Impunidade e alerta para novos desastres marcam três anos do crime de Brumadinho

"Em Minas Gerais, o crime compensa", diz deputada estadual Beatriz Cerqueira. Recentemente, um dique da Mina Pau Branco, da mineradora francesa Vallourec, transbordou e provocou deslizamentos que deixaram cinco mortos

(Twitter/Rogério Correia)
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Nesta terça-feira (25), completa três anos do rompimento da barragem do Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG), crime da Vale S.A. que até hoje segue sem punições. Mais de 940 mil pessoas foram atingidas, 272 morreram - 264 corpos foram resgatados e 6 permanecem desaparecidos - e a bacia do rio Paraopeba foi altamente contaminada.

Uma ação penal que apura a responsabilidade pelo caso ainda corre na Justiça brasileira. Dezesseis pessoas são acusadas pelo crime de homicídio, entre elas ex-diretores da Vale e executivos da empresa alemã Tüv Süd, responsável por atestar a segurança da barragem que se rompeu.

A deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT-MG), que integrou a Comissão Parlamentar de Inquérito para apurar o crime da Vale, afirma que os maiores avanços foram a organização popular das comunidades atingidas pelo crime, a realização das CPIs na Assembleia Legislativa e na Câmara Federal e a aprovação da legislação sobre segurança dos barragens, conhecida como Mar de Lama Nunca Mais.

"Em Minas Gerais, o crime compensa"

No entanto, a parlamentar é categórica ao afirmar que, em Minas Gerais, "o crime compensa". Segundo ela, até hoje as mineradoras não são tratadas com rigor e distanciamento por parte do poder público e o acordo de reparação da Vale, feito junto ao governo Romeu Zema (Novo), dá à empresa o controle da execução financeira da maior parte dos recursos.

"As violações de direito por parte das mineradoras contra a população são cotidianas. O próprio governo do Estado não zelou pelo cumprimento da legislação aprovada. Isso é um incentivo para as mineradoras, que não se preocupam com a vida nem com os territórios", diz Cerqueira à Revista Fórum.

Para a deputada, a responsabilização das companhias não foi suficiente, e a Vale deveria, inclusive, ter perdido o direito de lavra. "A Vale sabia dos riscos. Na visão dela, pagar pelas mortes era mais lucrativo. Isso ficou demonstrado nos trabalhos da CPI da Assembleia. Como explicar que os trabalhadores morreram enquanto almoçavam? Que a sirene não funcionou e foi engolida pela lama? Que quem seguiu os protocolos de evacuação ensinados pela Vale morreu?", questiona a parlamentar.

Em fevereiro de 2021, foi assinado um acordo de mais de R$ 37 bilhões com a Vale para reparar danos provocados pela ação criminosa. De acordo com o Executivo estadual, este é o maior acordo já realizado na história do Brasil. Mas, inicialmente, o governo havia pedido cerca de R$ 55 bilhões.

Além disso, uma das reclamações de representantes dos atingidos e de familiares das vítimas é que, desde o início, eles não foram ouvidos nem chamados para participar das negociações. 

Medo de novos desastres

Além de ter que lidar com a perda de familiares e amigos, o medo de um novo desastre paira entre os moradores de Brumadinho e outras cidades de Minas Gerais. Atualmente, o Brasil tem 65 barragens a montante, sendo 46 no Estado, segundo dados da Agência Nacional de Mineração (ANM).

Em decorrência das chuvas que caíram sobre Minas no início deste ano, um dique da Mina Pau Branco, em Nova Lima (MG), da mineradora francesa Vallourec, transbordou e provocou deslizamentos que deixaram cinco mortos em Brumadinho.

Junto do deputado federal Rogério Correia (PT), Beatriz Cerqueira protocolou ofícios à Agência Nacional de Mineração, ao governador Romeu Zema e à Secretaria Estadual de Meio Ambiente pedindo uma análise urgente da lama e da poeira formadas pelas enchentes.

Boa parte delas se concentram nos arredores dos rios Paraopeba e Doce, justamente aqueles que receberam resíduos de mineração após os rompimentos das barragens da Vale em Brumadinho e Mariana, respectivamente.

Nos documentos já enviados, eles lembram que o rio Paraopeba transbordou devido às fortes chuvas no fim do ano passado e no início de 2022, formando depósitos com grande quantidade de lama, sem que se saiba quanto dela contém sedimentos decorrentes do rompimento da barragem da Vale próxima a Brumadinho.

"O contato da população com a lama das inundações do Paraopeba será intenso, pois houve acúmulo no interior de residências, nos quintais, comércios e áreas públicas", diz um dos ofícios.

"O governador Romeu Zema, ao invés de atender a população mineira, tem os olhos voltados exclusivamente para as mineradoras", diz a deputada Beatriz Cerqueira. Ela lembra que a ampliação da pilha de resíduos na Mina Pau Branco ocorreu no ano passado com a concordância do governo Zema.