A ação das petroleiras contra a Covid-19 – Por William Nozaki

Diversas petroleiras de várias nacionalidades se mobilizaram e adotaram ações de combate à pandemia da Covid-19 pelo mundo, com a intenção de acelerar a retomada da normalidade nas atividades industriais e financeiras globais

Foto: Agência Brasil
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Por William Nozaki*

Desde 31 de dezembro, dia em que foi reportado o primeiro caso de Covid-19 na cidade de Wuhan, o Brent e o WTI, os dois principais indicadores das cotações mundiais do petróleo, vêm apresentando forte queda, se situando, neste momento, na faixa de US$ 23 e US$ 26, respectivamente. Tal tombo é resultado, por um lado, da diminuição da demanda ocasionada pela imposição do confinamento social em diversos países e, por outro, pelo fim da OPEP+ (que engloba a Organização dos Países Exportadores de Petróleo e aliados), acordo que refreava uma parcela da produção global.

O desequilíbrio entre oferta e demanda fez com que as empresas de petróleo se reorganizassem estrategicamente, uma vez que a diminuição do preço do barril compromete o fluxo de caixa das petroleiras. De acordo com o estudo da Rystad Energy, apenas em abril, a demanda global por petróleo deverá cair 16 milhões de barris por dia (bpd).

Nesse árduo cenário, diversas petroleiras de várias nacionalidades se mobilizaram e adotaram ações de combate à pandemia da Covid-19 pelo mundo, com a intenção de acelerar a retomada da normalidade nas atividades industriais e financeiras globais.

Ações das petroleiras chinesas na luta contra a Covid-19

A China, onde o surto de Covid-19 começou no final de 2019, foi a primeira nação amplamente afetada pelos impactos negativos da epidemia, registrando mais de 3.300 óbitos. Com o intuito de auxiliar o governo nacional, as grandes petroleiras (CNOOC, CNPC e Sinopec) fizeram doações financeiras, forneceram combustível, criaram aplicativos e adotaram outras medidas para auxiliar as regiões mais afetadas.

A CNOOC destinou US$ 7 milhões, 18 mil litros de diesel e 700 toneladas de desinfetante para as áreas atingidas. Outros US$ 250 mil foram doados por seis funcionários à Federação de Caridade de Wuhan, organização que atua na prevenção e no controle de epidemias na China.

Na cidade de Chongqing, a CNOOC vem produzindo diariamente 200 mil peças de máscaras descartáveis. Nos próximos dias, a produção diária vai atingir 600 mil máscaras, com a conclusão de mais quatro linhas de fabricação. Em relação às suas atividades no exterior, a petroleira formulou um “plano de resposta a epidemias” com base em situações específicas das subsidiárias locais e estabeleceu um grupo líder de prevenção e controle de epidemias para garantir a implementação estrita de todas as medidas, visando à proteção dos seus funcionários.

A CNPC doou US$ 7,14 milhões à província de Hubei e ofereceu US$ 2,8 milhões em gás natural a 39 hospitais nela localizados. A petroleira desenvolveu uma nova plataforma de pagamento inteiramente online, na qual os clientes passam pela estação e reabastecem seus veículos sem sair deles e sem contato físico com o frentista. Ademais, as fábricas petroquímicas de Dushanzi, de Dalian, de Lanzhou, de Ningxia, de Hohhot e de Dalian West Pacific foram modificadas para produzir 1,5 milhão de máscaras diariamente.

Como forma de expressar gratidão e respeito à equipe médica nacional pela luta contra a Covid-19, a CNPC introduziu um programa intitulado “anjos de branco”, oferecendo desconto no preço do combustível aos profissionais da saúde em seus postos de gasolina.

Além de oferecer gás gratuito ao hospital improvisado de Leishenshan, a Sinopec doou US$ 7 milhões e 200 toneladas de desinfetante para Wuhan. A petroleira está produzindo mais de 1 milhão de máscaras diariamente e lançou uma nova função de pagamento chamada “reabastecimento de carteira eletrônica com um clique” em seus quase 30 mil postos de gasolina, para fornecer um serviço sem contato com os clientes durante o surto de vírus.

