'Mano que Zuera' resgata o melhor de João Bosco. E da nossa música também

Bosco está em plena forma. Continua o mesmo animal orgânico, onde voz e violão fazem parte de um todo que mistura influências, harmonias, batidas, canções geniais, com suas letras e melodias únicas e indescritíveis e uma produção sonora impecável

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Bosco está em plena forma. Continua o mesmo animal orgânico, onde voz e violão fazem parte de um todo que mistura influências, harmonias, batidas, canções geniais, com suas letras e melodias únicas e indescritíveis e uma produção sonora impecável Por Julinho Bittencourt O recém lançado “Mano que Zuera”, primeiro disco de inéditas de João Bosco em oito anos, provoca uma irrefreável sensação de deja vu, uma profunda melancolia. Diante de tamanha beleza da obra, de tanta riqueza, ficamos nós, ouvintes incautos, nos perguntando onde foi que nos perdemos. O que ficou para trás em passado tão próximo, o que aconteceu para não permitir que a nossa música partisse daí para a frente? O que ocorreu exatamente que fez com que apenas um disco aqui, como este de João Bosco, e outro acolá, como “Caravanas”, de Chico Buarque, nos lembrem do quanto já foi um dia refinada e definitiva a nossa canção popular? Bosco está em plena forma. Continua o mesmo animal orgânico, onde voz e violão fazem parte de um todo que mistura influências, harmonias, batidas, canções geniais, com suas letras e melodias únicas e indescritíveis e uma produção sonora impecável. “Mano que Zoera” é daqueles discos pra se ouvir noite a dentro e guardar vida à fora. Um hinário refinado da vida brasileira, construído a partir de novas parcerias com o filho Francisco Bosco, outras tantas seminais como Aldir Blanc, que compareceu com a inédita “Duro na Queda” e com a releitura magnífica de “João do Pulo”, linda canção do disco “Cabeça de Nego”, de 86. “João do Pulo” aparece, em conexão inesperada com a emblemática “Clube da Esquina”, de Milton Nascimento, Lô e Márcio Borges, em passeios harmônicos que integram canções de universos distintos para o de João. O mesmo se dá na obra-prima “Sinha”, parceria já gravada por Chico Buarque no seu disco de 2012. Aqui a canção reaparece com a voz do autor da melodia. Bosco participou também, de maneira intensa, da gravação de Chico e aqui parece reconstruir mais uma vez a composição, com seus inúmeros recursos de músico e intérprete. Uma parceria inédita com Arnaldo Antunes rendeu o voo sobre o Rio de Janeiro “Ultra Leve”: “Botafogo onde o mar está mais para lá/Goa, a lagoa, o reflexo onde o sol voa”, cantado lindamente por João e a filha Julia Bosco. “Mano que Zuera”, foi concebido por João Bosco e seu filho Francisco e produzido pelos dois com João Mário Linhares e Marcelo Gonçalves. Conta com a participação de vários músicos notáveis, como Jacques Morelenbaum, Ricardo Silveira, Armando Marçal, Jurim Moreira entre vários outros, todos liderados pelo violão de João Bosco. É um disco imprescindível que duvida da idade de seu autor. João Bosco, com 71 anos, compõe, toca e canta feito o mesmo menino que virou do avesso a nossa música na década de 70. “Mano que Zuera” é um disco moderno, contemporâneo e aberto ao mundo novo. Um mundo que ele, sem sombra de dúvidas, é um de seus grandes inventores.