Francischini cassado por fake news contra as urnas pode levar Bolsonaro a ter o mesmo destino

Presidente reproduziu narrativa muito parecida com a que levou deputado do Paraná a ser cassado pelo TSE; especialistas ouvidos pela Fórum dizem quais podem ser os efeitos dessa decisão para o chefe do Executivo

Fernando Francischini, cassado pelo TSE por fake news, e Bolsonaro (Reprodução)
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O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) cassou, nesta quinta-feira (28), o mandato do deputado estadual Delegado Francischini (PSL-PR) por fake news contra as urnas eletrônicas e o sistema eleitoral brasileiro. Com resultado final de 6 votos a 1, a corte ainda deixou o parlamentar inelegível por oito anos. Para especialistas ouvidos pela Fórum, a decisão pode respingar no presidente Jair Bolsonaro, que adota o mesmo expediente.

Trata-se da primeira cassação por este motivo e abre precedente para outros casos do tipo.

Francischini, que na época era deputado federal, foi acusado de uso indevido dos meios de comunicação, bem como de abuso de poder político e de autoridade, práticas ilegais previstas no artigo 22 da Lei Complementar nº 64/1990 (Lei de Inelegibilidade).

No dia da eleição presidencial, em outubro de 2018, e ainda com a votação aberta, Francischini fez uma live no Facebook para afirmar que duas urnas eletrônicas estavam fraudadas e não estariam permitindo o voto em Jair Bolsonaro. A mentira foi espalhada para 6 milhões de pessoas que assistiram ao vídeo na rede social.

Bolsonaro faz o mesmo e é alvo de inquérito

O caso de Francischini remete a Jair Bolsonaro, já que é de conhecimento público que o presidente destila fake news contra as urnas eletrônicas, os sistema eleitoral em si e já chegou até mesmo a ameaçar a realização do próximo pleito caso não seja instituído o “voto impresso”.

O chefe do Executivo, por mais de uma ocasião, afirmou que a própria eleição em que saiu vitorioso foi fraudada e chegou a fazer uma live, em julho, para apresentar “provas” das supostas fraudes nas urnas. Essas provas, no entanto, nunca foram apresentadas.

Diante disso, em agosto, o TSE decidiu, por unanimidade, abrir um inquérito contra o presidente para “apurar fatos que possam configurar abuso do poder econômico e político, uso indevido dos meios de comunicação, corrupção, fraude, condutas vedadas a agentes públicos, propaganda extemporânea, relativamente aos ataques ao sistema eletrônico de votação e à legitimidade das Eleições de 2022”.

Jurisprudência

Ouvido pela Fórum, o advogado Renato Ribeiro de Almeida, especialista em Direito Eleitoral, afirmou que “a cassação do mandato do Fernando Francischini abre uma jurisprudência da mais alta corte eleitoral do país, dizendo categoricamente que um ataque ao sistema eleitoral sem provas, disseminando fake news e colocando em xeque a própria lisura das eleições não passará mais impune por parte da própria justiça eleitoral”.

Também especialista em Direito Eleitoral e sócio da Peccinin Advocacia, o advogado Luiz Eduardo Peccinin disse à reportagem que a decisão do TSE sobre Francischini pode, sim, afetar as investigações em curso contra Bolsonaro na Corte. “Diante dos últimos eventos, esse era um precedente que o TSE já estava esperando criar”, pontua.

Já o advogado eleitoral Francisco Emerenciano, também em análise enviada à Fórum, acredita que “uma vez que o TSE caminha para a cassação de mandato do deputado, é gerada a expectativa de que o mesmo entendimento possa ser adotado em ação judicial a questionar os atos de Jair Bolsonaro”. O especialista pondera, contudo, que o tribunal nunca cassou o mandato de um presidente da República.

Moraes manda recado

Durante o julgamento que cassou o mandato de Francischini, o ministro Alexandre de Moraes, que presidirá o TSE durante as eleições de 2022, deu um alerta.

“A Justiça Eleitoral, assim como toda a Justiça, pode ser cega, mas ela não é tola. Não podemos criar de forma alguma um precedente avestruz, ‘ah, não ocorreu nada’. Todo mundo sabe o que ocorreu, todo mundo sabe o mecanismo utilizado nas eleições e depois das eleições. Se houver repetição do que foi feito em 2018, o registro será cassado, e as pessoas que assim fizerem isso irão para a cadeia por atentarem contra as eleições e a democracia no Brasil”, disparou, sinalizando que, se Bolsonaro mantiver a prática de destilar fake news contra as urnas durante o período eleitoral, será punido.

Parlamentares celebram

Nas redes sociais, parlamentares celebraram a cassação de Francischini por parte do TSE.

“Decisão histórica: TSE cassa deputado bolsonarista por fake news. O desejo é que Bolsonaro tenha o mesmo destino!”, disse Paulo Pimenta (PT-RS).

“É a primeira vez que o TSE cassa um mandato por propagação de fake news! Que seja o primeiro de todos que trabalham com base na mentira”, escreveu a deputada federal Fernanda Melchionna (PSOL-RS). “HÁ GABINETE DO ÓDIO, SIM! A promessa do ministro de Alexandre de Moraes precisa ser cobrada. O que aconteceu em 2018 não pode se repetir. É preciso acabar com as milícias digitais”, completou a parlamentar.

A presidenta do PT, Gleisi Hoffmann (PT-PR), também elogiou o TSE. “Pedagógica decisão do TSE de cassar Fernando Francischini (PSL-PR) por Fake News contra as urnas eletrônicas. É bom que sirva de exemplo pra frear as inúmeras mentiras da direita nas redes sociais. A política precisa sair do ódio, mentira e viver o bom debate em prol da sociedade”, tuitou.

“Fui uma vítima dos disparos em massa e de fake news em 2018. Condenamos Dallagnol no CNMP e na Justiça comum. Com as decisões da CPI, STF e TSE vemos uma luz no fim desse túnel de mentiras”, disse ainda o senador Renan Calheiros (MDB-AL), relator da CPI do Genocídio.