Alan Laudino: Os rolezinhos são reflexos de uma sociedade de consumo

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Sobre os rolezinhos e a falta de reflexão da sociedade

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23/01/2014

Charge de Carlos Latuff publicada originalmente no 247.
A questão dos "rolezinhos" nunca foi apenas "contra-a favor" do funk, e sim a situação de segregação racial e social que existe em nosso país (mesmo que alguns relinchem que isso não existe em nosso país. faz-me rir). Na sociedade de consumo, o espaço privado para consumo aparentemente torna-se público. Portanto, qualquer um que possa consumir, tem condições de frequentar. No caso, os shoppings.

Porém os shoppings se tornaram bolhas, no qual a classe média pode frequentar, sem encarar a realidade que existe do lado de fora de suas casas (e até pouco tempo, dos shoppings).

Se os adolescentes da periferia podem consumir (mesmo que pouco em relação à maioria que frequenta um shopping), pergunto: qual argumento sustenta que eles não podem frequentar um shopping?

Não existe espaço público suficiente para a população frequentar, espaço de lazer, esporte, nem bibliotecas suficientes para uma metrópole do tamanho de São Paulo. Não há educação de qualidade, nem teatros e cinemas a preços acessíveis (mesmo com as carteirinhas de estudante).

Então impedir os jovens da periferia de frequentar os shoppings está baseado em que afinal? Dizem que eles são arruaceiros. Oras, são adolescentes, jovens cheio de energia e controlados pela sociedade de consumo e ostentação, e sem perspectiva de "ócio criativo" que os proporcionaria crescimento pessoal, eles vão dar vazão a isso em algum momento.

Um jovem de classe média quando tem uma atitude típica adolescente não é arruaceiro, é apenas jovem? Porque essa distinção?

Apenas para deixar bem claro meu ponto de vista: não acho legal a questão dos rolezinhos, isso não agrega nada a esses jovens, nem a sociedade, mas é a válvula de escape que eles encontraram. Também não gosto de funk (já gostei, quando era um movimento que dava voz as questões sociais do morro). Mas quando toca funk na balada até a maior patricinha desce até o chão com suas roupas bregas. O ideal é lutar por políticas públicas que favoreçam inclusão social e que não valorizem o consumo como parâmetro de valor social. Assim nem os jovens da periferia vão achar que um rolezinho vai mudar a vida deles, e nem a classe média vai achar que ter um espaço-bolha de consumo vai torná-los mais dignos.

Culpabilizar apenas esses jovens, só aumenta a segregação e a pressão social, que uma hora explode. Não há quem aguente. Os rolezinhos são reflexos de uma sociedade de consumo, simples. Comprar uma roupa na Osklen não faz ninguém um ser humano melhor, seja da periferia ou de Pinheiros. Acha feio preto no shopping? Desculpe, vai ter que aguentar pois são a maior parte da população do país.

Se queremos mudança, que tal começarem a frequentar as tais bibliotecas que querem que eles frequentem? Parar de ser hipócritas condenando a criminalização das drogas que fortalece o tráfico e ir no morro no final de semana comprar o baseado e o pó para diversão nas áreas abastadas?

Que tal um pouco de auto-reflexão, tentar encontrar a raiz dos problemas ao invés de ficar só na analise fácil e superficial, que sempre culpa o outro pelo problema e exime o "cidadão de bem" de todos os problemas (como se apenas cumprir a jornada de trabalho fosse o suficiente para transformar a sociedade, doce ilusão, santa burrice).

E se babam tanto ovo para EUA e Europa, pesquisem um pouquinho e saibam que a situação social americana está um caos, e que os países europeus que tem uma sociedade mais justa e saudável, são justamente os que investem mais em políticas sociais progressistas e menos hipocrisia na política. Abram os olhos, antes de apontar o dedo para fora, olhem para o próprio espelho e depois disso, votem com consciência (e cobrem resultados também).

Revolta de sofá no facebook só mostra preguiça, nada mais.

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