Em meio ao escândalo das fraudes de pagamento a aposentados e pensionistas do INSS, o Fórum Onze e Meia desta quinta-feira (24) recebeu o presidente do Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos (Sindnapi), Milton Cavalo, para analisar o caso.
Nesta quarta-feira (23), a Polícia Federal (PF) deflagrou a Operação Sem Desconto, que mirou um esquema nacional de descontos associativos não autorizados em aposentadorias e pensões. Ao todo, foram cumpridos 211 mandados judiciais de busca e apreensão. Segundo a PF, o esquema movimentou mais de R$ 6 bilhões entre 2017 e 2024.
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Durante a entrevista, o dirigente afirmou que essa quantia de R$ 6 bilhões, que ainda não está confirmada, é de recursos oriundos de mensalidades associativas de entidades, que hoje são 33 no total. Ele destacou que é preciso "separar aquelas que realmente fazem [o trabalho] de uma forma correta e aquelas que não fazem".
"Para elucidar, em 2017, numa reunião do Conselho Nacional da Previdência - isso inclusive está gravado - a nossa diretora e o nosso presidente da época, Marcos Bulgarelli, já denunciaram essa prática de fazer associações indevidas sem o consentimento dos aposentados", afirmou Milton.
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O sindicalista acrescentou que ele próprio, em 2022, fez a mesma denúncia esclarecendo que era necessário que algumas medidas fossem tomadas pois "na hora que tivesse uma investigação, iam colocar todo mundo no mesmo balaio e não ia separar quem realmente faz o trabalho com os aposentados - de reivindicação, de benefícios - daqueles que simplesmente entraram no processo para poder usufruir de recursos provenientes sem a devida autorização dos aposentados". "É isso que está se tratando", acrescentou.
Milton Cavalo ainda informou que, desde o primeiro momento, o Sindnapi publicou uma nota apoiando a ação da Polícia Federal. Ele também destacou que em nenhum momento recebeu alguma intimação ou investigação da PF em alguma de suas 80 sedes pelo país.
"Não foi apreendido qualquer tipo de material nosso. Então, não podemos dizer que fomos alvo de uma operação da Polícia Federal", disse. Ele afirmou que o que está acontecendo é que o Sindnapi faz parte de uma investigação há anos, junto ao Tribunal de Contas da União, e que depois a Controladoria-Geral da União realizou visitas nos sindicatos para recolher documentos. Milton ainda disse que, das 29 entidades investigadas, 70% não entregaram a documentação para o INSS, segundo o relatório da CGU.
"Agora, quais foram as entidades que não fizeram isso? Não está claro. Também cita entidades que cresceram em volume absurdo sem ter uma estrutura para poder atender isso. Também não fala quais", disse o sindicalista. "Nós estamos tranquilos, porque tudo que foi pedido foi entregue para o INSS, no prazo que foi dado", ressaltou.
"É uma entidade que existe há 25 anos, que foi forjada nos moldes do sindicalismo italiano. Então, assim, nós temos um passado. E outro, nós não chegamos a ter 300 mil de uma hora para outra. Em 2008, nós tínhamos quase 180 mil aposentados. Então, não teve um aumento absurdo", defendeu.
"Dizem que o que pode acontecer é que muitos aposentados esquecem que ficaram sócios dos sindicatos. O que se tem muito é que muitos acabam se esquecendo, com vários fatores da idade. Muitos entraram no processo lá atrás para reaver os recursos da poupança, de plano impresso, essas coisas todas. Ficaram sócios e agora não se recordam que ficaram sócios naquela época. Então, assim, tem muito disso", explicou o presidente.
"Mas nós estamos dispostos a colaborar com qualquer tipo de investigação, desde que, inclusive, nós possamos saber do que estamos sendo acusados. Porque nós não fomos intimados, correu sob sigilo de Justiça. Agora que nós descobrimos, pela imprensa, o processo e a vara do juiz lá de Brasília que deu a liminar", disse. Ele apontou que o Sindnapi deseja ter informações para que possa se apresentar aos autos e saber o que está sendo falado sobre a entidade.
"Em nenhum momento nossa entidade, uma entidade séria, se omitiu de qualquer tipo de informação. Tanto é que, se não fosse isso, nós não iríamos estar denunciando essas práticas abusivas, porque nós somos vítimas disso", afirmou.
Direitos dos aposentados sindicalizados
Milton Cavalo explicou que há dois tipos de associações, que descontam certa quantia do salário. "Nós temos duas associações, que é uma porcentagem sobre o salário que ele recebe. Então, são 2,5% limitados ao teto da previdência, de 1% do valor máximo da previdência, que hoje seria R$ 88. De acordo com o aumento do salário mínimo e o teto da previdência, esse valor aumenta porque o salário mínimo também aumenta".
Ele apontou que, inclusive, o relatório do TCU cita um valor de mensalidade diferente do Sindnapi, de 2,9%. "Então, assim, tem muitas falhas que nós precisamos ter acesso para poder claramente mostrar que nós não temos qualquer tipo de envolvimento nesse tipo de coisa".
Entre os benefícios dos associados ao Sindnapi, Milton mencionou assessoria jurídica em todo o brasil, acesso a créditos, descontos em farmácia, planos de saúde, laboratórios, uma estrutura de lazer com colônias de férias conveniadas, clubes de campo, pousadas e hotéis parceiros, entre outros.
Em relação à possibilidade de bloqueio dos repasse dos associados, ele comentou que é uma preocupação da entidade, pois o sindicato vive de "contribuições voluntárias". "Eu não vou conseguir pagar advogado, eu não vou conseguir pagar funcionário, aluguel, a nossa estrutura é grande. Então, isso realmente está nos deixando muito preocupados, porque nós vivemos de contribuições voluntárias".
O presidente voltou a reforçar que "não dá para colocar todo mundo no mesmo balaio e falar 'corta tudo'. Nós sempre defendemos e cobramos isso [fiscalização], que tinha que realmente dar um basta nisso", destacou.
Por fim, o dirigente afirmou que é preciso aproveitar o momento para investigar e diferenciar os sindicatos que realmente fazem o trabalho correto dos que aplicam fraudes. Ele ainda fez questão de diferenciar que muitas entidades que se denominam sindicato na verdade são associações.
"Nós temos que aproveitar o momento, inclusive, para realmente ver quem é aquele que realmente tem estrutura, que faz um trabalho, que tem uma história em prol dos aposentados", disse.
"Vamos estar em Brasília, os sindicatos, fazendo manifestação pela melhoria das aposentadorias. No 1º de maio, vamos estar lá lutando. Então, assim, é um sindicato que não é para só ficar arrecadando. É um sindicato que luta. E é lógico que eles vão pegar aqueles que realmente têm um trabalho, têm uma história, para poder denegrir essa imagem", lamentou.
"Então, é difícil. Tem que ser investigado, mas, assim, não pode a coisa virar. Pegar um sindicato por conta dessas particularidades e querer ser a bola da vez para o uso político", finalizou o presidente.
Confira a entrevista completa de Milton Cavalo ao Fórum Onze e Meia:
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