Sobre a canalhice: a Globo e a Lava Jato

Raphael Fagundes: “Através das fake news, que agora faz de tudo para combater, a mídia vem minando a democracia no país, o que contribuiu para forjar um grande monstro que está nos conduzindo para uma época sombria”

Foto: Reprodução
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A corporação da família Marinho pediu desculpas por ter apoiado a ditadura militar, regime que entregou o país às trevas, conteve reformas fundamentais que poderiam levar o Brasil a patamares elevados e ainda impediu o debate democrático sobre os rumos da nação. Hoje, ela compactuou com um golpe que está retrocedendo o país em vários quesitos, sociais, ambientais, humanos etc. Segundo Glenn Greenwald, a Globo estava trabalhando para a Lava Jato e não reportando as operações. O observador mais atento já desconfiava de tudo isso, assim como a intervenção americana em todo processo, mas nada é mais interessante que a prova. A Globo, por sua vez, decidiu ficar mais uma vez do lado dos vilões, defendendo que o relato das conversas entre Moro e Dallagnol é fruto de um ato criminoso e que, portanto, não tem legitimidade.

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No futuro, caso o plano macabro de desmonte do Estado brasileiro - com privatizações, perda de direitos trabalhistas, destruição do meio ambiente, aprofundamento das desigualdades sociais, liberação abusiva de agrotóxicos etc. -  obtenha êxito, como será o pedido de desculpas da família Marinho? Será que ela patrocinará filmes sobre as greves e passeatas que realizamos hoje? Ou acusará todos de radicalismo, petistas e bolsonaristas? Certamente, esconderá o modelo econômico que defende e sempre defendeu, modelo inclusive que atrofia o desenvolvimento do país. Em vez de reconhecer seu erro, a corporação insiste em afirmar que existe uma campanha aberta contra a Lava Jato. Chegou ao cúmulo de dizer que Greenwald não faz jornalismo e, sim, militância. Bem, isso a Globo precisa reclamar com Pulitzer. A Globo foi a corporação midiática que contribuiu na disseminação da maior fake news de todas: a de que o PT quebrou o Brasil. E os eleitores de Bolsonaro (alvos dessa lavagem cerebral) devem agradecer muito a ela, caso contrário, o seu mito jamais chegaria onde chegou. Essa fake News, misturada com o enfraquecimento das instituições promovido também pela mídia, pois destacava que tudo resumia-se à corrupção, acabou por criar o monstro da extrema direita. Quando as instituições estão nitidamente enfraquecidas, as pessoas se refugiam nos elementos religiosos, e os candidatos da extrema direita aproximaram-se, oportunamente, da religião que mais cresce no Brasil: o neopentecostalismo. Se olharmos os governos petistas, observaremos o crescimento da economia, a queda nas desigualdades sociais, o acesso maior às liberdades de expressão e religiosas, o controle da inflação, desemprego baixo etc. (1). A “quebra” se deu a partir da crise política que chegou ao cume em 2015. O PSDB, que não conseguiu convencer a população de seu projeto econômico, partiu para a política do “choque” para, assim, implantar (à força) um neoliberalismo radical. Os defensores desse projeto forçaram Dilma a ceder a partir daí. Em 2016, com a necessidade de desvincular o PT desse projeto nefasto desencadeou-se o golpe. Mas se deu um tiro no pé. O projeto econômico de Temer, o mesmo do PSDB e que o PT se negou a corroborar, aprofundou o país em uma crise ainda maior. A estratégia adotada, então, foi não prender Temer, mesmo sabendo de sua relação com Cunha. Mantendo o famigerado golpista no poder, criou-se uma vitrine ao redor dele para servir como mais um motivo para odiar o PT, já que quem votou na Dilma, também votou no Temer, como se diz. Um embuste, já que seria o candidato do PSL que daria continuidade ao modelo neoliberal de Temer, criticado abertamente por Haddad, candidato do PT. A Globo, que apoiou o golpe e a política econômica que este trouxe, criou um terreno perfeito para o crescimento da extrema direita, já que não deu espaço para não odiar, pelo contrário, transformou o ódio em moda, acusando os políticos corruptos de serem a única causa da crise, livrando as grandes corporações de todo o esquema. (A crise não foi gerada pela corrupção. Esse argumento é um engodo. A corrupção é evidenciada em tempos de crise para nos desviar da ideia de que o capitalismo, como explicam Marx e Engels, assemelha-se ao feiticeiro “que já não pode controlar as potências infernais por ele postas em movimento [...] basta mencionar as crises que, com seu periódico retorno, põem em questão e ameaçam cada vez mais a existência de toda a sociedade burguesa”) (2). Dessa forma, o político que teve disposição para dizer, sem ressalvas e escrúpulos, que também odeia tudo, ganhou espaço. A extrema direita apenas brotou do terreno fértil adubado pela mídia. O ódio à corrupção, criado pela imprensa, para fazer com que o povo não aprofunde o seu conhecimento sobre política, contribui - talvez até sem querer - para minimizar os outros tipos de ódio. Ele ocupa todo o espaço. O ódio ao negro, à mulher, ao homossexual tornou-se insignificante em relação ao ódio que se tem à corrupção. Por isso, quando criticam Bolsonaro por disseminar o ódio, ecoa apenas uma frase: “eu não sou corrupto”. A partir daí tudo é permitido. Por isso, seria importante e honesto a mídia assumir a sua parcela de culpa. Foi a mídia que criou esse abismo que agora o povo brasileiro está prestes a se lançar. Até porque “o autoritarismo não surge do nada. Os demagogos não podem florescer no meio de instituições funcionais, justas e imparciais”, já destacavam o próprio Glenn Greenwald e Victor Pougy (3). E a nossa mídia, aliada a um Judiciário que não pune certos políticos por racismo, por excitar o ódio ou por induzir os eleitores a cometer crimes eleitorais, revela sua parcialidade forjando, na cara dura, tiranos. Através das fake news, que agora faz de tudo para combater, a mídia vem minando a democracia no país, o que contribuiu para forjar um grande monstro que está nos conduzindo para uma época sombria, que se alimenta do que há de pior nas pessoas. Como esquerda, não podemos acreditar no discurso dessa mídia que compactua com o imperialismo. É necessário reorganizar as forças dos movimentos sociais em termos classistas para, assim, promover uma corrente realmente revolucionária, ou, pelo menos, restabelecer a confiança na democracia. O PT estava guiando o Brasil em um rumo não muito agradável em termos trabalhistas, mas ainda assim esboçava certo crescimento econômico e uma diminuição tímida da desigualdade social. Precisamos defender esse Brasil, para em seguida exigirmos mais democracia e a socialização da riqueza produzida. (1)https://www.brasildefato.com.br/2018/10/13/o-pt-nao-quebrou-o-pais-entenda-porque/ (2)MARX, K. e ENGELS, F. O Manifesto do partido comunista. São Paulo: Martin Claret, 2006. p. 51. (3)GREENWALD, G. e POUGY, V. “Mídia, Justiça e empresários do Brasil, uma fábrica de demagogos”. Le monde diplomatique, ano 12, n. 135, out, 2018, p. 19.
*Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.