Educação como prática de liberdade numa cidade mais livre, justa e igualitária – Por Monica Benicio

Acreditamos no papel fundamental da Educação na luta por uma sociedade igualitária. E que passa por uma escola que enfrente toda e qualquer forma de violência, preconceito e discriminação

Foto: Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro
Escrito en OPINIÃO el

Educação para transformar vidas. Pública e de qualidade. Para pensar e construir solidariedade e justiça social. Tomamos as palavras de Bell Hooks para construir juntes a ideia de Educação em seu necessário caráter antirracista e feminista, pra criar os pilares de uma sociedade mais justa, de saberes horizontalizados, valorização dos professores e demais profissionais de Educação. Mas e quando a escola, o espaço institucional da Educação, se torna o lugar da prática da violência e da segregação? Como podemos enfrentar esse problema e garantir o direito de crianças e adolescentes à Educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à liberdade e à segurança?

Nesse sentido, protocolei – em parceria com os vereadores Tarcísio Motta e Chico Alencar, ambos professores e defensores incansáveis da Educação Pública – o PL 133/2021, que institui o Dia Municipal de Luta contra a Violência nas Escolas no calendário oficial da cidade. O objetivo é demarcar uma mensagem de esperança e luta, por uma escola que combata qualquer tipo de violência, como bullying, racismo, lgbtfobia e intolerância religiosa e que dê às crianças o direito de sonharem e realizarem seus sonhos, fortalecendo uma coletividade mais solidária para todes nós! O projeto tem como motivador o marco de 10 anos do Massacre de Realengo, episódio impossível de esquecer, memória dolorosa de todos nós que vivemos na cidade do Rio de Janeiro. Em 2011, o ex-aluno da Escola Municipal Tasso da Silveira, que fica em Realengo, bairro da Zona Oeste, Wellington Menezes de Oliveira, entrou armado em sua antiga escola e atirou em alunos que ali estavam. Atingiu 23 adolescentes, matando 12, em sua maioria meninas. Na ocasião Wellington diria que teria sido vítima de bullying.

O episódio de Realengo mobilizou a todos nós e teve como resultado diversas ações, como a instauração do dia 7 de Abril como o Dia Nacional de Combate ao Bullying. Em 2015 foi publicada a Lei 13.185/15, criando o Programa de Combate à Intimidação Sistemática; em 2018, uma alteração na Lei de Diretrizes de Bases e Educação também consolidou medidas de conscientização e de prevenção a todos os tipos de violência nas escolas.

Os episódios de violência, infelizmente, não são poucos. Tampouco os casos de bullying – agressão verbal e intimidação em sua maioria – enfrentados por 81% dos estudantes de escolas brasileiras, segundo dados da Agência Brasil. A internet também permitiu o surgimento de casos de exposição envolvendo adolescentes, o chamado cyberbullying. E em um país em que a precarização da Educação Pública é um projeto, não é difícil conseguir atingir tristes números: segundo pesquisa realizada com diretores de escolas pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Brasil tem um índice elevado de casos de bullying nas escolas: cerca de 28% dos estudantes já foram vítimas de algum tipo de agressão.

E se temos escolas nas quais a violência atinge parcela representativa dos alunos mesmo em ambientes online, um olhar atento não demora a identificar quais são as maiores vítimas: meninas e mulheres de 14 a 35 anos de idade. Os dados são do Observatório Brasileiro de Violência On-line, da Universidade de Brasília, e consolidam a extensão da violência contra a mulher de modo sistemático e brutal, desde a infância até a idade adulta. Nós, mulheres, somos maioria na linha de frente dos trabalhadores da Educação Pública e também nos bancos escolares, mas este número não nos protege. Ao contrário. Atravessamos agressões e intimidações como professoras, alunas e demais profissionais de Educação. Somos intimidadas no exercício das nossas funções e na liberdade de nossos corpos. Agredidas pelo simples fato de sermos mulheres. Essa é uma realidade cotidiana da qual o Massacre de Realengo é um terrível marco. Além disso, essas formas de violência também são resultado da incapacidade do Estado de prevenir e proteger estudantes e profissionais, não somente de massacres, mas de agressões diárias em suas escolas. Entendemos que o combate à violência sistemática nas escolas e ao feminicídio, além do investimento em Educação Pública e de qualidade, são parte de nossas lutas  cotidianas por uma sociedade mais justa e solidária.

É nosso compromisso a reparação da violência ocorrida em ambiente escolar público. O que seriam das vítimas se não tivessem morrido? Que sonhos teriam? Qual seria seu papel na sociedade? Assim, protocolamos na Câmara de Vereadores do Rio, também em parceria com os vereadores Tarcísio Motta e Chico Alencar, um projeto para conceder pensão vitalícia às famílias das vítimas do Massacre de Realengo, que hoje completa 10 anos. O projeto foi pensado porque compreendemos a necessidade de auxiliar essas famílias cujas crianças, majoritariamente meninas, tiveram suas vidas interrompidas pela violência, esfacelando sonhos de quem tinha uma vida inteira pela frente. É comum entre as famílias problemas crônicos de saúde, decorrentes da violência que viveram. Dar condições para que possam se tratar é o mínimo que a Prefeitura, responsável pela escola, pode fazer.

Acreditamos também no papel fundamental da Educação na luta por uma sociedade igualitária. E que passa por uma escola que enfrente toda e qualquer forma de violência, preconceito e discriminação, que proteja os estudantes e profissionais. Uma escola onde o combate à violência contra a mulher seja matéria de debate de ciências humanas. Uma escola na qual meninos e meninas tenham direito de crescerem e tornarem seus sonhos realidade.

Caminhamos ao lado de todes que acreditam na Educação como prática revolucionária, de libertação e consciência, mecanismo de construção de ações transformadoras, que favorecem o diálogo entre os diferentes setores da sociedade, que seja construída de modo coletivo e inclusivo. Nas palavras de Paulo Freire, será somente através da aquisição de consciência crítica e de um processo educacional revolucionário realizado em comunhão que pode haver liberdade. Onde as salas de aula permitam um exercício diário do coletivo, de viver e sonhar outras realidades possíveis. Seguimos nessa luta, com propostas para uma educação que permita construirmos, nas escolas e nas ruas, uma cidade mais livre, justa e igualitária. Vamos juntes!

**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.

Fontes:

https://www.bbc.com/portuguese/brasil-56657419?at_custom2=twitter&at_medium=custom7&at_custom1=%5Bpost+type%5D&at_custom4=AA312F34-9728-11EB-BC7E-DE1D3A982C1E&at_campaign=64&at_custom3=BBC+Brasil

https://agenciabrasil.ebc.com.br/educacao/noticia/2019-12/violencia-contra-professores-e-alunos-cresce-na-rede-publica-paulista#:~:text=Em%202019%2C%2081%2520dos%20estudantes,verbal%2C%20agress%C3%A3o%20f%C3%ADsica%20e%20vandalismo.

https://odia.ig.com.br/belford-roxo/2021/03/6112963-projeto-de-lei-propoe-incluir-no-curriculo-escolar-formas-de-prevencao-a-violencia-contra-a-mulher.html

https://www.bbc.com/portuguese/brasil-56657419?at_custom2=twitter&at_medium=custom7&at_custom1=%5Bpost+type%5D&at_custom4=AA312F34-9728-11EB-BC7E-DE1D3A982C1E&at_campaign=64&at_custom3=BBC+Brasil

https://agenciabrasil.ebc.com.br/educacao/noticia/2019-

https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/riae/article/view/45738/32191