Carta aberta ao companheiro Marcelo Freixo, por Theófilo Rodrigues

"Em 2020, provavelmente não teremos uma unidade partidária da esquerda no Rio mais uma vez"

O deputado Marcelo Freixo (PSOL-RJ) - Foto: Reprodução/Twitter
Escrito en POLÍTICA el

 
Por Theófilo Rodrigues

Caro Marcelo,

Li ontem com certa resignação o texto do Bernardo Mello Franco em que foi anunciada a sua desistência da disputa pela prefeitura do Rio de Janeiro. Compreendo as razões políticas e pessoais que devem ter levado à sua decisão, mas essa compreensão não minimiza a sensação de que as coisas poderiam ter sido diferentes.

Vivemos dias estranhos. Por um lado, o fascismo parece ganhar uma musculatura maior a cada dia que passa. O assassinato de Marielle e a prisão do ex-presidente Lula são símbolos desse avanço antidemocrático, bem como os discursos diários do atual presidente da República. Mas, por outro lado, como uma vacina social contra o vírus do fascismo, há uma energia revigorante, uma potência democrática que emerge da sociedade civil. Basta olharmos para o que acontece em Paraisópolis, na Rocinha e em tantas outras comunidades, em que comitês gestores organizados pelos próprios moradores fomentam a participação social como instrumento de combate contra a pandemia. O que lhes falta é um ponto nodal que consiga articular esse frescor da sociedade com a experiência dos partidos políticos democráticos. Dito de outro modo, o que lhes falta é a mediação da política e as eleições costumam ser momentos propícios para esse encontro.

Com certeza, você se lembra bem da eleição de 2016. Naquela ocasião também não houve uma unidade partidária da esquerda no Rio. O campo progressista se dividiu entre as candidaturas de Alessandro Molon (REDE), Jandira Feghali (PCdoB) e a sua. Mas, o que já estava claro naquele momento era que, se os partidos políticos não fossem capazes de construir a unidade de cima para baixo, os eleitores a fariam de baixo para cima. E foi exatamente isso o que aconteceu. O eleitorado progressista da cidade esperou até a última pesquisa para decidir em quem votar. Como o seu nome aparecia na dianteira, houve uma migração em massa dos eleitores da esquerda em direção à sua candidatura. Você não apenas desbancou o candidato da máquina municipal, Pedro Paulo, como chegou ao segundo turno contra Marcelo Crivella. Um feito inacreditável se considerarmos que 2016 foi um ano de enormes derrotas para a esquerda no contexto do impeachment de Dilma Rousseff.

Em 2020, provavelmente não teremos uma unidade partidária da esquerda no Rio mais uma vez. Além da sua candidatura, que agora foi retirada, provavelmente o campo da esquerda contará ainda com as legítimas pretensões de Martha Rocha (PDT) e Brizola Neto (PCdoB). Mas nessa eleição, não tenha dúvidas, assim como já foi em 2016, será o eleitorado quem forçará a unidade a fórceps na véspera da eleição. Aquele candidato de esquerda que estiver melhor posicionado nas pesquisas da última semana receberá os votos do eleitorado progressista carioca. E esse será o responsável por vocalizar com legitimidade as demandas dessa sociedade civil que floresce no Rio.

Tudo indica que, em outubro, no Rio, teremos dois cenários possíveis para o segundo turno. Podemos supor que um cenário seja a presença de duas candidaturas da direita do espectro político no segundo turno: Eduardo Paes (DEM) e Marcelo Crivella (PRB). Um segundo cenário possível é o enfrentamento de Eduardo Paes contra algum candidato progressista. Infelizmente, sem a sua candidatura, o eleitor carioca vê as possibilidades para esse segundo cenário serem reduzidas.

Quero acreditar que Flávio Dino esteja correto quando diz que “seu gesto de renúncia à candidatura no Rio deve ser lido como um convite à unidade do nosso campo”. Esse, aliás, tem sido o mantra do partido de Dino nos últimos anos: a luta pela unidade popular e democrática em torno do que define como uma frente ampla contra o fascismo.

Seja como for, se a opção for mesmo pela desistência da disputa no Rio, contento-me em lembrar que ao menos o Congresso Nacional ganha com sua presença por lá, como já restou demonstrado em seu protagonismo contra o excludente de ilicitude de Moro e Bolsonaro.

Boa sorte na jornada,
Theo.
 
Theófilo Rodrigues é Coordenador do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé.