Ao exigir mudanças no cálculo de desemprego, Bolsonaro demonstra desconhecer o assunto

“O IBGE foi criado em 1936, passou pelo Estado Novo e pelo Regime Militar sem nunca ter sofrido qualquer tipo de interferência de um presidente”, lembrou um economista

Foto: Pedro Ventura/Agência Brasília.
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O presidente eleito Jair Bolsonaro diz que vai mudar a fórmula de cálculo do desemprego do IBGE pois, de acordo com ele, a maneira como é feito “é uma farsa”. Ao apontar como deveria ser feito o cálculo, Bolsonaro demontra desconhecimento e propõe mudanças que já acontecem. “Vou querer que a metodologia para dar o número de desempregados seja alterada no Brasil. O que está aí é uma farsa. Quem recebe Bolsa Família é tido como empregado, quem não procura há mais de um ano é tido como empregado, quem recebe seguro-desemprego é tido como empregado. Nós temos que ter uma taxa não de desempregados, mas uma taxa de empregados no Brasil.” O presidente do IBGE, de 1994 a 1999, Simon Schwartzman, afirma que os critérios citados na declaração de Bolsonaro para definir quem está empregado não condizem com os usados na estatística oficial: “Ele (Bolsonaro) está mal informado. É legítimo o governo levantar a questão, questionar, solicitar estudos, pedir ao instituto que examine sua metodologia e pedir uma proposta de revisão, que deve vir do próprio IBGE. O que não pode é vir uma determinação de cima, impondo como deve ser. Isso tem como consequência a desmoralização e uma descrença nos dados.” De acordo com a jornalista Miriam Leitão, “não é verdade que quem recebe Bolsa Família é tido como ‘empregado’. O conceito é mundial, recomendado pela Organização Internacional do Trabalho. É considerado desempregado quem procura por uma ocupação e não a encontra. A pessoa pode receber o Bolsa Família e estar a procura de um trabalho. O mesmo vale para quem recebe o seguro-desemprego. Já a pessoa que desistiu de procurar realmente não conta como desempregada, mas o IBGE calcula também o tamanho desse grupo. Ela passa para a estatística como desalentada. Atualmente são 4,8 milhões de pessoas nessa situação, um número recorde. O IBGE também já calcula uma ‘taxa de empregados’. Entre as pessoas em idade de trabalhar, 54,4% estavam ocupadas no terceiro trimestre, mesmo nível de um ano antes”, escreveu. Um economista entrevistado pelo Globo que trabalha com as estatísticas produzidas pelo IBGE explica que em nenhum momento a instituição correu o risco de sofrer interferência. “O IBGE foi criado em 1936, passou pelo Estado Novo e pelo Regime Militar sem nunca ter sofrido qualquer tipo de interferência de um presidente”, disse o economista, que preferiu não se identificar.