IGREJA OU PIRÂMIDE?

Pastores que usavam teoria conspiratória e prometiam rendimentos surreais em golpe financeiro são presos

Polícia Civil do DF diz que cerca de 50 mil pessoas, a maioria evangélicos, foram vítimas do milionário esquema de estelionato em quase todos os estados brasileiros

Polícia Civil do Distrito Federal.Créditos: Divulgação/PCDF
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A Polícia Civil do Distrito Federal deflagrou nesta quarta-feira (20) a Operação Falso Profeta, que cumpriu dois mandados de prisão preventiva e 16 de busca e apreensão contra um grupo de pastores acusados de usar teorias conspiratórias e promessas de rendimentos surreais para enganar e cometer um milionário crime de estelionato contra cerca de 50 mil pessoas espalhadas por todo o Brasil. De acordo com as investigações, há vítimas em quase todos os estados brasileiros.

A organização criminosa mirava alvos evangélicos dentro e fora do Brasil, que eram abordados nas redes sociais para que aderissem a um suposto fundo dos autores que devolveria rendimentos fora da realidade. Um simples depósito de R$ 25 poderia devolver ao “beneficiário” (vítima) um total de um octilhão de reais. Já o investimento de R$ 2 mil no golpe traria retornos financeiros na ordem de 350 bilhões de centilhões de euros. Os valores são completamente surreais e só podem ser explicados por meio de uma teoria da conspiração chamada ‘Nesara Gesara’, utilizada pelos criminosos.

“Nesara” é a sigla em inglês para National Economic Security and Recovering Act (Ato para Recuperação e Segurança da Economia Nacional). O termo foi usado em 1996 por Harvey Francis Barnard que, em seus estudos, propunha um pacote econômico para os EUA que abolisse impostos, perdoasse dívidas de consumidores e promovesse mudanças radicais no sistema monetário. Ele chegou a publicar um livro, mas não obteve sucesso em difundir a teoria.

Nos anos 2000, a teoria de Barnard tornou-se uma verdadeira teoria da conspiração nas mãos da blogueira Shaini Goodwin, que já havia se envolvido em golpes financeiros. Em suas redes sociais, ela pregava que o Nesara já tinha sido aprovado pelo ex-presidente Bill Clinton (1993-2001), o que não é verdade. Também dizia que os ataques de 11 de setembro, ao World Trade Center, teriam sido articulados pelo também ex-presidente George Bush, a fim de barrar a implementação do mesmo.

Quase 20 anos depois, em plena pandemia, a teoria ganhou uma nova versão, a Gesara: Global Economic Security and Recovering Act. Dessa vez, adaptada a um contexto global, a teoria conspiratória pregava que todas as moedas do mundo estariam condensadas em cotação única para a adoção do Gesara, o que iniciaria uma suposta “Nova Ordem Mundial” com uma radical redistribuição de renda.

No caso dos pastores golpistas, ao abordar as vítimas nas redes sociais, as convenciam acerca dessa suposta redistribuição de renda global (Gesara) e as faziam acreditar que os primeiros contemplados pela “Benção” seriam aqueles que contribuíssem com seus projetos. Os fiéis então passavam a dar dinheiro acreditando que investiam em ações humanitárias e que, por isso, teriam logo o enorme retorno financeiro.

A organização já teria movimentado, segundo a polícia, mais de R$ 156 milhões em cinco anos. Além de ter cerca de 200 membros, também dispunha de empresas de fachada e mais de 800 contas bancárias suspeitas. As empresas ‘fantasmas’ simulam instituições financeiras digitais por onde as vítimas receberiam o suposto dinheiro.

Os pastores presos por conta do esquema responderão por estelionato, associação criminosa, falsidade ideológica, lavagem de dinheiro e sonegação fiscal. A Polícia Civil não deu os nomes dos presos ou maiores detalhes sobre as investigações.