O petê e o sinal de Jonas

No blog Fala Que Eu Discuto, de Lelê Teles: O vaginão choca a todos, enquanto abundam pelo mundo os falos naturalizados pela arte

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nu como vimos ao mundo e aglomerados em uma praia deserta, estávamos nós três, ascetas em isolamento social voluntário desde sempre: eu, o venerando mestre cafuna e o sapientíssimo cacique papaku, último espécime de sua etnia.

a lua já ia alta e uma deliciante e escamosa carapeba crepitava na fogueira de gravetos e gravanhas - este último vocábulo é um significante sem significado, criado por manoel de barros, cuja única utilidade é servir como material para poesia.

fumávamos, esses três reis magros, o cachimbo do velho cacique e jogávamos conversa fora, maieuticamente.

areia morna por baixo, céu estrelado por cima e a bruma leve levitando no meio.

falamos sobre deus e o diabo, sobre o cristo loiro de roliúde, o colorismo do movimento negro, o feminismo branco, o vitiligo de maicou djéquisson e sobre a grande buceta que se abriu como arte no solo pernambucano.

“brennand, lembrou mestre cafuna, erigiu diversos falos firmes por hellcife; no marco zero, ele colocou um pirocão de 32 metros de altura a causar calafrios nos transcendentes transeuntes que já não transam há algum tempo; mas a xoxota que brota na terra, aquela vulva seca que se liquefaz em chuvas hídricas, como a fenda funda e fértil de gaia, causou alvoroço no patriarcado e nas mães e futuras mães dos patriarcaloides” protestou o mestre, cafunescamente.

lembrei aos amigos que ao redor do mundo abundam fálicas esculturas e obeliscos, estátuas de homens com suas piroquinhas nuas estão por toda a europa; nos jardins, as senhorinhas deixam-se fotografar, sentadas ao chafariz, tendo ao fundo a escultura de um garotinho nu, a mijar em jato na fonte.

nos natais, todo presépio tem aquela presepada do menino-deus com a vareta de fora; o problema, segui meu raciocínio, é que a vulva de gaia estava fora de um contexto erótico ou pornográfico, e fora deste contexto, a buceta é uma boca silenciada; nela só se fala ao ginecologista.

a putificação das mulheres e a pornificação da vida, nessa armadilha que é o pornocapitalismo, faz com que as mulheres tenham duas bucetas: uma, que é estimulada a ser mostrada ao mundo, como mercadoria; e a outra, silente, que recebe o nome de vagina.

resulta, paradoxalmente, como excesso de exposição e ocultamento; francsico brennand disse certa vez que "a gente não sabe nada sobre o ciclo menstrual e das marés", acrescentando que a sociedade não apenas desconhece a sexualidade como a banaliza.

esse é o mal estar, essa é a infelicidade da caretice castrada pelas carolas e pelos canalhas.

papaku lembra que sua tribo era feliz porque não conhecia a palavra felicidade, e muito menos o seu antônimo; por isso, não viviam freudianamente em busca de uma e em fuga da outra.

os papaku também desconheciam a palavra natureza, essa que é feita de árvores, águas e animais; para os papaku, eles, as árvores e os animais não podiam existir de forma dissociada, "não pode existir a natureza e a gente, isso é bobagem", desconversava o grande cacique de bunda nua.

pergunto ao nobre cacique sem tribo, que estava vestido apenas com uma minúscula tanga de penachos, o que ele achava dessa aliança das esquerdas em apoio a baleia rossi.

papaku gosta de exemplos bíblicos. como aquele hurão, do voltaire, tentaram catequizá-lo, mas ele acabou por mostrar que são hipócritas as pessoas que usam um livro de lendas e fábulas para enganar o povo, prescrevendo-o como se da verdade falasse.

mas costuma dizer que gosta do livro e o lê sempre.

papaku se esquivou em falar das esquerdas, optou por lembrar apenas do partido dos trabalhadores sem trabalho.

segue o fio do nosso sábio de penachos:

“qual jonas, o petê lançou-se de cabeça no lamoso mar em tormenta, oferecendo-se em oferenda e deixando-se engolir, tragado como fumo, pelo cetáceo emedebista."

“passará três dias no ventre de baleia (rossi)."

“depois disso, será regurgitado em uma ilha ignota."

“terá o petê, como o jonas da fábula, aprendido a lição?"

“sairá o petê, uma vez ressurrecto, às ruas e vielas de nínive, a farejar o cheiro do povo e pregar a boa nova, como bem cobrou certa vez um certo mano brown?”

ninguém disse mais nada e mais nada lhe foi perguntado.

como a carapeba já estava no ponto, brindamos.

palavra da salvação.