"Mensalinho" no Ministério da Saúde, se confirmado, configura lavagem de dinheiro, diz instituto

O novo foco da CPI é a denúncia de que Ricardo Barros implantou um esquema que renderia R$ 296 mil mensais, oriundos de propina, a ele e outros nomes do governo; entenda

Jair Bolsonaro e o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros, que comandaria esquema de corrupção no Ministério da Saúde (Foto: Alan Santos/PR)
Escrito en POLÍTICA el

O vice-presidente da CPI do Genocídio, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), anunciou nesta segunda-feira (19) que o novo foco de investigação da comissão será a denúncia, feita por uma ex-servidora, de que há no Ministério da Saúde um esquema que renderia pagamentos irregulares mensais de até R$ 296 mil a políticos e nomes ligados ao governo Bolsonaro.

Segundo o Instituto de Prevenção e Combate à Lavagem de Dinheiro e ao Financiamento ao Terrorismo (IPLD), se a denúncia for confirmada, o esquema de pagamentos irregulares no Ministério pode configurar o crime de lavagem de dinheiro.

De acordo com o relato da ex-servidora, o esquema de corrupção foi implantado pelo atual líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), em 2018, quando foi ministro da Saúde do governo Michel Temer (MDB), e estaria rendendo pagamentos ilegais até hoje.

As suspeitas dão conta de que o "mensalinho" teve início quando Barros extinguiu a Central Nacional de Armazenamento e Distribuição de Imunobiológicos (Cenadi), empresa estatal responsável pela distribuição de vacinas. No lugar da Cenadi, Barros assinou um contrato por 5 anos por um valor total de R$ 592.733.096,15 com a empresa VTC Operadora Logística Ltda, conhecida como VTCLog.

Na negociata feira pelo atual líder do governo, a VTCLog se comprometeria a desviar 10% do valor para pagamento da propina. Esse valor renderia, mensalmente, R$ 990 mil aos envolvidos, sendo 10% (R$ 99 mil) para o ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde, Roberto Dias, e o restante dividido entre Barros e os outros dois envolvidos, que não tiveram os nomes divulgados.

Lavagem de dinheiro

O Instituto de Prevenção e Combate à Lavagem de Dinheiro e ao Financiamento ao Terrorismo (IPLD) considera que, se confirmadas as denúncias, o esquema de corrupção no Ministério da Saúde poderia configurar crime de lavagem de dinheiro.

A avaliação consta em uma nota técnica do instituto enviada à Fórum. Segundo o IPLD, configuram lavagem de dinheiro "casos em que pessoas utilizam de empresas existentes ou mesmo abrem empresas de fachada para que essas celebrassem contratos com o órgão público, por exemplo, de modo a se valerem dos valores envolvidos nas transações sem a contraprestação dos serviços para realizarem a ocultação do dinheiro".

"O crime ficaria assim configurado quando, por exemplo, agentes públicos se favorecessem do dinheiro advindo de negócios espúrios envolvendo empresas (de fachada ou não) utilizadas para celebrar contratos com algum órgão público", explica o instituto.

No caso do "mensalinho" no Ministério da Saúde, os agentes públicos, no caso Ricardo Barros, Roberto Dias e os outros envolvidos, estariam utilizando o contrato com a VTCLog para ganhar dinheiro oriundo de serviços não prestados pela empresa.

"Se, no caso concreto, isso for confirmado pela investigação, provavelmente estaria configurada a lavagem de dinheiro proveniente de corrupção, com as manobras de ocultação ou dissimulação da natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade dos recursos provenientes das atividades delituosas", atesta o IPLD.

Confira, abaixo, a íntegra da nota técnica

Configura prática clássica de lavagem de dinheiro, conforme definição prevista na legislação brasileira: casos em que pessoas utilizando de empresas existentes ou mesmo abrem empresas de fachada para que essas celebrassem contratos com o órgão público, por exemplo, de modo a se valerem dos valores envolvidos nas transações sem a contraprestação dos serviços para realizarem a ocultação do dinheiro.

O crime ficaria assim configurado quando, por exemplo, agentes públicos se favorecessem do dinheiro advindo de negócios espúrios envolvendo empresas (de fachada ou não) utilizadas para celebrar contratos com algum órgão público. Isso é um modus operandi muito comum para lavagem de dinheiro: empresas celebrando convênios, acordos, contratos com entes públicos, sendo que essas empresas superfaturam produtos e não entregam os serviços a serem prestados no âmbito do contrato. Ou seja, não cumprem o que está no contrato exatamente porque ali supostamente estaria montada uma estrutura não só de corrupção, mas também para lavar o dinheiro proveniente dos negócios que de alguma forma não eram realizados.

Se, no caso concreto, isso for confirmado pela investigação, provavelmente estaria configurada a lavagem de dinheiro proveniente de corrupção, com as manobras de ocultação ou dissimulação da natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade dos recursos provenientes das atividades delituosas.