Como dialogar com um evangélico? (Parte 02) – Antes de começar…

Leia na coluna do pastor Zé Barbosa Jr: É preciso saber que não há uma fé cristã unívoca. E isso serve para os dois lados, tanto para o fundamentalista que pensa só haver o pensamento dele quanto para “a esquerda” que “mete o pau nos evangélicos”

Bolsonaro em culto com a bancada evangélica na Câmara (Michel Jesus/ Câmara dos Deputados)
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Como disse no último texto, não é uma tarefa fácil e nem tenho A resposta para esta pergunta, mas por caminhar nesse meio por mais de 30 anos, conhecendo bem as linhas de argumentação e, principalmente, de como funciona toda essa rede complexa de discurso + vivência + expectativas + fundamentalismo é que tento, a partir de agora, traçar possíveis caminhos, possibilidades, ainda que poucas, de se conversar com alguém que, em nome de uma fé cristã, defende o “indefensável”, pelo menos no nosso ponto de vista.

E é por aqui que começo. Reparou que escrevi sobre “uma fé cristã”? Então… em primeiro lugar é preciso saber que não há uma fé cristã unívoca. E isso serve para os dois lados, tanto para o fundamentalista que pensa só haver o pensamento dele quanto para “a esquerda” que “mete o pau nos evangélicos” como se fossem uma massa homogênea e ainda desconsideram haver , entre evangélicos (e olha que nem falei de católicos e espíritas que compõem a “bancada cristã”), variações históricas e uma diversidade quase comparável à própria esquerda brasileira.

Só no Brasil, por exemplo, podemos dividir (e isso a grosso modo) os “evangélicos” em, pelo menos, 5 grupos distintos: protestantismo de migração, protestantismo de missão, pentecostais, pentecostais de segunda onda e neopentecostais. O primeiro grupo é o que menos atua politicamente no Brasil. Os outros quatro estão a passos largos de conseguirem o seu projeto de poder de conquista da nação.

Por exemplo, fala-se muito dos neopentecostais quando se referem ao governo Bolsonaro, mas ele está muito mais apoiado estruturalmente por grupos como os presbiterianos (que hoje ocupam os Ministérios da Educação e da Justiça), batistas (de olho nas futuras nomeações do STF) e dos grandes centros de poder pentecostais, nominalmente representados por Malafaia, Feliciano e Damares Alves, esta última também Ministra.

Entender que essa estrutura é múltipla, diversa e, às vezes antagônica é fundamental para avançarmos. Sim! A luta pelo poder também ocorre internamente, mas eles sabem se unir quando o inimigo é “o mesmo”, e talvez isso deveria servir de lição para a esquerda e movimentos sócio-políticos de oposição.

É aqui que entra a nossa luta, em todos esses grupos, historicamente, há os “dissidentes”, aqueles que não concordam com esse projeto de poder político, que entendem a fé como algo simples e à serviço da nação e não para ser servida por ela, que encaram o Cristo como revolucionário e subversivo, um defensor das minorias, dos excluídos e dos oprimidos, que sonham com um tempo de justiça e equidade. E isso tudo a partir da “mesma fé”. E, acreditem, somos muitos e uma parcela enorme (diria que uns 30 a 40%) ainda está “perdida” nessa disputa de narrativa. Por isso não desistimos e não podemos desistir.

Bom… isso é só o começo… no próximo texto tentaremos entender como funciona a mente de um “evangélico comum” (desses ainda não cooptados por esse projeto de poder, mas tendentes a ele) e como esse projeto foi construído nos últimos quarenta anos…

Temos muito chão pela frente…

*Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Fórum

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