Demonstrando apoio e solidariedade à comunidade internacional, a Sinopec também forneceu mais de 10 mil toneladas de desinfetante à Itália, à França, à Tailândia, à Austrália, à Nova Zelândia e ao Vietnã. Fora isso, doou 10 mil máscaras ao Sri Lanka, atendendo ao pedido do embaixador srilankês, que anunciou uma grande escassez de equipamentos médicos e suprimentos de proteção no seu país.

Como vimos, a China foi o lugar onde a pandemia da Covid-19 teve início. Apesar disso, o país conseguiu reduzir o contágio da doença, após alcançar 81 mil casos e 3.300 mortos. As ações de isolamento social adotadas pelo governo chinês serviram de exemplo para outros países e as petroleiras chinesas atuaram em conformidade com as necessidades do governo, ajudando na produção de máscaras, fornecendo combustível, equipamentos, etc.

Ações das petroleiras europeias na luta contra a Covid-19

À medida que a pandemia da Covid-19 saiu da China e se espalhou pelo mundo, a Europa foi bruscamente afetada logo em seguida. A britânica British Petroleum (BP), a anglo-holandesa Shell, a francesa Total e a espanhola Repsol adotaram algumas ações, ainda que em menor escala que as petroleiras chinesas, para auxiliar na contenção da Covid-19.

A BP informou que está focada em apoiar os pedidos dos governos para limitar a disseminação da Covid-19, garantindo ao mesmo tempo o fornecimento de energia, combustível e matérias-primas petroquímicas vitais.

Nesse sentido, doará US$ 2 milhões ao Fundo de Resposta de Solidariedade Covid-19 da Organização Mundial da Saúde (OMS), que apoia profissionais da saúde e pacientes em todo o mundo, fornecendo ajuda e suprimentos essenciais. O Fundo de Resposta à Solidariedade também ajuda a rastrear e entender a propagação do vírus da Covid-19, apoiando os esforços para desenvolver testes, tratamentos e vacinas.

No Reino Unido, a BP está fornecendo combustível gratuito para veículos de serviços de emergência e entregando gratuitamente alimentos e produtos de conveniência de empresas que vendem mercadorias essenciais. A Air BP contribui fornecendo combustível de aviação gratuito para helicópteros que atuam como ambulâncias. Também está apoiando a “Mind”, uma organização de saúde mental que oferece suporte psicológico e psiquiátrico por meio de seus canais digitais.

No que diz respeito a atividades exteriores ao Reino Unido, a petroleira vem fornecendo combustível a setores estratégicos de diversos governos europeus. Na Espanha, ela está doando combustível gratuito para veículos de serviços de emergência por meio dos cartões de combustível Routex, enquanto os clientes podem usar seus cartões de fidelidade Mi BP para doar pontos para a Cruz Vermelha (Cruz Roja).

Na Alemanha, a petroleira distribuiu 10 mil cartões de combustível para profissionais de saúde. Na Polônia, os principais hospitais receberam BP Supercards, que dão desconto no preço do combustível para os médicos. Na Turquia, está apoiando o serviço de ambulâncias de Istambul, oferecendo combustível gratuito.

Já a Shell informou um conjunto de ações que reforçam medidas de segurança nesse período de pandemia. Tais ações incluem a realização de operações de limpeza, o aumento do estoque de produtos de saneamento e outros bens essenciais, o distanciamento social e o monitoramento da saúde das equipes nos locais de varejo.

Em Pernis, na Holanda, a Shell está modificando a produção em sua fábrica para produzir álcool isopropílico, disponibilizando 2,5 milhões de litros gratuitamente para o setor de saúde no país. Também na Holanda, a Shell faz parte de um consórcio que inclui outras empresas, hospitais e a Universidade de Tecnologia de Delft, que vem desenvolvendo novos protetores faciais para médicos, feitos de máscaras de snorkel.

A petroleira igualmente informou fornecimento de comida gratuita aos profissionais de saúde em mais de 30 países. No Reino Unido, por exemplo, foram distribuídos mais de 30 mil sanduíches gratuitos.

