PT perdeu votos na periferia de SP no primeiro turno, mas não foi o PSDB que levou

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Por Tiarajú D’Andrea, especial para o Escrevinhador

Após o anúncio dos resultados eleitorais do primeiro turno na cidade de São Paulo, nota-se um cenário ainda bastante indefinido nas zonas eleitorais localizadas nas periferias, que respondem por grandes porcentagens dos votos. Das urnas, dois dados chamam a atenção: o aumento de votos não válidos e a queda de votos no PT. Pode ser que um fenômeno tenha causado o outro, com a migração dos votos do PT para os não válidos. Ainda é cedo para afirmar. Também é bastante inconsistente a afirmação de que o PSDB cresceu substancialmente em votos na periferia. De fato cresceu, mas muito pouco. Para contextualizar, cabe lembrar que os bairros periféricos estão passando por algumas transformações nos últimos anos. Pode-se elencar o aumento dos investimentos em infraestrutura, ainda que aquém das necessidades, e a inserção no mercado de consumo de uma parcela dessa população, com aumento da renda e do poder de compra. Esse último fenômeno, incentivado pelo denominado fenômeno do "lulismo", pode ter resultado  um efeito paradoxal, ainda a ser melhor investigado: ao propalar que vastas parcelas dessa população havia deixado de ser pobre e se transformado em "Nova Classe Média", esse discurso fez com que muitos o incorporassem. Desse modo, ao se sentir “classe média” (efeito mais simbólico do que real), essa população estaria se distanciado do PT, partido com políticas notadamente voltadas para os mais pobres. Outra hipótese ainda a ser investigada, e também com efeito paradoxal, é aquela que se refere ao aumento no nível de escolaridade. Ao tornar-se mais escolarizada, essa população ficou mais crítica e ciente de seus direitos, exigindo mais do Estado e desconfiando mais dos políticos. Em paralelo, as denúncias de corrupção, cujo foco prioritário têm sido as gestões petistas (e nota-se aqui uma evidente escolha feita pela grande imprensa), impactaram nas adesões ao partido. Por fim, é importante considerar as chamadas Jornadas de Junho de 2013, que fez sobressair a bandeira do descrédito da política institucional, que certamente influenciou no alto número de votos nulos. De todo modo, o resultado eleitoral é uma radiografias momentânea de ideias e sentimentos de um segmente da população. Assim, mostra a ponta do iceberg. Mutações profundas ou hegemonias consolidadas são questões que só se verificam a longo prazo. [caption id="attachment_34374" align="alignleft" width="384"]Mapa das zonas eleitorais do munícipio de São Paulo Em azul, as zonas onde Aécio Neves obteve mais votos Em vermelho, as zonas onde Dilma Rousseff obteve mais votos Os pontos brancos marcam as zonas eleitorais situadas na "periferia de transição", onde houve pouca diferença de votos entre os candidatos. Mapa das zonas eleitorais do munícipio de São Paulo
Em azul, as zonas onde Aécio Neves obteve mais votos
Em vermelho, as zonas onde Dilma Rousseff obteve mais votos
Os pontos brancos marcam as zonas eleitorais situadas na "periferia de transição", onde houve pouca diferença de votos entre os candidatos.[/caption] Votos na “periferia de transição” O município de São Paulo possui 58 zonas eleitorais. Aqui se analisam 23 zonas eleitorais da periferia (ver tabelas abaixo). O critério utilizado para a escolha foi o de zonas eleitorais onde a diferença percentual de votos entre Dilma e Aécio ficou abaixo de 15,99%, levando em conta que este seja um índice passível de reversão no segundo turno. As zonas eleitorais onde algum desses candidatos teve uma diferença maior que 16% com relação ao outro não entram nesta análise. Cabe chamar a atenção para a proximidade geográfica dessas 23 zonas eleitorais, que são contíguas geograficamente, que denomino de “periferia de transição”, situada entre bairros de classe média baixa (com nítida vitória de Aécio) e bairros periféricos (com nítida vitória de Dilma). Em 13 dessas 23 zonas eleitorais, a diferença entre os dois candidatos não superou os 10% (ver tabelas). Pra botar mais lenha na fogueira nessa disputa, observa-se que em oito