“O Mecanismo” é um lixo moral, intelectual e artístico

Fosse o Lula o imbecil desonesto que a série apresenta e os problemas da direita brasileira estariam resolvidos

Selton Mello em O Mecanismo. Foto: Divulgação
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“O Mecanismo” é um lixo. A série é tão ruim, mas tão ruim que das profundezas da sua ruindade, talvez até nos ajude ao invés de atrapalhar. As suas mentiras deslavadas não são o que há de pior na série. O pior mesmo é a série em si. Os seus personagens são uma sequência de caricaturas bisonhas, com frases, reações e atitudes rastaqueras inacreditáveis. Pessoas reduzidas a atitudes intempestivas e previsíveis, todas sob a ótica do maniqueísmo barato dos almanaques antigos. Pra dizer melhor e mais claramente, “O Mecanismo” lembra filmes “B” da guerra fria, onde os heróis americanos são prenhes de virtudes enquanto os soviéticos, alemães orientais e congêneres são estupidamente brutos, desinteligentes e capazes de toda e qualquer sordidez. Lembra um tanto também os filmes canhestros de faroeste, onde índios selvagens despudorados estupradores e cruéis são derrotados pelos velhos desbravadores do oeste, sob os aplausos da matinê. Não existe, em momento algum, a menor chance, o menor indício de que as coisas poderiam não ter sido tão estúpidas quanto se apresentam, ou seja, poderiam ter um outro lado. Duro crer que, mesmo o mais à direita de todas as criaturas, consiga engolir um Lula daqueles, ridiculamente caricaturado, imaturo, vacilando diante das opiniões assertivas e verticais de um marqueteiro. O Lula, esse mesmo que construiu um dos maiores partidos de massa do mundo das últimas décadas, venceu quatro eleições presidenciais seguidas e – até usando a lógica desonesta da série – teria montado o maior esquema de financiamento do mundo. Esse mesmo, quando aparece no filme, é um imbecil indeciso. Fosse o Lula o imbecil desonesto que a série apresenta e os problemas da direita brasileira estariam resolvidos. A despeito da construção dos personagens, os efeitos de iluminação e tempo desabam continuamente no lugar comum, onde os bandidos são mal iluminados e os momentos tristes se dão sob chuva torrencial e música pungente. Tudo na série é uma sequência infinda de lugares comuns mal elaborados. Não bastasse isso, alguns dos atores que o diretor dispôs, que são excelentes, têm atuações deploráveis. O próprio Selton Mello, com repetidas confusões mentais, transtornos e manias que mal o deixam andar em linha reta, não convence o espectador em momento algum de que seria capaz de levantar uma investigação daquele tamanho. Até mesmo o outrora ator de frente do grupo Macunaíma, do prestigiado Antunes Filho, Lee Taylor, faz um promotor resignado que passa o tempo com as sobrancelhas arqueadas e uma sombra canastrônica do grande artista que é, perdido entre diálogos que não se completam e cenas dispensáveis. O pior de tudo, ou melhor, pra quem ainda perde tempo discutindo o conteúdo desonesto de “O Mecanismo”, é que não se entende nada do que é dito. O som da série é ruim, com tomadas terríveis que fazem o espectador se desesperar achando que ficou surdo da noite para o dia. Parte disto por culpa da narração enfadonha e com péssima dicção de Selton Mello e outra por um problema técnico mesmo. Enfim, como disse acima, repito aqui, “O Mecanismo” é um lixo. Um lixo moral, intelectual e artístico. Baseado em inverdades e leviandades, ajuda a desmoralizar seus porta vozes e nos deixa um único alento. O de estar do lado oposto ao seu lixo.