Em defesa do sistema eleitoral, CNBB, OAB, Comissão Arns, ABC, ABI e SBPC se reúnem com Barroso

Entidades de diferentes segmentos da sociedade entregarão carta ao presidente do TSE em apoio às urnas eletrônicas, diante dos ataques e ameaças golpistas de Bolsonaro

Foto: Antonio Augusto/Ascom/TSE
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Diante dos recorrentes ataques ao sistema eleitoral brasileiro e ameaças golpistas contra a eleição de 2022 feitos por Jair Bolsonaro, seis importantes entidades que representam diferentes segmentos sociais se reunirão nesta quarta-feira (4) com o ministro Luís Roberto Barroso, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

O objetivo das entidades com a audiência, que se dará de maneira virtual a partir das 18h, é sair em defesa das urnas eletrônicas, que vêm tendo sua segurança colocada em xeque por bolsonaristas, e entregar a Barroso uma carta manifestando solidariedade ao ministro e em apoio ao sistema eleitoral tal como ele consiste atualmente.

Participarão da reunião Dom Walmor Oliveira de Azevedo, presidente da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil); Felipe Santa Cruz, presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil); José Carlos Dias, presidente da Comissão Arns (Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns); Luiz Davidovich, presidente da ABC (Academia Brasileira de Ciências); Paulo Jeronimo de Sousa, presidente da ABI (Associação Brasileira de Imprensa); e Renato Janine Ribeiro, presidente da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência).

Confira a carta entregue pelas entidades a Barros ao final desta matéria.

"Vertente do autoritarismo"

Nesta quarta-feira (4), Barroso voltou rebater os ataques e ameaças que Bolsonaro faz ao sistema eleitoral.

O magistrado afirmou que essas atitudes do presidente representam “vertentes do autoritarismo contemporâneo”.

“Isso é democracia. Uma das vertentes do autoritarismo contemporâneo é o discurso de ‘se eu perder, houve fraude’. É a inaceitação do outro, de que alguém diferente de mim possa ganhar as eleições”, declarou, durante evento do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE-RJ).

Na segunda (2), o TSE enviou um pedido ao STF para que Bolsonaro seja investigado por propagar fake news.

O tribunal aprovou, ainda, uma portaria da Corregedoria-Geral da Justiça Eleitoral para instauração de um inquérito administrativo contra Bolsonaro. Ambas as decisões foram unânimes.

A furada do voto impresso e de que a urna não é auditável

Uma das principais bandeiras levantadas por Bolsonaro para encampar sua tese de fraude nas urnas é a da implementação do voto impresso.

Em entrevista recente à Fórum, o advogado Renato Ribeiro de Almeida, professor de direito eleitoral e coordenador acadêmico da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), avaliou que essa narrativa se dá pelo fato de que o chefe do Executivo sabe que vai perder o próximo pleito e, por isso, tenta criar um inimigo. No caso, a urna eletrônica.

Segundo o especialista, a ideia de se imprimir um papel confirmando o voto do eleitor após o processo de digitar os números do candidato da urna abriria margem para a fraude que os bolsonaristas hoje alegam – sem provas – existir.

“Há o argumento que a urna não não seria auditável. Isso é de uma profunda ignorância porque parte do pressuposto que auditoria é o papel que conta de novo. E não é isso. Auditoria é um conceito muito maior. Auditoria pode ser eletrônica. Ver se alguém acessou, se teve fraude. A auditoria é muito mais sofisticada do que simplesmente fazer uma contagem de papel. É uma leitura simplória que o presidente tem sobre esse assunto”, pontua.

Taxa de erros

Sobre a instalação de uma impressora acoplada à urna, Almeida diz que isso trará “uma taxa muito maior de erros”.

“Temos uma taxa de erros em torno de 0,5% por eleição. E a urna funciona na barranca do Rio Amazonas, até com bateria se for o caso. Tem 0,5% de troca de urnas, valendo aquela votação já recebida. Ou seja, ninguém perde o voto por isso. Se você coloca um equipamento como uma impressora – todo mundo que tem uma em casa sabe que em algum momento ela trava, por melhor que seja – você está acoplando à urna um equipamento muito mais caro, estamos falando de bilhões de reais, e que pode dar problema. Você vai ter uma taxa muito maior de erros só de colocar o voto impresso”, analisa.

Além do aspecto tecnológico, o advogado cita uma situação que poderá ser observada caso o voto impresso seja implantado.

“Se criará o caos na eleição. Imagina uma pessoa que, de caso pensado, vai lá e aperta o 13, vota no Lula, só que na hora que imprime, sai que ele votou no Lula, e ela começa um escândalo dizendo que votou no Bolsonaro. Ela vai colocar em xeque toda a urna em que está se votando. Ninguém vai ter a comprovação de que de fato ela votou no PT porque ninguém filma, o voto é secreto. Então, é um atributo a ser utilizado para desacreditar a eleição”, declara.

Carta em defesa do sistema eleitoral

"Exmo. Sr. Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Ministro Luís Roberto Barroso,

Como presidentes das entidades abaixo-assinadas, vimos à presença de Vossa Excia. prestar solidariedade a esse Tribunal, levando em conta o delicado momento político do país. Permita-nos relembrar que, em março de 2020, estas seis entidades reagiram publicamente a ameaças feitas pela autoridade máxima da Nação, contra o Congresso e o Supremo Tribunal Federal. Naquela oportunidade, o início de uma pandemia de proporções inimagináveis, conclamamos a sociedade brasileira a zelar pelas instituições, “pela obrigação moral de todos em defendê-las e fortalecê-las”.

Lamentavelmente, o processo de erosão democrática prossegue, atingindo contornos incompatíveis com o equilíbrio entre os Poderes e a manutenção do clima de paz e concórdia entre os cidadãos. Sr. Ministro, é espantoso como, sob o impacto de mais de 550 mil vidas perdidas na maior crise sanitária já enfrentada pelo país, perca-se tanto tempo e energia em tentar demolir o edifício democrático!

Tentativas de ruptura da ordem institucional, hoje tratadas abertamente, buscam colocar em xeque a lisura do processo eleitoral e de algo que nos é sagrado – o voto. Nesse sentido, ameaçar a não realização de eleições em 2022, caso o resultado das urnas possa vir a contrariar os interesses daquele que detém o poder, é ofensa grave que não se pode tolerar. Porque não são os políticos de plantão, nem grupos civis ou militares ligados a eles, que determinarão a integridade do processo eleitoral. Tal missão já está confiada à Constituição, guardiã maior da democracia.

Sr. Ministro, reiteramos apoio incondicional ao sistema eletrônico de votação, sob monitoramento e responsabilidade desse Tribunal, e apelamos ao Congresso Nacional para que proteja esta que é, a um só tempo, grande conquista da sociedade e prova da eficiência da Justiça eleitoral brasileira. Investir contra essa realidade, de forma a turvar o processo político, fomentar o caos e estimular ações autoritárias, não é, em definitivo, projeto de interesse do povo brasileiro.

Com protestos de estima e admiração,

Dom Walmor Oliveira de Azevedo, presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB Felipe Santa Cruz, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil - OAB José Carlos Dias, presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns Luiz Davidovich, presidente da Academia Brasileira de Ciências - ABC Paulo Jeronimo de Sousa, presidente da Associação Brasileira de Imprensa - ABI Renato Janine Ribeiro, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência- SBPC"