Da porta de fábrica ao podcast; Lula fala para a nova classe trabalhadora – Por Dennis de Oliveira

Lula acertou em cheio ao ir a estes programas e fazer o papo reto com a juventude trabalhadora. E isto pode ser um diferencial nesta nova campanha, resta saber se o conjunto do campo progressista entendeu este fenômeno

Lula em entrevista ao Podpah Podcast (Foto: Ricardo Stuckert)
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Neste período de pré-campanha eleitoral, dois fatos marcantes ocorreram com o ex-presidente Lula que lidera todas as pesquisas de intenção de voto para as eleições presidenciais de 2022: a sua ida a dois podcasts, o “Mano a Mano” apresentado pelo Mano Brown em setembro e o PodPah, apresentado por Mítico e Igor em 2 de dezembro. Em ambas participações, Lula bateu recorde de audiência. Foi a entrevista mais ouvida no Mano a Mano e no Podpah, bateu recorde de acessos simultâneos, com quase 300 mil pessoas assistindo. Até o momento, mais de 4 milhões acessaram o episódio do Podpah.

Além dos recordes de audiência, a participação de Lula no Podpah também foi um o assunto mais comentado no twitter.

Alguns fatos que demonstram o impacto destes episódios:

1 - Matéria no Portal 360 intitulada "Podcast Podpah bate recorde de acessos simultâneos em episódio com Lula", analisa que a audiência da entrevista se deve ao fato deste podcast ter um “grande número de assinantes” relativizando o sucesso da entrevista. A matéria não explica, entretanto, porque esta entrevista foi a que teve a maior audiência do podcast.

2 - O presidente Bolsonaro faz as suas tradicionais lives pelas redes sociais as quintas feiras a noite. Nesta última quinta feira foi batido de longe pela entrevista de Lula ao Podpah - em torno de 30 mil assistiram a live do presidente no youtube e Facebook (os governistas falam em 150 mil mas estão agregando a audiência da Jovem Pan que retransmitiu a live) bem distante dos mais de 300 mil que assistiram simultaneamente o podcast ou os quase 3 milhões que acessaram o link durante um período da transmissão. Trata-se de números importantes levando-se em conta que o presidente Bolsonaro tem uma clara estratégia de se comunicar pelas redes sociais.

3 - O deputado estadual de São Paulo, Artur do Val, conhecido como “Mamãe Falei” ficou incomodado com o sucesso de Lula neste podcast e postou um comentário no Twitter extremamente preconceituoso. Disse ele que “Ele [Lula] foi num podcast de funkeiro falar de futebol e como ele ama os pobres. A última vez que Lula foi entrevistado por jornalista de verdade soltou aquela gafe da ditador da Nicarágua”. Para Artur do Val, jornalista “de verdade” são só os da mídia hegemônica. Tomou uma invertida de Mítiko: “Funkeiro? Eu tô ligado que você queira ir hein? Sou do funk, do rap e do eu quiser ser, não vem menosprezar o funk não!”. Diante da repercussão negativa, o tal Mamãe Falei pediu desculpas e se autoconvidou para ir ao Podpah para “explicar" o seu ponto de vista.

A ida de Lula aos podcasts Mano a Mano e Podpah possibilitou o contato direto com uma nova classe trabalhadora, aquela que não se reúne mais nas portas de fábrica a espera do apito tocar, bater o ponto e iniciar o trabalho na linha de montagem. Uma classe trabalhadora precarizada, entre entregadores de aplicativos que dirigem bicicletas e motocicletas, vendedores ambulantes - inclusive em bailes funk, caixas de lojas, trabalhadores em manutenção de equipamentos, seguranças. O espaço de encontro desta classe trabalhadora é a quebrada na periferia onde sofrem toda a sorte de opressão das forças policiais, precarização de políticas públicas e outras violências. E as festas de funk e hip hop possibilitam lazer e formas de ganhar uma grana.

Podcasts como estes chegam a muitos destes participantes desta nova classe trabalhadora. Uma juventude que não está nas escolas de operários do Senai mas que encontra dificuldades de terminar o ensino básico tendo que se submeter a jornadas de mais de 12 horas de trabalho ao dia para por comida na mesa da sua família.

Lula acertou em cheio ao ir a estes programas e fazer o papo reto com a juventude trabalhadora. E isto pode ser um diferencial nesta nova campanha, resta saber se o conjunto do campo progressista entendeu este fenômeno e vai ajustar as suas estratégias para falar também para esta jovem classe trabalhadora.

**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.