"Gritos dos Excluídos" é um OVNI na guerra híbrida do sete de setembro – Por Wilson Ferreira

Por que um OVNI inconveniente? Por causa de sua pauta de reivindicações infraestrutural: renda, trabalho, saúde, comida, moradia, já!

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O governador de São Paulo, Doria Jr., tirou do icônico palco político-midiático da Avenida Paulista (SP) a tradicional manifestação (desde 1995) do “Grito dos Excluídos” e definiu que apenas bolsonaristas poderão se manifestar lá no dia sete. Para além da “ambiguidade” de Doria Jr. (faz oposição a Bolsonaro muito mais por uma razão conjuntural do que ideológica), há um aspecto simbólico mais profundo: dentro do atual roteiro da guerra híbrida e do domínio total de espectro, o “Grito dos Excluídos” é simplesmente um OVNI inconveniente que tem que ser escondido pela grande mídia. Porque vai além da pauta “superestrutural” (Fora Bolsonaro, guerra cultural, anti-negacionismo etc.) - o “Grito” exige renda, trabalho, moradia, saúde dentro da nova reconfiguração do capitalismo que cria “excluídos”. Questões infraestruturais que a guerra híbrida que ocultar para blindar a política neoliberal. Enquanto isso, a grande mídia brasileira se recompõe e descobre o novo tom propagandístico para o Afeganistão: “fuga” virou “resgate” e “colaboradores” viraram “refugiados” para ocultar o retorno do modo “false flag” do Estado Islâmico.

Nos anos 1990 esse humilde blogueiro foi assessor de imprensa da ONG chamada Indica (Instituto para o Desenvolvimento Integral da Criança e do Adolescente), criada pela Irmã Maria do Rosário Leite Cintra, uma das relatoras do Estatuto da Criança e do Adolescente durante a Assembleia Nacional Constituinte nos anos 1980.

A ONG prestava serviços à Pastoral do Menor da Igreja Católica, orientada pelas diretrizes gerais da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). 

Por conta da atividade de assessor responsável em cobrir e noticiar todos os eventos relacionados à ONG, esse editor do Cinegnose acompanhou o surgimento do “Grito dos Excluídos” na Semana Social Brasileira promovida pela CNBB, com a participação de movimentos sociais, organizações e entidades envolvidas com a justiça social.

O “Grito dos Excluídos” surgiu para servir no 7 de setembro como um contraponto ao grito da Independência – para os movimentos sociais, esse grito não se concretizou. 

Mas, principalmente, este blogueiro acompanhou a gestação do conceito de “exclusão”, um conceito profético para aquela época – um momento de neoliberalismo triunfante, com a integração das praças financeiras pela Globalização, enquanto o filósofo Francis Fukuyama decretava o fim da História com a vitória da cultura do consumo em escala mundial.

Distinguiam o “explorado” do “excluído” – o excluído seria um crescente número de pessoas afastadas da vida social pelas novas formas de produção do capitalismo nas quais surgiria um contingente da força de trabalho que nem mais para serem explorados serviriam. Conceito profético, porque agora, no século XXI, acompanhamos a tendência concreta no chamado Capitalismo de Plataforma ou Quarta Revolução Industrial. E as denúncias das práticas da necropolítica para simplesmente eliminar esse contingente de excluídos.

Há 12 anos, em São Paulo, o Gritos dos Excluídos é realizado na Avenida Paulista, palco icônico de manifestações políticas. Porém, agora o governador João Doria (PSDB) definiu que apenas bolsonaristas poderão se manifestar na Avenida Paulista, no próximo dia 7 de setembro, impedindo a realização do tradicional Grito dos Excluídos no local.

Doria apoiou-se numa decisão judicial de junho do ano passado, que proíbe ocupação da Avenida Paulista por lados políticos opostos no mesmo dia e estabelece a alternância do local. Por esse princípio de alternância, as manifestações anti-Bolsonaro só deverão ocorrer no local dia 12.

