Federação partidária: o PT deve embarcar nessa onda? - Por Julian Rodrigues

"Esse debate precisa ser feito com calma, consultando a militância petista nos Estados e fazendo contas, fazendo projeções eleitorais também, por que não?"

Escrito en OPINIÃO el

“Faça como um velho marinheiro
Que durante o nevoeiro
Leva o barco devagar”

(Paulinho da Viola)

O modelo político brasileiro é muito ruim. Historicamente o PT e a esquerda defendemos uma reforma política abrangente. A introdução da figura das federações partidárias é um avanço globalmente positivo. Mecanismo que já existe em vários países e contribui para o fortalecimento das identidades programáticas e políticas dos partidos. Fortalece a nitidez ideológica e organiza melhor o sistema de alianças partidárias.

Aprovada no final de setembro, a Lei 14.208 traz grandes mudanças no sistema político-eleitoral brasileiro, introduzindo a possibilidade das federações partidárias, que terão a duração de quatro (longos) anos.

As legendas reunidas na federação funcionarão, na prática, como um só partido para fins das disputas eleitorais e atuação nos parlamentos. Alteração profunda na cultura política nacional.

As federações terão um órgão de direção, um estatuto e um programa comum a todos os partidos que vierem a integrá-la (que deverão se coligar verticalmente em todo o território brasileiro).

Conceitualmente é uma proposta progressiva, há modelos de frentes de esquerda muito bem sucedidos em vários países do mundo.

O calendário para debater e implementar as federações, contudo, é muito apertado. Os partidos devem definir suas opções antes das Convenções Partidárias de julho de 2022. O tema é novo, e o acúmulo de debates é insuficiente.

As implicações objetivas, reais, concretas são significativas para cada modelo adotado, para cada partido que optar ou não por se reunir em federação.

No caso do PT o debate que está pegando fogo é sobre uma possível federação com o PSB.

Em primeiro lugar, é preciso separar as alianças eleitorais de 2022 da construção da candidatura Lula e do debate das Federações. Não dá para precipitar definições ou deliberar em clima de pressão ou chantagem.

Um acordo entre PCdoB e PT seria um caminho natural, bom para ambas legendas - uma forma, inclusive, de garantir a sobrevivência desse partido irmão, histórico do povo brasileiro.

Cogitar uma federação que inclua PT, PCdoB e PSOL é um pouco mais complexo, enfrentaria maiores dificuldades e talvez não interesse à estratégia da maioria da direção do PSOL. Mas teria uma base político-programática.

E o PSB? O PT deve propor uma Federação com o Partido Socialista do Brasil?

A resposta é um rotundo “não”. Sem nenhuma sombra de dúvida. Por variados motivos, a começar pelas diferenças político-programático-ideológicas existentes entre PT e PSB.

O PSB é um partido de centro/centro-esquerda, muito heterogêneo. Em São Paulo abriga Márcio França, linha auxiliar do tucanato, por exemplo. No Rio Grande do Sul o PSB é dirigido por Beto Albuquerque, outro “tucano”, que nada tem de progressista.

Foram muito positivas as filiações de Freixo e Dino ao PSB, fortalecendo a ala esquerda do Partido.. Há muita gente progressista no PSB. Mas, de conjunto, é uma agremiação permeada por grandes contradições, um partido tipicamente convencional, que ocupa um espectro que vai do centro à centro-esquerda.

Não há nenhuma razão ideológica, política, programática, estratégica, tática ou ELEITORAL que justifique o PT compor uma Federação com o PSB, em 2022.

Esse debate precisa ser feito com calma, consultando a militância petista nos Estados e fazendo contas, fazendo projeções eleitorais também, por que não?

A heterogênea bancada do PSB na Câmara Federal que não conseguiu nem fechar questão contra a PEC do Bolsonaro (10 deputados votaram a favor), rapidamente se uniu em entusiasmado apoio à proposta de fazer Federação com o PT. Por que será?

Diante de uma proposta tão nova, tão pouco debatida e que amarra o PT ao PSB por 4 anos (durante todo o período de um futuro governo Lula!), o bom senso recomenda muita prudência. Muita escuta, muita cautela. Lembrando que uma coisa é aliança, outra coisa é Federação. Não vamos nos confundir.

Quem sabe daqui a algum tempo teremos mais convergências, reflexões acumuladas, experiências concretas que deem segurança ao PT para apostar em uma federação orgânica com o PSB? Entretanto, agora não é a hora - e não ajudaria nem ao partido nem à construção programática da campanha Lula.

*Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Fórum