Áudio mostra que gestão Doria favoreceu Ambev em licitação do carnaval

A secretaria adjunta de Cultura de São Paulo, Josephine Bourgois, é casada com Denis Mizne, diretor da Fundação Lemann. A Fundação, que desenvolve projetos em educação, foi fundada em 2002, pelo empresário Jorge Paulo Lemann, dono da Ambev.

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A secretaria adjunta de Cultura de São Paulo, Josephine Bourgois, é casada com Denis Mizne, diretor da Fundação Lemann. A Fundação, que desenvolve projetos em educação, foi fundada em 2002, pelo empresário Jorge Paulo Lemann, dono da Ambev. Da Redação* Gravação obtida pela rádio CBN indica que a Ambev foi favorecida pela gestão do prefeito João Doria na licitação para realizar o carnaval paulistano através da Dream Factory, agência contratada pela Ambev. Quem conduziu o processo da licitação, sob orientação do vice-prefeito Bruno Covas, foi o secretário de Cultura André Sturm. Há um detalhe, no entanto, que escapou à reportagem. A secretária adjunta de Cultura de São Paulo, Josephine Bourgois (foto), é casada com Denis Mizne, diretor da Fundação Lemann. A Fundação, que desenvolve projetos em educação, foi fundada em 2002, pelo empresário Jorge Paulo Lemann, dono da Ambev, entre outras empresas e considerado um dos homens mais ricos do mundo. De acordo com matéria da CBN, que foi ao ar nesta segunda-feira (12), o edital, publicado ainda na gestão Haddad, estabeleceu que sairia vencedora a proposta com maior gasto em itens de interesse público, como segurança, limpeza, banheiros químicos e ambulâncias. Em dezembro, a proposta da Dream Factory, agência contratada pela Ambev, foi escolhida porque as outras três concorrentes foram impugnadas. Mas uma delas, a SRCOM, parceira da Heineken, recorreu. Em janeiro, a Comissão Avaliadora da Secretaria de Cultura decidiu recolocar a proposta da SRCOM na disputa, com o aval do secretário de Negócios Jurídicos da prefeitura, Anderson Pomini. O valor da proposta da Dream Factory foi de R$ 15 milhões. A da SRCOM, de R$ 8,5 milhões. Após um pente-fino, a comissão avaliadora viu que na proposta da Dream Factory apenas R$ 2,6 milhões eram itens de interesse público. Na da SRCOM, esses itens somavam o dobro, R$  5,1 milhões. A comissão avaliadora, órgão legalmente responsável pela escolha, decidiu que proposta da Heineken era a melhor, mas a gestão Doria passou por cima da decisão. A reportagem da CBN obteve um áudio de uma reunião entre funcionários da Secretaria de Cultura, entre eles a chefe de gabinete do secretário, Giovanna de Moura Rocha Lima, e dois diretores da Dream Factory. Nela, os representantes da empresa e a chefe de gabinete narram outra reunião na prefeitura em que o vice-prefeito Bruno Covas orienta os integrantes da Ambev e da Dream Factory a alterar os itens da planilha da proposta para justificar os 15 milhões e, assim, vencer a concorrente. Participaram desta reunião o secretário de Governo, Julio Semeghini, e o da Cultura, André Sturm. O encontro aconteceu em 17 de fevereiro, véspera do pré-carnaval. Doria estava em Dubai, em viagem oficial. O áudio mostra que empresa e gestão ainda discutiam os valores da proposta 20 dias depois da escolha ter sido homologada. Os integrantes da Dream Factory também reclamam que, àquela altura, não poderiam inflar os valores como, segundo eles, Sturm estava pedindo. Transcrição da gravação: DIRETOR DA DREAM FACTORY 1 - A Ambev é a única que pode fazer o que o secretário (André Sturm) quer. Que é aumentar o valor. É a única... CHEFE DE GABINETE - Isso, aumentar o valor, exatamente DIRETOR 1 - E a Ambev vai querer envolver o prefeito nessa reunião. Eu acho que vai dar uma m... do c... CHEFE DE GABINETE - Não tem problema. Mas o prefeito já voltou de Dubai? DIRETOR 1 - Não sei, a gente vai envolver o prefeito ou o Bruno (Covas). Acho que não vai ser boa essa reunião. CHEFE DE GABINETE - Mas o Bruno inclusive estava nessa reunião em que eles conversaram... DIRETOR 1 - Ele lembra, o Bruno lembra. DIRETOR DA DREAM FACTORY 2 - Ele deu a saída e saiu. CHEFE DE GABINETE - Ah, ele não ficou? DIRETOR 2 - Ele deu a solução para o André (Sturm), largou no colo do André... CHEFE DE GABINETE - Aí ficou o (Julio) Semeghini, o secretário do governo? DIRETOR 1  -  (inaudível) A Ambev... DIRETOR 2 - (Tinha) a oferta de R$ 15 milhões (da Dream Factory) , a de R$ 8 milhões (da SRCOM), está dito no edital que você pode mexer nos escopos. CHEFE DE GABINETE - Aí mexe nos escopos? DIRETOR 2 - Aí ele (Bruno Covas) levantou e foi embora. Aí o André falou "Se eu perguntar oficialmente, vocês responderem oficialmente, eu resolvo." Outro lado André Sturm nega que houve direcionamento e que ele tenha pedido para inflar os valores da planilha. O secretário afirma que a proposta da Ambev era a única que cobria todos os gastos do Carnaval. "O que nós fizemos foi, de acordo com o edital de chamamento, tem um item que garante essa possibilidade de trocar dentro dos itens apresentados os quantitativos, que foi o que nós propusemos. Isso permitiu que a prefeitura, que em 2016 gastou R$ 10 milhões no Carnaval, esse ano gastar zero. Então, não houve um favorecimento de maneira nenhuma. Houve, sim, um investimento muito maior em serviços para a cidade que permitiu um carnaval de rua com muito mais conforto para os foliões." Anderson Pomini diz que todo o processo ocorreu dentro da lei e respeitou as regras do edital. Ele afirmou, no entanto, que a gestão vai modificar os decretos municipais que regulamentam parcerias. "O chamamento é disciplinado por decretos municipais, e não pela lei que regulamenta as licitações (lei federal 8.666/90) (...) Há a necessidade de um decreto específico sobre o Carnaval. Já existe um estudo justamente para que problemas como esse sejam evitados para o próximo Carnaval." Em nota, a Ambev informou que o edital previa a redistribuição dos valores da proposta entre os itens. A empresa sustenta que não houve oferecimento de novo valor durante a concorrência. A Dream Factory informou que a realocação dos recursos obedeceu ao edital, ocorreu sob orientação da comissão de avaliação e que foi perfeitamente lícita. Questionada sobre o conflito de interesse pelo fato da secretária adjunta ser casada com diretor da Fundação Lemann e a Ambev vencer a licitação para o carnaval, a secretaria informou que "a secretária-adjunta de Cultura não participou em nenhum momento do processo de seleção do chamamento público para o Carnaval de Rua 2017, nem mesmo da comissão de seleção". *Com informações da CBN Foto: Facebook