Com a decisão, o governador Doria Jr., supostamente na oposição ao Governo Federal (e dizendo-se arrependido pelo slogan “Bolsodoria” nas eleições), alinha-se com o jogo político de Bolsonaro fortalecer o ato de São Paulo depois de ter cancelado os desfiles militares em Brasília.

Porém, os representantes do “Grito dos Excluídos” e movimentos sindicais do “Fora Bolsonaro” decidiram manter a data, dessa vez no Vale do Anhangabaú, região central da cidade de São Paulo, contrariando o governador.

Um OVNI na guerra híbrida

Para além da “ambiguidade” de Doria Jr. (faz oposição a Bolsonaro muito mais por uma razão conjuntural do que ideológica – o extremismo de direita do governador é apenas envernizado pela expertise midiática como ex-apresentador de TV), há um aspecto simbólico mais profundo dentro da guerra semiótica criptografada de informações: dentro do atual roteiro da guerra híbrida e do domínio total de espectro, o Grito dos Excluídos é simplesmente um OVNI inconveniente, um objeto estranho e inconveniente que tem que ser escondido pela grande mídia.

Por que um OVNI inconveniente? Por causa de sua pauta de reivindicações infraestrutural: renda, trabalho, saúde, comida, moradia, já! Ou seja, tudo aquilo que a atual reconfiguração do capitalismo (o “grande reset global” ou “Quarta Revolução Industrial”, convenientemente acelerado pela pandemia Covid-19) não garantirá para um amplo contingente populacional pela exclusão estrutural.

Como este Cinegnose vem insistindo, a guerra criptografada de informações trata-se de um sequestro de pauta para arrastar todo o espectro político para temas superestruturais: guerras culturais, identitárias, frentes partidárias pelo impeachment e, a cereja do bolo, o fantasma anabolizado do golpe militar – como se ele já não tivesse ocorrido, de uma forma híbrida, bem longe dos clichês de um golpe de Estado old school.

Desfile de tanques de guerra em frente ao Palácio do Planalto, Bolsonaro querendo impeachment de Alexandre de Morais, o labirinto inextrincável de influências descoberto pela CPI da Covid, policiais militares ameaçando de sublevação, quatro anos depois o STF descobre que há milícias digitais e a PF abre investigações, um decadente cantor sertanejo exorta o povo invadir o Supremo para “quebrar tudo” e, numa épica resposta dos ministros ameaçados, o proíbe de se aproximar da Praça dos Três Poderes num raio de um quilômetro... 

Criado esse quadro caótico de informações, que ganha alarmes diários de “urgente” e “breaking news” da grande mídia, desvia a esquerda, oposição e a própria opinião pública das questões infraestruturais: como o rolo compressor da política neoliberal do, até aqui, blindado Paulo Guedes está precarizando o trabalho e os direitos trabalhistas, mantendo o “jogo” da disparada inflacionária e as políticas de privatizações que entregam para a população os primeiros resultados amargos - altas tarifas de energia e preços dos combustíveis... e amanhã, água, esgoto, correios. E, num jogo midiático de “terra arrasada”, Guedes grita que a única solução é a “autonomia do Banco Central”.

Infra e Superestrutura

Estamos tomando aqui os conceitos de infra e superestrutura no sentido dado pelo materialismo histórico de Marx e Engels: infraestrutura como o conjunto das relações de produção e as relações de classes estabelecidas numa sociedade; enquanto a superestrutura é a consciência social em geral, modos de pensar, visões de mundo e componentes ideológicos de classe ou do Estado: superestrutura legal, ou política.

Se Marx e Engels recorriam a metáfora do edifício para explicar a sociedade (a base desse edifício seria a infraestrutura sobre a qual é erguida a superestrutura ideológica), a guerra semiótica criptografada não apenas inverte este edifício, mas quer desviar da opinião pública a relevância das questões infraestruturais – e manter blindada a política econômica cujo escopo geopolítico e transformar o País numa “Banana Plantation” no cenário mundial.

Quer criar a ilusão de que o edifício flutua nas nuvens das guerras culturais e das manifestações da esquerda e oposições cujas pautas acompanham as bandeiras dos colunistas da grande mídia.>>>>>Continue lendo no Cinegnose>>>>>>>

**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.