Pesquisas revelam que novelas reduzem fertilidade e aumentam divórcios: controle de natalidade?

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Muito se tem falado que as telenovelas são “veículos de alienação” ou de criação do “consumismo”, principalmente as da TV Globo. Mas há algo ainda mais profundo: por décadas elas estariam moldando a percepção dos brasileiros em relação a filhos e casamento, resultando na expressiva queda da taxa de fertilidade e aumento no número de divórcios. Esse é o resultado de duas pesquisas do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) sobre o papel da televisão e das novelas no Brasil nas três últimas décadas. As pesquisas concluem que as telenovelas seriam um importante instrumento para “educar a população em questões sociais”. Será que por “questões sociais” o BID (entre outros bancos internacionais) entende como “controle de natalidade”?
As chamadas “soap operas” norte-americanas (ou “novelas” como as denominamos) já nasceram sob o signo da ação política. Quando surgiram no Brasil, as soap operas americanas já eram transmitidas de Miami para Cuba para consolidar o estilo de vida americano na ilha caribenha. Até estourar a revolução de Fidel Castro, derrubando o então ditador pró-EUA.
Por isso, é compreensível que a primeira novela brasileira tenha sido O Direito de Nascer, em 1964 na TV Tupi. Uma adaptação do folhetim radiofônico que inundara Cuba nos anos 1940. Naturalmente, uma novela voltada para aqueles no Brasil amedrontados pela revolução naquela ilha do Caribe.
Mas a novela não era ainda diária e não havia ainda transmissão em rede que fizesse todo o País parar ao mesmo tempo: a gravação era encaminhada por avião ou carro para outras localidades.
A novela Dancin’Days em 1978 da Rede Globo tornou-se a primeiro fenômeno nacional em telenovelas disseminando o modismo da discoteca fazendo o País inteiro ao mesmo tempo consumir ou desejar tudo que dizia respeito à novela: perfumes, roupas, cabelos, música etc. Mais do que isso, Dancin’Days foi a primeira novela marcada pela discussão de valores da classe média e das elites urbanas.

Mas as novelas não se limitaram a incentivar o consumismo. Nas décadas que se seguiram também ajudaram as mulheres, principalmente de baixa renda, a mudar a percepção sobre filhos e casamento.  

O papel crucial das novelas

Dois estudos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) encontraram em localidades alcançadas pelo sinal da TV Globo um sensível aumento da taxa de divórcios e queda na taxa de fertilidade. Desde a década de 1970 a fertilidade no País caiu mais de 60% enquanto os divórcios aumentaram mais de cinco vezes desde a década de 1980. Dentro desse período a presença de aparelhos de TV teve uma elevação de mais de dez vezes. Hoje a televisão está em mais de 80% das residências.
A conclusão da pesquisa sugere que as novelas brasileiras “desempenham um papel crucial na circulação de ideias” e que “podem ser uma ferramenta para transmitir mensagens sociais importantes que ajudem, por exemplo, a lutar contra a disseminação da AIDS ou proteção dos direitos de minorias”.
A conclusão é cheia de boas intenções. Mas estamos diante de duas pesquisas de ciências sociais aplicadas, financiadas por um banco internacional. Como falam os americanos, “não existe almoço grátis”. 
Colocado em perspectiva, a política socioeconômica dos bancos internacionais (BID, FMI, Banco Mundial etc.) é bem clara: a melhor forma de acabar com a pobreza e os problemas ambientais é erradicando populações sob diferentes instrumentos de controle populacional. E as pesquisas financiadas pelo BID parecem ter descoberto um instrumento ideal para países em desenvolvimento “com forte tradição oral”, como o Brasil.
Por trás de cada busca de conhecimento há um interesse. Esse poderia ser o interesse estratégico por trás do súbito interesse do BID por novelas brasileiras?

Efeitos sociais da expansão da Rede Globo

Os economistas Eliana La Ferrara, Alberto Chong e Suzanne Duyea publicaram em 2009 as pesquisas “Novela e Fertilidade: Evidências do Brasil” (clique aqui, em inglês) e “Televisão e Divórcio: Evidências de Novelas Brasileiras” (clique aqui, em inglês). 
Os dois estudos centram-se na expansão da Rede Globo: nas década de 1990 chegou a 98% dos municípios do país, atingindo 17,9 milhões de residências, em comparação com praticamente zero em meados da década de 1960.
O paralelo entre a rápida expansão da Globo nesse período e a mudança acentuada de alguns indicadores sociais brasileiros oferecem um campo fértil para pesquisas. Os estudos realizam série de testes econométricos com resultados estatísticos consistentes. Utilizaram dados demográficos amplos e informações detalhadas sobre a expansão da cobertura dos sinais de televisão e sobre o conteúdo das novelas no Brasil nas três últimas décadas.
O primeiro estudo encontrou que as taxas de fertilidade, ou o número de nascidos vivos por mulher em idade reprodutiva, foram significativamente mais baixas em áreas do Brasil alcançadas pelo sinal da rede Globo do que em áreas que não recebiam o sinal.

O impacto comportamental foi maior entre mulheres de famílias pobres e mulheres no meio ou no final de seus anos reprodutivos, sugerindo que a televisão influenciou a decisão de parar de ter filhos, e não de quando deveriam começar a ter filhos.
Em geral, a probabilidade de uma mulher ter um filho em áreas cobertas pelo sinal da Globo caiu 0,6 ponto percentual a mais do que em áreas sem cobertura. A magnitude do efeito é comparável à de um aumento de 2 anos no nível de escolaridade das mulheres. Não houve impacto nas taxas de fertilidade no ano anterior à entrada do sinal da Globo.
Também as pesquisas revelaram impacto relacionado sobre a taxa de divórcios. A porcentagem de mulheres separadas ou divorciadas também é maior em áreas que recebem o sinal da Globo, em particular em pequenas comunidades em que uma alta proporção da população tem acesso às transmissões da emissora. Essas áreas apresentaram um aumento de 0,1 a 0,2 ponto percentual na porcentagem de mulheres de 15 a 49 anos que são divorciadas ou separadas. O aumento pode parecer pequeno mais estatisticamente é significativo.