dessas zonas eleitorais os votos para Dilma Rousseff, Aécio Neves e Marina Silva estiveram distribuídos praticamente de maneira equânime, quase um empate técnico entre três candidatos. A partir da observação desses dados, cujas zonas abrigam um considerável contingente eleitoral, não se pode afirmar nem que a periferia “azulou” nem que a periferia segue sendo majoritariamente petista. Os votos de Marina Silva e os não válidos decidirão os ganhadores no segundo turno nessas zonas eleitorais. Um dado que chama a atenção é aquele que apresenta a perda de votos do PSDB em 12 dessas zonas eleitorais, em comparação com os resultados de primeiro turno das eleições presidenciais de 2010. Como o número de votos não válidos foi muito alto, assim como a queda dos votos no PT, relativamente o PSDB teve um acréscimo em 20 dessas zonas, ainda que em 17 delas não ultrapasse os 5% de acréscimo. É pouco. A perda de votos do PSDB ocorreu, sobretudo, em algumas zonas eleitorais da “periferia de transição“ localizadas na zona leste. Em zonas eleitorais da “periferia de transição” da zona sul, o PSDB obteve, geralmente, acréscimo de votos. A explicação para isso talvez esteja no fato de os territórios da zona sul serem mais heterogêneos, com bairros populares e bairros ricos muito próximos e na mesma zona eleitoral. No total de votos no município de São Paulo, o PSDB obteve um pequeno acréscimo, saltando de 40% (2010) para 43% (2014) no primeiro turno O crescimento desse índice se relaciona diretamente com o crescimento dos votos não válidos, que transforma um crescimento absoluto pequeno em crescimento relativo maior. Em suma, o PT perdeu muitos votos, mas o PSDB cresceu pouco. Marina Silva subiu de 20% para 23%, e Dilma Rousseff caiu de 41% para 26%. Houve 31% de votos não válidos, quando a média nacional foi de 26%. Em números absolutos, Dilma Rousseff perdeu 910 mil votos. Relativamente, esses votos foram distribuídos da seguinte maneira: a cada cem votos que Dilma perdeu, 46 foram para não válidos; 17 foram para Marina Silva; 14 para Luciana Genro; 9 foram para Eduardo Jorge e apenas 4 foram para Aécio Neves. Os dados revelam que se o PT perdeu votos, não foi para o PSDB que esses votos escorreram. O PSDB cresceu pouco em números absolutos e relativamente um pouco mais, beneficiado pelo alto número de votos não válidos. Abaixo, apresentamos duas tabelas. Na primeira delas, são analisadas as zonas eleitorais onde Aécio Neves venceu por pouca margem de votos. Em 12 zonas eleitorais, o candidato não obteve mais que 16% em relação a Dilma. Dessas, em oito zonas eleitorais não obteve mais que 7% de diferença. Em seis zonas eleitorais, ele obteve menos que 3% de diferença. Panorama acirrado ou não? Em cinco dessas 12 zonas eleitorais, os votos se distribuíram de maneira equânime entre os três principais candidatos do primeiro turno. São onze as zonas eleitorais nas quais Dilma venceu com menos de 15,99% em relação a Aécio. Dessas 11, em cinco obteve menos que 10% de diferença. Dessas mesmas 11, em três houve distribuição equânime dos votos entre os três principais candidatos. A seguir, vejam as duas tabelas: 12 zonas onde Aécio venceu por pouco na “periferia de transição”: Oito zonas eleitorais com menos de 10% de diferença. Em negrito, enfatiza-se as zonas eleitorais onde a porcentagem de votos totais dos três principais candidatos encontra-se numa faixa de 6%, denotando uma distribuição quase equânime desses votos. tabela1_tiaraju 11 zonas onde Dilma venceu por pouco na “periferia de transição”: Cinco zonas eleitorais com menos de 10% de diferença. Em negrito enfatiza-se as zonas eleitorais onde a porcentagem de votos totais dos três principais candidatos encontra-se numa faixa de 6%, denotando uma distribuição quase equânime desses votos.tabela2_tiaraju De fato, nas eleições para presidente os votos nulos fizeram a diferença. Ao PT, fica a lição de que, ao ter abandonado o trabalho de base, perdeu o contato com as periferias. O segundo turno está aí. Quem quiser levar a melhor na eleição para presidente deve dispuar cada voto nas regiões periféricas, sobretudo na “periferia de transição”, onde a disputa está mais acirrada.