A Câmara ainda refuta que o documento, assinado apenas pelas 17 lideranças partidárias, tenha omitido os nomes dos deputados que requisitaram os recursos afirmando que "as atas de deliberação das emendas estão publicadas no site da Câmara dos Deputados desde o ciclo orçamentário de 2023, relacionadas inclusive ao número das emendas", enviando o link do documento.
Sobre a suspensão das comissões para impedir a deliberação do colegiado sobre as emendas, o documento diz que Lira tomou a decisão "para possibilitar em esforço concentrado às proposições de controle de gastos do Poder Executivo, que seriam votadas pelo Plenário da Câmara dos Deputados".
"Feitos esses esclarecimentos, pleiteia-se a reconsideração ou revogação de todas as medidas determinadas na decisão de 23 de dezembro", conclui o texto pedindo, entre outros, a liberação dos R$ 4,2 bilhões.
O documento, no entanto, não explica porque o estado de Lira foi o principal beneficiado com a destinação das emendas.
Em entrevista na noite desta quinta-feira (26), após se reunir com Lula e líderes dos partidos, Lira afirmou que o pagamento das emendas que foram alvo de Dino seguiram "critérios rigorosos" e estavam em conformidade com as normas acordadas em reunião entre membros do Executivo e Legislativo.
“Peticionaremos ainda na manhã de sexta-feira ao ministro relator esclarecendo todos os pontos da decisão dele para que ele tire todas as dúvidas”, afirmou, sobre o documento enviado horas depois ao STF.
Assista à entrevista de Padilha ao Fórum Onze e Meia