Luiz Roberto Alves: A criança nos disparos de Bolsonaro - mentira absoluta para testar quem de fato ama as crianças

Os brasileiros e brasileiras têm nesta semana a chance de fazer outra escolha, aquela proposta por Hannah Arendt, ou seja, decidir pelo amor às crianças reais, que têm o direito de aprender, conhecer, manifestar suas curiosidades, serem educadas e então fazerem suas escolhas com autonomia e firmeza

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[caption id="attachment_142797" align="alignnone" width="699"] Foto: Reprodução/YouTube[/caption] Por Luiz Roberto Alves* Milhões de conterrâneos, que amam e respeitam filhos, netos, sobrinhos, irmãos, amigos e amigos dos amigos, têm ainda uma semana para pensar e refletir. Para ver que na criança chamada de “inocente” pelos disparos de mensagens compradas pelos ricos apoiadores do capitão Bolsonaro está o exemplo acabado do mal que nos cabe negar e vencer. Essa imagem inventada da infância não existe. Não existe na história, não existe nas emoções, nem na psicologia, na antropologia, nas relações sociais. Enfim, na vida, especialmente na sociedade democrática. Quem existe é a criança real, que não pode sobreviver sem a vida social, sem os outros e as outras que a ajudam a se constituir como sujeito e pessoa. A escritora Hannah Arendt (1) levanta o problema central de quem educa crianças, seja a família, seja a escola ou a comunidade. Primeiramente, ela afirma que educação é o ponto em que decidimos se amamos o mundo a fim de salvá-lo pela formação das novas gerações. Em seguida, pergunta se amamos nossas crianças o bastante para não abandoná-las aos seus próprios recursos. Termina por dizer que não podemos arrancar das mãos delas o direito de empreenderem coisas novas e imprevistas, pois cabe a elas renovar o mundo. A criança “inocente” de Bolsonaro é uma imagem brutal, pois pode conviver com palavras de baixo calão que o capitão usa todo o tempo; deve presenciar violências e lavar as mãos diante delas, como ele faz; presenciar maus-tratos e ficar insensível a eles, como ele fica; acompanhar mentiras compradas para enganar suas famílias, como ele faz, e nada dizer. No entanto, ela terá de ser “inocente” diante da educação do ser humano, que inclui conhecimento, afeto, cidadania, orientação sexual e moral, encontros com gerações iguais e diferentes. É isso que se denomina educação integral. Para que alcancemos a qualidade máxima dessa educação integral, professores serão melhor formados e valorizados, investimentos serão crescentes, bem distribuídos e avaliados, escolas e famílias serão organizadas pela consciência de todas as necessidades de aprendizado e de desenvolvimento afetivo segundo cada novo passo do crescimento infantil. Sem inocência mentirosa, mas com a garantia de todos os direitos. E tudo isso já foi muito estudado. Falta aplicar melhor no Brasil, que assinou tratados internacionais para essa melhor educação e possui documentos e experiências para novos avanços. Por isso, a criança “inocente” de Bolsonaro é uma imagem deturpada, comprada a peso de ouro das pessoas menos inocentes deste mundo, ou seja, os fazedores de campanha de Donald Trump, que se transferiram para o Brasil para inventar mentiras e repeti-las até parecerem verdades. Nesta semana, este é o problema mais desafiador dos nossos conterrâneos, escolhidos pela compra de milhões de dados no WhatsApp, no Facebook e outras plataformas. Os fazedores de campanha política tentam cumprir aquele dito: se ficar o bicho come, se correr o bicho pega, pois ao lado da criança “inocente” surgem outros disparos inventados que não têm nada a ver com o candidato Bolsonaro: “Deus acima de tudo”, “a verdade vos libertará” etc. No lugar de Deus entenda-se dinheiro e poder; no lugar da verdade coloque-se invenção mentirosa repetitiva. E por que teremos de aguentar isso por longos quatro anos ou mais?? Não somente nós, que não votamos Bolsonaro, mas todos os brasileiros e brasileiras, pois a deturpação de agora vai se projetar na deturpação de todos os atos de governo, como nos mostra a moral das estórias orientais que contamos às novas gerações. Aceitar deturpação significa deturpar-se. Os brasileiros e brasileiras têm nesta semana a chance de fazer outra escolha, aquela proposta por Hannah Arendt, ou seja, decidir pelo amor às crianças reais, que têm o direito de aprender, conhecer, manifestar suas curiosidades, serem educadas e então fazerem suas escolhas com autonomia e firmeza. Assim, vão se tornar verdadeiras empreendedoras dos projetos novos e dos projetos ainda imprevistos, pois cabe a elas a tarefa de renovar o mundo de todos nós. Que assim seja. (1) “Entre o passado e o futuro”, página 247 *Luiz Roberto Alves é educador público, professor-pesquisador, membro do Conselho Nacional de Educação entre 2012 e 2016 e presidente da Câmara de Educação Básica do CNE entre 2014 e 2016