O sonho de um talibã evangélico – Por pastor Zé Barbosa Jr

A busca evangélica pelo poder mostra sua cara, sem vergonha nenhuma de corromper a verdade das escrituras e, principalmente, afrontar o próprio Senhor Jesus com uma lei em “seu nome”

Foto: The Mail & Guardian (Reprodução)
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Já escrevi algumas vezes sobre a questão do Estado Laico. Este é um assunto que, volta e meia entra nas rodas de debates, tendo em vista a sede que a religião tem de alcançar o poder político e a sede que os políticos têm de fazer de Deus seu maior cabo eleitoral.

Lembro-me de um fato que há anos me chamou a atenção e foi publicado em alguns jornais de circulação nacional: o vereador petista (??!!) José Wildes submeteu ao plenário da Câmara Municipal de Porto Velho–RO um projeto de lei que instituiria Jesus Cristo como o único salvador daquela cidade.

A matéria foi aprovada em primeira votação, e GRAÇAS A DEUS, foi rejeitada em segunda votação. Esses eram os termos do projeto de lei:

“Art. 2º - Fica declarado, profeticamente, Jesus Cristo como único senhor e salvador da cidade de Porto Velho.

I – Consagra a cidade de Porto Velho a serviço de Deus, para a honra, glória e louvor no poder de Jesus Cristo;

II – A cidade de Porto Velho renuncia toda obra realizada no passado de prostituição, impureza, lascívia, ruínas, homicídios, roubos, corrupção, idolatria, feitiçaria, tráfico de drogas, prostituição infantil e toda maldição de primeira, segunda, terceira e quarta geração da cidade de Porto Velho;

(...)

IV – Declara que a cidade de Porto Velho terá uma geração santa e eleita pertencente ao senhor Jesus Cristo.”

Parece piada, mas não é! O caso é sério! Seriíssimo!

A busca evangélica pelo poder mostra sua cara, sem vergonha nenhuma de corromper a verdade das escrituras e, principalmente, afrontar o próprio Senhor Jesus com uma lei em “seu nome”.

Não!!! Querer forçar um povo a engolir goela abaixo o “senhorio” de Jesus é um absurdo, mas acreditem: é tudo o que boa parte da massa evangélica sonha para o Brasil.

Tenho dito (não só eu, mas outros escritores e pregadores) que o povo “evangélico” não vai sossegar enquanto não implantar um “Talibã cristão”, onde católicos, espíritas e, principalmente os pertencentes às religiões de matrizes africanas sofrerão na pele a dor de não pertencerem à “família de Deus”. Como cristão protestante, tenho vergonha disso! Meu sentimento ao ver o que alguns evangélicos, discípulos de Malafaia e Cia, sonham para o país, é de raiva e pena ver um povo tão medíocre e mesquinho na busca do poder.

O Estado laico não pode permitir tal atrocidade à liberdade religiosa de outros credos. Assim como não gostaria de ver a minha liberdade religiosa tolhida de alguma forma pelos poderes constituintes, jamais posso querer ver o quadro inverso, onde quem não pensa como eu deva forçosamente abraçar um credo que seu coração não professa.

Se queremos ver o Brasil “salvo”, comecemos por nós mesmos... a exercermos justiça com o pobre, a respeitar o próximo, a cumprir as leis federais, a denunciarmos a corrupção e não nos calarmos em troca de concessões de rádios e TVs, a mostrar que realmente temos a “mente de Cristo”, amando e respeitando cada um em sua individualidade.

Falta nos libertarmos dessa teologia esdrúxula do domínio, que nada têm a ver com o Espírito do Evangelho.

A fusão entre religião e Estado proporcionou algumas das maiores barbáries que este mundo já viu: As cruzadas e o massacre de crianças e dissidentes na “Noite de São Bartolomeu”... as inquisições, tanto católicas quanto protestantes... os terroristas do islã...

Que Deus nos livre de um povo que, em seu nome, faz exatamente aquilo que Ele jamais faria.

**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista da Fórum.