No que se refere à empresa francesa Total, ela está fazendo esforço semelhante, doando cupons de combustível no valor de US$ 54,39 milhões a hospitais em toda a França. O CEO da Total, Patrick Pouyanné, disse: “Nesse período de crise, as equipes da Total permanecem mobilizadas para permitir que o francês tome todas as providências necessárias para a viagem. O grupo decidiu fazer esse gesto prático de apoio aos funcionários do hospital, que estão trabalhando para garantir a saúde dos pacientes”.

Em relação à Repsol, a empresa divulgou a adaptação nas instalações do centro de pesquisa do Repsol Technology Lab, localizado em Móstoles, para produzir 3 mil litros (pretendendo aumentar para 10 mil litros) de álcool em gel por semana e doá-los a hospitais públicos da Comunidade de Madri. Também foram ofertados materiais, como roupas de proteção, máscaras, vestidos e óculos para outros centros hospitalares da Espanha. Por fim, a petrolífera comunicou que vem fornecendo lanches gratuitos para transportadores, serviços de emergência e saúde e para as forças armadas e de segurança.

Na Europa, a pandemia da Covid-19 já matou mais de 50 mil pessoas, quase 85% delas na Itália, Espanha, França e Reino Unido. Os números de casos e de mortes são superiores aos da China. Contudo, as petroleiras europeias vêm atuando de forma mais modesta que as chinesas no combate à Covid-19.

Ações das petroleiras americanas na luta contra a Covid-19

Depois que a pandemia atingiu a Europa, se intensificaram os casos de Covid-19 em diversos outros países, sendo o mais afetado os EUA. Os norte-americanos se tornaram a nação com o maior número de casos, logo à frente do Brasil.

A ExxonMobil anunciou um conjunto de ações para auxiliar no combate à Covid-19. A petroleira fornecerá cerca de 1 milhão de refeições aos residentes da área de Houston afetados pela pandemia por meio de US$ 250 mil em contribuições para bancos de alimentos locais, que atenderão a crianças, famílias e idosos afetados pela pandemia. Mais US$ 100 mil foram doados ao West Texas Food Bank, a maior organização sem fins lucrativos de combate à fome no Permiano. Outros US$ 100 mil foram destinados à educação online em resposta a circunstâncias sem precedentes associadas à pandemia da Covid-19. O financiamento ajudará a fornecer tecnologia e conectividade para estudantes de baixa renda que moram em locais remotos com acesso limitado à internet.

A petroleira também informou uma parceria com o Global Center for Medical Innovation para coordenar a fabricação de máscaras e protetores faciais mais duradouros. Segundo a petroleira, o design melhorará a cobertura do nariz e da boca e usará um sistema de cartucho substituível que inclui um tecido de filtragem para impedir a propagação do vírus pelo filtro saturado. Nesse projeto, os filtros são descartáveis, enquanto o componente principal da máscara pode suportar a esterilização repetida, prolongando assim o ciclo de vida do produto e corrigindo a escassez de máscaras N95. Os protótipos estão atualmente sendo testados e revisados ??pelo Food and Drug Administration dos EUA. Depois de aprovados, os fabricantes indicam que serão capazes de produzir até 40 mil máscaras e cartuchos de filtro prontos para uso por hora.

A Chevron declarou a mobilização de equipes locais, regionais e globais para lidar com o impacto da pandemia na empresa e para abordar proativamente os riscos potenciais. A petroleira declarou que contribuiu com mais de US$ 7 milhões para os esforços de resposta com doações diretas a bancos de alimentos, educação e serviços de saúde.

Quanto ao Brasil, a Petrobras anunciou a doação de 600 mil testes de diagnóstico ao Sistema Único de Saúde (SUS). Importado dos EUA. A petroleira brasileira também informou a criação de um grupo multidisciplinar de profissionais de seu centro de pesquisas (Cenpes) para avaliar e propor soluções em parceria com universidades, empresas e instituições que possam ajudar no combate ao novo coronavírus.

Apesar das iniciativas citadas, a ExxonMobil e a Chevron não atuaram da mesma forma que as empresas chinesas e ainda estão atrás das europeias no combate à Covid-19. Já no Brasil, a atuação da Petrobras é a mais tímida de todas, se comparada às grandes empresas internacionais do setor.

*William Nozak é professor de economia e ciência política da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP) e coordenador técnico do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás e Biocombustíveis Ineep).

**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.