Ocupações escolares... e 69!

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Vi num jornal uma foto do cantor Chico César se apresentando dentro de uma escola estadual de São Paulo, ocupada pelos estudantes que protestam contra as mudanças que a Secretaria da Educação anunciou, e me lembrei de 1968, quando morava no Crusp (Conjunto Residencial da USP) e alguns artistas se apresentavam de graça para nós. Era uma forma de solidariedade, como é a de Chico César hoje Por Mouzar Benedito Vi num jornal uma foto do cantor Chico César se apresentando dentro de uma escola estadual de São Paulo, ocupada pelos estudantes que protestam contra as mudanças que a Secretaria da Educação anunciou, e me lembrei de 1968, quando morava no Crusp (Conjunto Residencial da USP) e alguns artistas se apresentavam de graça para nós. Era uma forma de solidariedade, como é a de Chico César hoje. Uma coisa que me chamou a atenção no movimento desses estudantes de primeiro e segundo graus é que a primeira escola a ser tomada pelos alunos foi a Fernão Dias, que até hoje os mais velhos chamam de Colégio Fernão Dias, seu antigo nome, anterior às denominações atuais de “Escola Estadual de Primeiro e Segundo Graus...”. Mas muitos o chamam apenas de Fernão. Moro na região de Pinheiros e conheço muita gente formada no Fernão em outros tempos. Em geral, gente muito bem formada. É comum ouvir pessoas falando com orgulho: “Estudei no Fernão”. Era um dos melhores colégios de São Paulo. Quando cheguei aqui, para trabalhar e estudar, tendo que me manter à minha custa, com 16 anos de idade, o certo seria procurar uma escola pública, gratuita. Pensei logo no Fernão. Mas eu não tinha a perspectiva de fazer um curso universitário, então tinha que fazer um curso secundário que me desse uma profissão. E meu irmão mais velho, que morava na mesma pensão que eu, me desencorajou: “O Fernão Dias é muito puxado”, disse ele. “Trabalhando de segunda a sábado, você não vai ter condições de acompanhar o curso”. E se me lembro bem, não tinha curso noturno, único período em que eu poderia estudar. Enfim, por variados motivos, não tinha jeito de me matricular nele. Por falta de opção, fui fazer o curso técnico de contabilidade num colégio particular, muito menos rigoroso. Bom, e daí? O que eu quero dizer com isso? O Fernão Dias é um colégio simbólico. Era amado e respeitado pelos alunos, ex-alunos, professores e moradores da região. Quem queria fazer um curso de boa qualidade nem pensava em procurar colégio particular. A escola pública era muito melhor, e o Fernão Dias se destacava entre elas. Mas hoje ele é visto como uma escola comum. Parece que acompanhou a deterioração geral do ensino público não universitário. A piora geral dessas escolas teve início na ditadura e incluía (quer dizer, inclui) a precarização da profissão de professor. Paulo Maluf, governador na época, se destacou nisso. Parecia encarar a profissão de professor como um mero passatempo feminino. Num ano, com inflação alta, ele não corrigiu os salários dos professores, e disse cinicamente: “Não há professora mal paga, há professora mal casada”. Mas os governos que vieram depois dele não corrigiram seus erros, ao contrário, continuaram detonando o ensino público e a profissão de professor, que deixou de ter atrativos. Salário suficiente para viver, respeito por parte dos alunos, satisfação de ensinar, tudo foi e continua se perdendo progressivamente. Interessante é que todo candidato a qualquer cargo executivo apresenta como prioridades a educação e a saúde. Mas quando ganham a eleição e começam a governar, o velho discurso é esquecido. Alguns têm projetos para a área, sim, mas esses projetos não incluem coisas básicas, como, por exemplo, pagar decentemente os educadores. Ser professor do ensino básico e médio, hoje, exige curso universitário. Mas nas escolas públicas os salários são mixurucas, representam uma pequena porcentagem de outras profissões do mesmo nível. E é uma profissão que inclui até o risco de apanhar de alunos. Sendo assim, por que alguém vai dedicar anos de estudo para depois “abraçar” essa profissão? Não é à toa que faltam professores de certas matérias. Sobre as mudanças propostas pelo governo do Estado, não tenho condições de avaliar. Mas pergunto: elas incluem a valorização do professor, com reciclagens e melhor remuneração? Como há muito tempo não há motivo para otimismo em relação ao ensino público, muita gente, como eu, fica com o pé atrás, duvidando das boas intenções. E sonhando (utopia?) com a volta da qualidade tanto dessas escolas quanto da profissão de professor que trabalha nelas. Eba! Fiz 69 esta semana! E foi duas vezes! O que todo mundo sabe é que a única maneira de não ficar velho é morrer novo. Tive muitas oportunidades de bater com as dez, mas estou aqui. Aniversários acontecem apenas uma vez por ano, não é? Para muitos, sim. Para mim, não. Nasci em 22 de novembro (Dia da Música, para minha satisfação), mas fui registrado no dia 23. Então, faço um aniversário real num dia e outro formal no dia seguinte. No domingo, fiz 69 anos. Na segunda, fiz de novo. Foto: Brasil de Fato