Jornalista Bianca Santana derrota Bolsonaro na Justiça e ganha indenização por danos morais

Bianca declarou à Fórum que “o texto do relator, que embasou o voto dos desembargadores, é uma importante peça na defesa da liberdade de expressão e do exercício do jornalismo”

Bianca Santana. Foto: Reprodução YouTube
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A sentença que condenou o presidente Jair Bolsonaro (Sem Partido) a indenizar em R$ 10 mil a jornalista Bianca Santana foi confirmada nesta quarta-feira (18), pelo Tribunal de Justiça de São Paulo.

Durante uma live, em maio de 2020, o presidente acusou a jornalista em seu canal do YouTube de ter veiculado fake news. No fim de julho, ele reconheceu o erro, excluiu a live e pediu desculpas. “Eu erro também, né. Lamento o ocorrido da live de 28 de maio, peço desculpas à jornalista Bianca Santana. Fiz referência a várias reportagens fake news, e uma eu falei que era dela, mas não era”, disse.

Sobre a sentença, a jornalista afirmou à Fórum: "é um alento que a justiça tenha sido reafirmada. O texto do relator, que embasou o voto dos desembargadores, é uma importante peça na defesa da liberdade de expressão e do exercício do jornalismo”.

Perguntada sobre o fato de talvez ter sido a única jornalista, senão a única pessoa, a quem Bolsonaro tenha pedido desculpas durante o mandato, Bianca alertou: “não é sobre pedir desculpas, nem sobre um episódio específico, muito menos sobre mim. Um presidente da República não pode violar nossos direitos! Nunca!”

Ela lembra que “pedir desculpas não desfez o estrago nem significou uma mudança de postura. Pelo contrário, Bolsonaro e quem está perto dele segue atacando a imprensa e violando direitos de toda a população”, concluiu.

Sobre isso, a advogada de Bolsonaro afirmou em recurso que o fato de ele ter se retratado publicamente excluiria a necessidade de indenização por danos morais e que o "lapso" poderia ter ocorrido com qualquer pessoa em transmissões ao vivo. Alegou ainda que a demanda teria viés ideológico.

O bem mais valioso

O recurso, no entanto, não foi aceito pelos desembargadores. Eles afirmam no acórdão que o réu (Bolsonaro) “fez a acusação descrita na petição inicial, relacionando a autora a determinada fake news, sem que ela tivesse qualquer relação com a notícia, mediante comunicação ao vivo do réu, dirigida à rede de seus seguidores, o que reverberou na sociedade toda, em razão do cargo por ele ocupado, mesmo assim caberia ao nobre sentenciante verificar a efetiva ocorrência do dano a ser indenizado, em vez presumir também a ocorrência do dano”.

"Dizer em rede nacional que determinada jornalista divulga fake news é tirar dela o bem mais valioso ao exercício de sua profissão: a credibilidade. Sendo o autor da ofensa o Presidente da República, mandatário do Estado, o impacto moral é inegável e dispensa prova, máxime tratando-se de inverdade lançada em desfavor de profissional que goza de boa reputação, com larga trajetória no mundo acadêmico, em que atua como professora, além de manter vínculos com algumas das principais empresas de comunicação. Dizer que se trata de ato corriqueiro da vida ofender a honra alheia - de quem objetiva se aproximar do povo mediante programas transmitidos ao vivo pelo YouTube apenas reforça o desprezo à honra alheia e viola um dos fundamentos da República presidida pelo réu, exatamente a dignidade da pessoa humana, como anunciado logo no artigo 1º, da Constituição da República", escreveu o relator.

Os desembargadores consideraram que o pedido de desculpas foi insuficiente e não tem aptidão para afastar sua responsabilidade pelo dano. Para eles, afastar a indenização por dano moral não é cabível, já que bastaria a quem ofende esperar uma demanda judicial do ofendido para, então, pedir desculpas.

Eles também afirmaram que não é corriqueiro ofender a honra alheia e que a transmissão ao vivo apenas "reforça o desprezo à honra alheia e viola um dos fundamentos da República presidida pelo réu, exatamente a dignidade da pessoa humana".

"É sabido e ressabido que, assim como a flecha lançada pelo arqueiro, a palavra emitida pelo orador não tem volta: se bem direcionada, atinge diretamente o alvo. E uma vez causado o dano, não há caminho de volta", afirmaram no acórdão.

A notícia que Bolsonaro atribuiu à Bianca havia sido publicada por outra pessoa.

Leia a íntegra do acórdão abaixo: